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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

16.03.25

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

O mundo do futebol profissional tende a dividir-se em dois tipos de jogador: os talentos natos, que se tornam estrelas e centram em si todas as atenções, e os mais utilitários, mas tão ou mais necessários para o bom funcionamento de uma equipa – os chamados jogadores de 'fato-macaco'. É de um dos mais famosos representantes nacionais deste segundo tipo – ainda hoje conhecido em 'praça pública' - que falaremos neste 'post', no fim-de-semana em que celebra cinquenta e três anos de idade.

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O jogador com algumas das camisolas que representou na carreira.

Filho 'do meio' de um quinteto de irmãos futebolistas (de um total de treze crianças!), José Luís da Cruz Vidigal viria mesmo a ter a carreira mais honrosa de entre os três, conseguindo elevar o seu futebol a um patamar que nem os dois irmãos mais velhos, Beto e Lito, nem os dois mais novos, Toni e Jorge, alguma vez viriam a almejar. Antes dos habituais 'saltos' que marcam o percurso de qualquer jogador promissor – primeiro para um 'grande' e, depois, para o estrangeiro – a trajectória do futuro internacional português, companheiro de Selecção dos membros da 'Geração de Ouro' no Euro 2000, desenrolava-se de forma exactamente análoga à dos irmãos, tendo tido início no modesto mas histórico O Elvas (do qual foi elemento-chave entre a estreia em 1992 e a saída em 1994, tendo realizado sessenta jogos) e continuado na periferia de Lisboa, novamente de amarelo e azul, embora desta feita num patamar mais alto, ao serviço do Estoril-Praia.

A estadia na Amoreira - sobre a qual se comemoram esta temporada exactas três décadas - duraria apenas uma época, mas daria ao jovem de vinte e um anos tempo mais que suficiente para explanar as suas qualidades, tendo deixado apontamentos suficientes ao longo dos vinte e sete jogos que realizou para justificar a chamada às Selecções Sub-21 e Sub-23 e suscitar o interesse de um dos 'grandes' da vizinha capital. No caso, seria o Sporting, recém-sagrado vencedor da Taça de Portugal, quem asseguraria a contratação do médio defensivo no Verão de 1995, no caso como elemento de 'apoio' a um plantel onde a sua posição estava assegurada por nada menos do que Emílio Peixe, Oceano e Carlos Xavier. E se esta concorrência 'de peso' poderia fazer crer que a estadia de Vidigal nos 'Leões' de Lisboa seria curta e inexpressiva, a verdade é que o jogador desafiou todas as expectativas, fazendo cinco épocas de leão ao peito e conseguindo mesmo afirmar-se como elemento importante dos plantéis por onde passou, numa fase que culminaria com a titularidade absoluta na época de 1999/2000, em que foi peça-chave na quebra do 'jejum' de dezoito anos do clube de Alvalade, com a conquista do Campeonato Nacional – proeza que, curiosamente, seria repetida pelo seu irmão mais novo dois anos depois!

Montagem dos melhores momentos de Vidigal no Sporting.

Como é evidente, o alto rendimento do jogador nessa época agudizou o interesse no seu perfil por parte de clubes estrangeiros, algo a que a participação na excelente campanha portuguesa no Euro 2000 veio ainda acrescer. Assim, foi sem surpresas que, nos primeiros meses do Novo Milénio, os adeptos leoninos viram o seu destruidor de jogo rumar a paragens mais apetecíveis, nomeadamente a Itália, país onde passaria os oito anos seguintes – representando sobretudo as cores do Nápoles e do Livorno, excepção feita a uma breve passagem pela Udinese - e onde acabaria mesmo por jogar durante mais um ano do que em Portugal, país ao qual só regressaria já em final de carreira, mas ainda a tempo de fazer dezassete jogos no escalão principal, com a camisola do Estrela da Amadora, fechando de forma honrosa uma bonita carreira.

