17.05.22
Porque nem só de séries se fazia o quotidiano televisivo das crianças portuguesas nos anos 90, em terças alternadas, este blog dá destaque a alguns dos outros programas que fizeram história durante aquela década.
Numa semana em que se vive o rescaldo de mais um Festival Eurovisão, e depois de termos aqui recordado os mais emblemáticos participantes portugueses no mesmo durante a década de 90, nada melhor do que nos debruçarmos um pouco mais a fundo sobre o programa que revelou ao Mundo um dos nomes mais memoráveis dessa lista, Sara Tavares.
Falamos, claro, de 'Chuva de Estrelas', o mega-popular concurso de talentos musicais que foi pedra basilar da programação da SIC desde a sua criação até ao virar do milénio. E a verdade é que se, à distância de trinta anos, o conceito do concurso (adaptado, como era habitual neste tipo de programas, de um formato estrangeiro, no caso holandês) parece tudo menos original, a verdade é que, à época, tratava-se mesmo de um programa inovador, um dos primeiros, senão mesmo o primeiro, do seu género em Portugal.
De facto, se para um público do século XXI, habituado a programas como 'Ídolos' e 'The Voice Portugal', 'Chuva de Estrelas' é extremamente fácil de definir – trata-se, pura e simplesmente, de uma versão embrionária de um concurso desse tipo – no contexto português de inícios da década de 90, o termo de comparação mais próximo para o que propunha Ediberto Lima talvez fosse mesmo o Festival da Canção, o evento anual que apurava, precisamente, o representante de Portugal no Festival Eurovisão daquele ano; as únicas (mas significativas) diferenças residiam no facto de os concorrentes de 'Chuva' interpretarem, quase exclusivamente, versões de músicas de outros artistas, muitos deles internacionais – um conceito que, décadas mais tarde, serviria de base aos referidos concursos de talentos adaptados de formatos de Simon Cowell.
Ao contrário de 'Ídolos', no entanto, 'Chuva de Estrelas' nunca esteve ciente do valor de uma audição propositadamente irónica ou embaraçosa – todos os concorrentes em destaque no programa eram escolhidos, unicamente, na base do seu talento, e correspondiam com interpretações à altura, emotivas e vigorosas - a carreira musical de Sara Tavares, por exemplo, teve início após a cantora ter 'canalizado' Whitney Houston, numa actuação que lhe valeu a vitória na primeira das seis edições do concurso, em 1993. Esta abordagem viria, mais tarde, a beneficiar também nomes como João Pedro Pais, João Portugal, Carlos Coincas (dos Excesso e D'Arrasar, respectivamente) e Célia Lawson, a responsável pelo primeiro 'nul points' de Portugal na Eurovisão em mais de trinta anos.
A apresentadora e vencedora da primeira série do programa, Catarina Furtado e Sara Tavares
O facto de este concurso ter, ao longo dos anos, sido entregue à 'nata' dos apresentadores da SIC – primeiro a Catarina Furtado, depois a José Nuno Martins e, por fim, a Bárbara Guimarães – diz muito sobre a importância que lhe era atribuída no contexto geral da grelha de programação da SIC; e a verdade é que essa confiança não foi, de todo, infundada - o programa não só foi um sucesso (dando, até, azo a uma versão 'Mini', com cantores infantis, da qual paulatinamente aqui falaremos) como é, ainda hoje, um dos mais recordados de entre os transmitidos pela estação naquela época, ao lado de outras 'pérolas' como o Ponto de Encontro, o Templo dos Jogos, o Portugal Radical ou o Buereré. E apesar de, tal como alguns destes, a 'mise en scène' do concurso ter envelhecido particularmente mal – 'Chuva' já era 'piroso' na altura, e é ainda mais 'piroso' agora – o seu estatuto como precursos dos concursos de talentos que todos conhecemos (e de que todos já nos fartámos) hoje em dia continua a merecer-lhe lugar de destaque na 'revolução televisiva' do Portugal noventista.