NOTA: Este 'post' é respeitante a Terça-feira, 09 de Setembro de 2025.
Porque nem só de séries se fazia o quotidiano televisivo das crianças portuguesas nos anos 90, em terças alternadas, este blog dá destaque a alguns dos outros programas que fizeram história durante aquela década.
De entre as dezenas (senão mesmo centenas) de programas propostos pelos quatro canais nacionais ao longo de cada ano, existem aqueles que rapidamente caem no esquecimento, aqueles que 'pegam de estaca' e acabam por se eternizar na memória colectiva, tornando-se nostálgicos, e aqueles que transcendem o mero estatuto de entretenimento televisionado, extravasando as fronteiras do ecrã para se estabelecerem como parte integrante da cultura popular nacional. E embora estes casos sejam relativamente raros (ou talvez por causa disso), quando um deles surge na grelha televisiva da RTP, SIC ou TVI, a sua influência tende a manter-se muito para além do tempo de transmissão, sendo os mesmos ainda relembrados várias décadas após a sua conclusão. É, precisamente, esse o caso com o programa que abordamos neste 'post', sobre cuja estreia se celebraram há cerca de uma semana exactos vinte e cinco anos, e cujo legado continua bem vivo não só na mente dos portugueses, como nos próprios ecrãs das suas televisões, mesmo um quarto de século após a sua introdução na grelha da 'Quatro'.
O serão de dia 3 de Setembro de 2000 marca, pois, o ponto em que o panorama televisivo lusitano se alteraria irreversivelmente, e em que os espectadores nacionais tomariam pela primeira vez contacto com aquele que se viria a tornar um dos géneros mais populares do século XXI. Isto porque era nesta data que a TVI apresentava, pela primeira vez, o seu novo concurso, adaptado de um popular formato holandês, e que propunha seguir de perto, e em directo, a vida de catorze portugueses comuns, forçados a cohabitar numa casa especialmente construída para o efeito, e sujeitos a eliminações decididas pelo público, com base nos seus comportamentos e capacidade de engajar (ou não) quem via o programa. Era o início do 'Big Brother' em Portugal, e também de uma febre comparável à causada junto dos jovens por 'Dragon Ball Z', alguns anos antes, mas desta vez extensível a todas as faixas etárias e demográficas do País.
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De facto, o 'reality-show' da TVI (primeiro do seu género em Portugal) era de tal modo inescapável que até quem evitava declaradamente acompanhar o programa não conseguia deixar de estar a par do que nele se passava. Elementos como o confessionário, as provas (que garantiam ao vencedor imunidade contra a eliminação nessa semana) e as famosas 'câmaras nocturnas' instaladas nos quartos de cama rapidamente se tornaram tema recorrente de conversa, o mesmo sucedendo com grande parte dos concorrentes – ainda que alguns fornecessem mais 'tema de conversa' do que outros. Em particular, destacavam-se o afável pedreiro Zé Maria, o campeão de 'kickboxing' Marco (protagonista do mais controverso e polémico momento do programa), o recatado Telmo e, do contingente feminino, a carismática Susana e a 'desbocada' Sónia. Outros, por seu lado, mal deixariam marca na memória colectiva, havendo pouco quem se lembre de Riquita (a professora de Inglês eliminada em primeiro lugar) ou dos dois Ricardos, que rapidamente se lhe seguiram.
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A grelha de concorrentes do primeiro Big Brother.
Dos restantes, no entanto, parte significativa encontraria lugar cativo na cultura popular portuguesa, fosse por saberem como 'jogar o jogo', por terem simplesmente personalidades mais vincadas ou expansivas, ou por serem protagonistas de momentos controversos, como actos sexuais em directo (algo que chegou, previsivelmente, a gerar escândalos à época) ou momentos de descontrolo emocional, como aquele que viu Marco ser expulso da casa, apesar de não ter sido o escolhido do público, após agredir Sónia com o pontapé mais famoso da História da televisão portuguesa, senão de sempre, pelo menos desde os tempos áureos de Eusébio. O facto de tal acto (contra uma mulher, ainda para mais) não ter imediatamente excomungado o 'kickboxer' da memória popular nacional – tendo o mesmo, pelo contrário, adquirido estatuto de celebridade menor – diz muito do poder do 'Big Brother' sobre a psique colectiva portuguesa naquele período de pouco mais de três meses na segunda metade do ano 2000, cujo efeito sobre a sociedade fez com que parecesse muito mais longo.
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Marco, protagonista do mais polémico momento do programa, e único concorrente expulso da casa sem direito a votação.
De facto, era logo na véspera de Ano Novo que Zé Maria - o simples e espontâneo pedreiro que ajudara a colocar Barrancos no mapa por razões não ligadas à tauromaquia, e que conquistara o coração dos portugueses ao longo dos três meses anteriores - 'roubava' audiências aos habituais espectáculos da noite e recebia das mãos da anfitriã Teresa Guilherme o cheque que viria a mudar indelevelmente a sua vida, tomando o seu lugar como 'pedra basilar' de uma dinastia que, vinte e cinco anos depois, não mostra sinais de abrandar, com variações do 'Big Brother' a serem produzidas e transmitidas pela TVI até aos dias de hoje, quer no formato original, quer com a participação de celebridades. O sucesso do programa daria, também, o mote para o surgimento de uma série de outros 'reality shows' nas grelhas televisivas nacionais, o primeiro dos quais da responsabilidade da SIC, canal que rejeitara originalmente o Big Brother e procurava 'emendar' o seu erro. Nenhuma destas tentativas viria, no entanto, a ter sequer uma fracção do sucesso das duas primeiras séries do 'Big Brother', sendo apenas com 'Quinta das Celebridades' que o formato voltaria verdadeiramente a cativar audiências em massa.
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O momento da coroação de Zé Maria.
Mas se, para a TVI, o resultado foi positivo, já para o vencedor do concurso, a súbita riqueza e fama provariam ser demasiado 'pesadas', causando problemas do foro psíquico e levando a que Zé Maria se isolasse da sociedade, situação que ainda hoje se mantém, e que ninguém poderia ter previsto naquele momento em que, aos vinte e sete anos, o pedreiro recebia um cheque de vinte mil 'contos' e um carro, sob as luzes de um estúdio de televisão. Ainda assim, e apesar de tudo fazer para que o seu nome seja esquecido, Zé Maria estará, juntamente com os outros concorrentes, para sempre ligado ao início de uma nova etapa na programação portuguesa, e do 'reino' continuado de um novo formato que, um quarto de século depois e na sua 'enésima' edição, continua a gerar temas de conversa e a render lucro e audiências à estação que o transmite.