Ao contrário de tantos outros jogadores já aqui abordados, no entanto – e do próprio irmão mais velho – Luís Vidigal escolheu não fazer a transição para cargos técnicos após o fim de carreira; ao invés, o antigo médio-defensivo viria a manter-se relevante na opinião pública enquanto analista desportivo, cargo que ainda hoje desempenha, podendo ser ouvido semanalmente nas transmissões televisivas de jogos do campeonato e não só, tendo o legado futebolístico do seu clã sido deixado a cargo do sobrinho, André, filho do malogrado Beto. Uma nova etapa na carreira de um nome menos fulgurante, mas não menos importante, do que outros da sua geração, e bem merecedor deste destaque no seu fim-de-semana de aniversário. Parabéns, e que conte muitos.

16.02.25

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

Quando se fala na Geração de Ouro do futebol nacional, a memória tende a relembrar fantasistas como Luís Figo, Rui Costa ou João Vieira Pinto, ou esteios defensivos como Paulo Sousa ou a dupla Fernando Couto e Jorge Costa: no entanto, como qualquer outra equipa, a referida Selecção contava também com uma série de 'coadjuvantes', cujo papel era mais discreto, mas não menos importante nas dinâmicas e organização da equipa. É, precisamente, a um desses jogadores – dono de uma carreira mais do que honrosa, mas significativamente menos lembrado que os seus colegas - que dedicaremos este Domingo Desportivo, no dia em que completa cinquenta e seis anos de idade.

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O jogador ao serviço de Portugal no Euro 2000.

Nascido em Joanesburgo, na África do Sul, Dimas Manuel Marques Teixeira – vulgarmente conhecido apenas pelo seu primeiro nome próprio – voltaria ainda criança a Portugal, onde viria a explorar mais a fundo a sua apetência por futebol. E a verdade é que, apesar de um começo relativamente tardio – tinha já dezasseis anos quando iniciou a formação – o futuro internacional português foi ainda mais do que a tempo de transformar esse gosto numa carreira internacional, vivendo o sonho de muitos jovens ao estrear-se, aos dezoito anos, pela histórica Académica de Coimbra, onde fizera os seus dois únicos anos de formação. Curiosamente (ou talvez não) a tenra idade não impediu que Dimas se afirmasse como peça-chave do plantel dos Estudantes durante as três épocas que ali passou, sendo que apenas na última realizaria menos de trinta jogos, compensando este facto com um recorde de golos que vigoraria durante toda a sua carreira, marcando sete. Ao serviço da histórica agremiação, o defesa conseguiria ainda as primeiras internacionalizações jovens, representando a selecção Sub-21 por duas vezes e a Sub-23 por três.

Esta preponderância, aliada às boas exibições tanto no primeiro escalão como no secundário, após descida, não poderia deixar de atrair o interesse de outros emblemas, e, no início da época de 1990/91, Dimas faria a primeira de muitas transferências na sua carreira, mudando-se para os arredores de Lisboa para representar o Estrela da Amadora, finalista derrotado da Taça de Portugal poucas semanas antes. Ali, continuou a confirmar as boas indicações que deixara no seu clube de origem, com duas épocas em grande nível, sendo 'totalista' na primeira, com trinta e oito presenças, e peça importante na segunda, em que almejou vinte e oito. Sete golos no total das duas épocas (apenas menos um do que marcara em três épocas em Coimbra) punham o corolário nesta fase da carreira do jogador, que rapidamente se viu a rumar a ainda mais um histórico do futebol português, desta feita localizado mais a Norte.

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Com a camisola do Vitória SC.

De facto, a época de 1992/93 via Dimas surgir como nova adição ao plantel do Vitória de Guimarães, responsável por revelar para o futebol muitos e bons executantes, e onde o lateral-esquerdo somaria e seguiria na sua carreira, realizando mais duas épocas como titular quase indiscutível no flanco esquerdo, embora agora com menor veia goleadora, almejando apenas um golo no decurso dos dois anos que passou na Cidade-Berço. Ainda assim, nesta fase da carreira, e com apenas vinte e quatro anos, Dimas era já, mais do que uma promessa, uma certeza do futebol nacional da época, pelo que o 'salto' para um grande era já mais do que expectável – salto esse que viria a acontecer há pouco mais de trinta anos, no início da época de 1994, quando Dimas regressava a Lisboa, desta vez para equipar de vermelho, ao serviço do Benfica.

