06.07.21
Porque nem só de séries se fazia o quotidiano televisivo das crianças portuguesas nos anos 90, em terças alternadas, este blog dá destaque a alguns dos outros programas que fizeram história durante aquela década.
(NOTA: Este post é dedicado ao José Miguel, primeiro a sugerir este programa como futuro tema aqui do blog.)
‘Huuuugoooo…p’rá esquerda e p’rá direita, sem fazer asneiras…’ Qualquer jovem que visse televisão pública da parte da tarde entre os anos de 1997 e 2000 sabia estas palavras de cor, e estará provavelmente a vivenciar um enorme momento de nostalgia ao assistir ao vídeo acima. Isto porque ‘Hugo’ – o programa cujo genérico incluía as referidas palavras – foi um dos maiores sucessos de programação infanto-juvenil durante aqueles anos, cativando espectadores desde a idade pré-primária até ao final da adolescência com o seu formato original, apresentadores carismáticos e, claro, a possibilidade de ganhar prémios, ainda e sempre um dos maiores catalisadores de acção entre os jovens.
O que a maioria dos espectadores do programa talvez não soubesse na altura era que Portugal era apenas a paragem mais recente na ‘volta ao Mundo’ do personagem central. Criado na Dinamarca mesmo no início da década, e baseado em criaturas do folclore local, os ‘trolls’, Hugo não tardou a expandir as suas aventuras a outros países; curiosamente, a primeira paragem internacional foi a vizinha Espanha, que recebeu o programa cinco anos antes da outra metade da Península Ibérica. Ao completar uma década de vida, o simpático duende surgira já em 26 dos 40 países que eventualmente atingiria, e a sua presença mediática extravasara a televisão, estendendo-se a vários jogos de vídeo e computador (a maioria recriações fiéis do programa televisivo, mas jogados com o comando ou teclas, em vez de por telefone), bem como a artigos periféricos, como peças de roupa. A influência do personagem continua, aliás, a fazer-se sentir até hoje, existindo vários jogos recentes com o duende como personagem principal, muitos deles já longe do formato e história que o tornaram conhecido, e com Hugo no papel de condutor de corridas ou até agente secreto.
O primeiro jogo de Hugo para PlayStation é basicamente uma compilação das suas aventuras televisivas em formato caseiro
No início, no entanto, a vida do carismático ‘troll’ era bem mais simples, embora não menos aventurosa; nessa época, a única preocupação de Hugo era – como a música original portuguesa prestavelmente informa – ‘salvar a familia da Bruxa Maldiva’. Para tal, era necessário conquistar uma série de diferentes cenários, normalmente centrados em torno de ambientes naturais, como uma floresta ou uma montanha. Fosse qual fosse o local da aventura, no entanto, a formula de jogo era a mesma – Hugo era controlado pelos jovens jogadores através do telefone, normalmente por meio das teclas correspondentes às setas direccionais, ou seja, 2, 4 e 6. O resto era uma questão de ‘timing’, a fim de evitar os obstáculos (tanto naturais como criados por Maldiva) e recolher os sacos de dinheiro estrategicamente colocados pelo caminho. Quanto mais sacos recolhidos e obstáculos evitados, melhor era a pontuação final; de igual modo, cada vida perdida equivalia a um decréscimo na pontuação (três ‘mortes’ equivaliam automaticamente a ‘Game Over’.)
Caso o jogador fosse bem-sucedido e conseguisse chegar ao fim desta prova, o jogo passava a uma segunda fase (sempre semelhante, independentemente do cenário jogado) em que Hugo defrontava directamente Maldiva, ficando o destino da sua família, neste caso, dependente não tanto da habilidade, mas da sorte e escolha da tecla correcta por parte do jogador. Uma escolha acertada atirava Maldiva para a sua morte no sopé da montanha, permitindo a Hugo e Hugolina ter um final feliz num idílico prado; qualquer outra tecla via a família de Hugo ser novamente aprisionada pela Bruxa, num final inglório para os esforços do jogador.
Uma boa demonstração da mecânica dos jogos, aqui aplicada a uma missão já da segunda série de aventuras.
No fim de cada jogo, a pontuação do participante era somada e adicionada à tabela geral da semana, sendo que (pelo menos na versão portuguesa) o ‘Craque’ de cada dia recebia um dos muito cobiçados prémios, que iam desde ‘merchandising’ alusivo ao duende até produtos bem desejáveis para os jovens da época, como Discmans e patins em linha; já o ‘Craque’ da semana recebia uma bicicleta. No final da mês, os ‘Craques’ de cada semana defrontavam-se pelo direito a ganhar o prémio máximo – um magnífico computador modelo ‘anos 90’. Em ocasiões especiais, havia também eventos como a ‘Grande Final Semestral’ anunciada abaixo, e que teve lugar no Dia da Criança de 1998, pondo frente a frente os seis ‘Craques’ mensais do ano até então.
Um conceito aliciante e altamente competitivo, portanto, o qual era envolvido num programa não menos cativante, com apresentadores jovens e dinâmicos, que sabiam criar e transmitir o entusiasmo necessário, bem como estabelecer uma ligação com os diferentes participantes, fazendo perguntas, admirando os desenhos e trabalhos manuais que enviavam, ou até oferecendo dicas para os ajudar a ultrapassar os diferentes obstáculos e momentos de cada jogo. Tendo em conta a vasta faixa etária que constituía o público-alvo do programa, estes jovens mostravam-se bem versados em tornar o mesmo atraente para todas as idades, sabendo manter o interesse do público sem nunca simplificar ou complicar demais a sua abordagem. A auxiliar os diferentes apresentadores nessa tarefa estava o próprio Hugo, que interagia com o estúdio a partir da sua casa na Hugolândia.
Quanto aos participantes, este ganhavam o direito a jogar o jogo daquela semana ou da semana seguinte, quer através do envio de uma frase subordinada a um tema previamente estabelecido, comunicada por telefone na primeira meia-hora após o programa, quer de trabalhos alusivos ao personagem principal; claro està que ambos estes métodos dependiam tanto da sorte como da criatividade, e apenas uns poucos sortudos chegavam a participar, variando o seu número consoante a habilidade dos seus predecessores – quanto mais rápidos fossem os ‘Game Overs’, mais pessoas cabiam na meia-hora de transmissão, o que terá, decerto, feito muitas crianças desejarem ‘mortes’ rápidas àqueles que jogavam antes deles…
Enfim, um programa que marcou absolutamente a época em que foi transmitido, apesar da sua estadia relativamente curta no ar. Tanto assim foi que Hugo regressaria, não uma, mas duas vezes às televisões nacionais, já no novo milénio, com novos jogos, amigos e apresentadores.
Excerto de 'Hora H', o primeiro dos dois programas de 'regresso' de Hugo à televisão nacional
No entanto, nenhuma destas novas séries teve o impacto da original, que continua, ainda hoje, a perdurar na memória daqueles que, tarde após tarde, desejavam ter conseguido um lugar na emissão daquele dia, e poder ajudar Hugo com qualquer que fosse a sua missão naquela semana - o mesmo se passando, aliás, com o tema-título. 'Huuugo, p'ra cima e para baixo, até à Caverna das Caveeeeiraaaaas...'