05.06.23
Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.
Todas as gerações nascidas ou crescidas após o advento da televisão têm os seus programas míticos, religiosamente seguidas por toda uma demografia, pelo menos até a mesma se tornar demasiado madura para os referidos conteúdos. A geração crescida em Portugal em finais do século XX não é, de todo, excepção a esta regra, sendo longa e evidente a lista de séries e programas que se inserem nesta categoria, da 'Rua Sésamo' às 'Tartarugas Ninja' e 'Moto-Ratos de Marte', de 'Power Rangers' a 'Pokémon', das 'Navegantes da Lua' ao 'Samurai X' e de 'Dartacão' a 'Inspector Gadget' ou ao inevitável 'Dragon Ball Z', talvez o programa mais consensual e agregador entre a juventude lusa da altura.
No entanto, a par destes ícones da memória nostálgica, as décadas de 80, 90 e 2000 foram, também, pródigas em séries mais 'de culto', saudosamente lembradas por quem a elas assistiu, mas não necessariamente tão omnipresentes na cultura popular infanto-juvenil da época como os nomes supracitados. Fazem parte desta categoria programas como 'As Aventuras do Bocas', 'Artur', 'Os Cavaleiros do Zodíaco', 'Esquadrão Águia', 'Alvin e os Esquilos', 'A Carrinha Mágica' e a série abordada neste post, apenas recentemente recuperada do esquecimento por quem dela tem gratas memórias.
Falamos de 'O Panda Tao-Tao', ou apenas 'Tao-Tao', uma produção nipo-germânica (apesar de ambientada na China, e relativa á cultura daquele país) sem grandes pretensões à imortalidade, mas produzida com evidente cuidado (tanto a nível da escrita como da animação) e que, como tal, se afirmou, enquanto esteve no ar, como um dos programas infantis de maior qualidade na grelha de programação da RTP de finais da década de 80 e inícios da seguinte.
Com as florestas de bambu da China como pano de fundo, a série propõe uma premissa tão simples quanto cativante: cada episódio começa com o personagem titular e os seus amigos (com destaque para o irrequieto e irreverente macaco Kiki) a encontrarem, no decurso das suas brincadeiras diárias, algum tipo de problema ou catalista, prontamente aproveitado pela Mãe Panda, progenitora de Tao-Tao, como pretexto para partilhar a história da semana, cujos protagonistas são, invariavelmente, animais antropomorfizados - ou não fosse o sub-título da série 'Histórias de Animais de Todo o Mundo' – e que tem, normalmente, como lição de moral algo relacionado ao problema encontrado pelas crias. No final, com o problema ou objecto de controvérsia sanado, todos voltam à brincadeira anterior – pelo menos até ao episódio seguinte, em que o ciclo recomeça.
Tao-Tao e o inseparável amigo Kiki
Esta abordagem nem totalmente lúdica nem totalmente educativa é, aliás, um dos pontos fortes de 'Tao-Tao'. Apesar de o foco de cada episódio ser declaradamente a história narrada pela Mãe Panda (normalmente retirada ou baseada no folclore das mais diversas partes do Mundo) a moldura narrativa não é, em momento algum descurada; pelo contrário, Tao-Tao, Kiki e a Mãe Panda são personagens por demais memoráveis (com todo o mérito para a dobragem, uma das primeiras a ficar a cargo da própria RTP), que incentivam à reentrada no seu 'mundo', ainda que apenas por breves instantes antes e após a história central – uma característica extremamente importante em programas desta índole, e que 'Tao-Tao' partilha, por exemplo, com a supracitada 'Rua Sésamo'. O genérico absolutamente épico e totalmente inesquecível é, assim, apenas a cereja no topo daquele que é já, só por si, um 'bolo' de alta qualidade, e que merecia ser mais conhecido e lembrado no âmbito da programação infantil daquele tempo.
Quem sabe, sabe.
A razão para o estatuto de culto desta série junto da demografia 'Millennial' é, aliás, um caso de estudo, já que 'Tao-Tao' gozou de exposição não só à época da sua transmissão (tendo, aliás, sido exibida três vezes distintas entre 1988 e 1990) mas também em anos subsequentes, quando a inevitável Prisvídeo 'desenterrou do baú' os episódios e os lançou no não menos inevitável formato VHS de 'banca de jornal', colados às icónicas cartolinas e com reproduções 'mais ou menos' fiéis dos personagens nas capas.
Capa de um dos VHS da Prisvídeo.
Previsivelmente, no entanto, essa edição apenas interessou mesmo a quem já convivera com Tao-Tao, Kiki e a Mãe Panda alguns anos antes, tendo a demografia então na idade certa passado totalmente 'ao lado' de uma série cujo conceito diferia bastante da habitual acção e aventura, podendo estar precisamente aí a razão para não ser mais conhecida. Uma pena, já que, conforme referimos, se trata de um dos melhores programas infantis da televisão portuguesa de finais dos anos 80 e inícios dos 90.