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No primeiro dos dois rivais da Segunda Circular que representou...

Em termos de notoriedade, o lateral-esquerdo atingiu aqui o ponto alto da sua carreira, sendo pedra basilar da equipa durante as duas temporadas e meia que ali passou (como, aliás, já vinha sendo seu apanágio) e completando quase uma centena de partidas de águia ao peito, durante as quais almejou cinco golos. Terá sido nesta fase do percurso de Dimas que o adepto 'comum', menos atento a equipas que não os três 'grandes', terá tomado conhecimento do lateral-esquerdo, não só pelas suas prestações no Campeonato Nacional da I Divisão como também pela presença na Selecção Nacional AA, com a qual disputou tanto a fase de apuramento para o Euro '96 como o próprio certame, sendo primeira opção para o 'seu' lado da defesa durante todo o torneio. Não é, pois, de admirar que, na temporada seguinte, o lateral tenha sido alvo de interesse internacional, e dado com naturalidade o segundo 'salto' do percurso de qualquer futebolista; o destino era Itália, onde Dimas iria representar o mais lendário clube da sua carreira – a Juventus.

E se a 'aventura' internacional tende a não correr bem a muitos futebolistas, tal não foi o caso com Dimas, que, apesar de nunca conseguir a titularidade absoluta como sucedera nos seus outros clubes, conseguiu ainda assim realizar mais de quatro dezenas de jogos com a camisola listrada da 'Vecchia Signora' antes de rumar à Turquia, para representar o Fenerbahce, enquanto jogador do qual voltaria a representar Portugal no seu segundo torneio internacional, o memorável Euro 2000, onde seria novamente titular na esquerda. Um ano e meio e menos de três dezenas de jogos depois, o lateral rumaria à Bélgica, onde jogaria durante seis meses, contabilizando treze aparições pelo Standard de Liège, antes de rumar novamente a Portugal, e a Lisboa, desta vez para jogar do outro lado da Segunda Circular, no grande rival do seu antigo clube.

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...e no segundo.

Se Dimas esperava relançar a carreira no Sporting recém-coroado Campeão Nacional após jejum de quase duas décadas, no entanto, tal plano saiu gorado após o defesa contrair uma lesão no joelho, que o levaria a perder definitivamente a luta pela ala esquerda com o colega de Selecção Rui Jorge. Ainda assim, duas partidas na sua segunda época (antes de rumar por empréstimo ao Marselha, onde realizaria apenas mais quatro) foram suficientes para dar a Dimas o título de campeão nacional, apesar do papel irrisório que desempenhara nessa conquista. Seria com essa conquista quase 'oferecida' que, no final da época de 2001/2002, Dimas encerraria uma carreira honrosa, que inscrevia o seu nome na lista dos maiores jogadores portugueses de sempre a nível interno.

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No breve período como treinador-adjunto.

Tal como muitos outro nomes que relembramos nestas páginas, no entanto, não terminava aí a carreira do agora ex-lateral no Mundo do futebol, já que Dimas tentaria uma transição para a carreira de adjunto, ao lado de José Morais. No entanto, a mesma não duraria mais do que uma época no Barnsley (que terminou com o duo despedido após despromoção) e dois períodos de poucos meses nos ucranianos do Karpaty Lviv e no Jeonbuk, da Coreia do Sul. Assim, é sobretudo pela sua capacidade física, disponibilidade e ritmo de jogo enquanto jogador de campo que o ex-internacional continua a ser lembrado, e é pela sua preponderância nessa capacidade que merece esta homenagem aquando do seu aniversário. Parabéns, e que conte ainda muitos.

23.12.24

NOTA: Este 'post' é respeitante a Domingo, 22 de Dezembro de 2024.
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Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.
 

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É piada recorrente entre adeptos de futebol portugueses até aos dias de hoje: o misterioso fenómeno que fazia com que as excelentes equipas do Sporting dos anos 90 e 2000 iniciassem cada nova temporada do Campeonato Nacional 'a todo o gás', mas perder fôlego (e terreno) a partir de meados de Dezembro, sagrando-se 'campeão de Natal'. mas acabando por soçobrar na segunda metade da época, e permitir a 'ultrapassagem' do grande rival Benfica ou do Futevol Clube do Porto (bem como, numa ocasião histórica, do Boavista). Agora, numa altura em que a 'maldição' parece estar, mais uma vez, em curso, a conjuntura afigura-se ideal para dedicarmos algumas linhas a essa estranha tendência.
 
Ao contrário do que é costume neste tipo de casos, esses consecutivos 'falhanços' dos 'Leões' de Lisboa não podem ser atribuidos a nenhum factor concreto, sendo normalmente derivados de uma conjunção da hegemonia dos rivais (sobretudo o Porto, que atravessava, em finais do século XX e inícios do seguinte, uma fase demolidora), quebras anímicas, plantéis inconsistentes, maus treinadores, jogos difíceis, erros de arbitragem e algum azar. Sejam quais forem os motivos, no entanto, a verdade é que, num período de mais de duas décadas, o Sporting CP apenas logrou conquistar dois títulos nacionais, não tendo sido mais do que 'campeáo de Inverno' nas restantes décadas. E se, nos últimos cinco anos, este paradigma parecia finalmente estar a reverter-se, a presente temporada indica que a 'maldição' não está, de todo, debelada, e que os adeptos mais recentes do clube de Alvalade podem estar prestes a viver uma situação análoga à experienciada pelos seus antecessores de finais do século XX...
 

29.09.24

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

Numa era em que a maioria dos homens ocidentais de uma certa faixa demográfica exibe uma aparência muito semelhante, e cuidada até ao extremo, é fácil esquecer que, há meros trinta anos, era por demais fácil reconhecer certas classes sociais e profissionais pelo aspecto que apresentavam. Destas, a mais famosa talvez seja a dos desportistas profissionais, e especificamente dos futebolistas, cujas marcantes escolhas no tocante a aparências popularizaram, em Portugal, a expressão 'cabelinho à jogador da bola'. São inúmeros os exemplos ilustrativos deste estilo durante os anos 90 e 2000, bastando lembrarmo-nos de Fernando Couto, Nuno Gomes, Claudio Cannigia, Jorge Cadete ou mesmo Luís Figo, mas um dos mais memoráveis e marcantes pertenceu a um jogador do Sporting Clube de Portugal na viragem da década de 80 para a de 90, o qual completa hoje sessenta e cinco anos.

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O futebolista com três das quatro camisolas que envergou em Portugal.

Falamos de Paulo Roberto Bacinello, avançado goleador cujo apelido futebolístico derivava da pequena cidade que o vira nascer em 1959 – Cascavel, no estado brasileiro do Paraná. Era ali, ao serviço do clube local, que, em finais dos anos 70, o adolescente então já conhecido como Paulinho Cascavel daria os primeiros toques na bola enquanto jogador semi-profissional; seguir-se-ia uma passagem discreta pelo Criciúma, antes de o avançado demonstrar a sua verdadeira valia ao marcar vinte e sete golos ao serviço do Joinville, conquistando assim a Bota de Ouro no Campeonato Catarinense de 1984. Esta boa prestação valer-lhe-ia, subsequentemente, o primeiro 'salto', no caso para o Fluminense, um dos 'grandes' históricos do futebol brasileiro. Ali, no entanto, Paulinho nunca seria mais do que segunda escolha atrás de Washington, uma das 'lendas' do clube carioca, tendo somado apenas oito jogos em todo o Brasileirão de 1984, das quais apenas um na condição de titular – números, ainda assim, suficientes para lhe outorgar o título de Campeão Brasileiro daquele ano.

Era, pois, com esse estatuto que Cascavel embarcava na sua primeira aventura internacional, rumando a Portugal para representar um dos três 'grandes' do País, no caso o Futebol Clube do Porto. Na Invicta, no entanto, o avançado ver-se-ia na mesma difícil posição que experienciara no Rio de Janeiro, enfrentando a concorrência desleal do 'Bi-Bota' Fernando Gomes, do qual estava fadado a ser eterno suplente. A sua única época ao serviço dos azuis e brancos saldou-se, assim, em uma única presença, antes de o avançado ter sido 'despachado' para Guimarães como parte do negócio em torno do guarda-redes Júnior Best – uma troca que acabaria por beneficiar todas as partes, já que as duas épocas na Cidade-Berço permitiriam a Cascavel relançar a carreira de forma nada menos que impressionante. Quarenta e sete golos em sessenta jogos são o saldo total do primeiro período alto da carreira do avançado desde os tempos dos distritais brasileiros, tendo a sua contribuição ajudado o Vitória FC a assegurar o terceiro lugar na época 1985-86, e a carimbar exibição honrosa na Taça UEFA do ano seguinte. Rapidamente se espalhava por Portugal e arredores o nome daquele avançado que marcava golos de todas as formas e feitios, e foi com total naturalidade que os vimaranenses viram a sua estrela ser abordada pelo segundo 'grande' português da sua carreira, desta feita localizado mais a Sul.

Esta segunda passagem por um clube de monta correria, no entanto, significativamente melhor a Paulinho Cascavel, que demonstrava em Lisboa os mesmos predicados técnicos e faro de golo que exibira em Guimarães, e se afirmava rapidamente como peça-chave do Sporting de finais dos anos 80. À entrada para a última temporada da década (e primeira dos 'noventas'), eram já mais de oitenta e cinco as presenças do avançado com o pentrado 'mullet' ao serviço dos Leões, ao longo das quais obtivera quarenta e cinco golos (sendo melhor marcador do campeonato na sua primeira época) e ajudara o clube a conquistar o seu único título nesse período, a Supertaça Cândido de Oliveira. A época de 1989/90 parecia, inicialmente, seguir nessa mesma toada, mas um desacordo com o então presidente do clube, Sousa Cintra, via Paulinho Cascavel perder preponderância na equipa, que viria a abandonar no final da temporada, tendo contribuído com meros três golos em cerca de duas dezenas e meia de presenças, números muito aquém dos que vinha obtendo em Portugal até então.

Um 'craque' em baixa anímica ou de forma não deixa, ainda assim, de ser um 'craque', e era com o máximo prazer que o Gil Vicente acolhia Paulinho Cascavel como parte do seu plantel para a época 1991/92. Esta fase da carreira do avançado ficaria, no entanto, marcada por outro conflito, este contra as sucessivas lesões que ia contraindo, e que culminaram no final da sua carreira profissional, aos trinta e dois anos, após apenas oito presenças com a camisola dos Galos.

Ao contrário de muitos dos nomes que abordamos nestas páginas, no entanto, Paulinho Cascavel não transitou para cargos técnicos ou federativos no seio do futebol, optando em vez disso por continuar a carreira por mais alguns anos, agora no Campeonato Nacional de Veteranos, onde se sagraria Bota de Ouro em cinco das seis épocas que fez ao serviço do Aliados de Lordelo. Penduradas definitivamente as chuteiras, o agora ex-jogador regressaria ao seu Brasil natal para se tornar empresário do ramo da pecuária, deixando a continuação do legado futebolístico ligado ao nome Cascavel à responsabilidade do filho, Guilherme, que desde 2005 vem representando diversos emblemas das divisões inferiores portuguesas, não tendo nunca logrado alcançar o alto nível atingido pelo pai. Continua, pois, a ser do jogador com o 'cabelinho à jogador da bola' (e bigode a condizer) e capacidade invulgar para marcar golos que muitos adeptos se lembrarão ao ouvir o nome Cascavel, merecendo o mesmo o seu lugar no panteão de Lendas da Primeira Divisão nacional. Parabéns, e que conte ainda muitos!

19.05.24

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

O objectivo desta rubrica – tal como das restantes que compõem o blog – passa, normalmente, pela 'repescagem' de elementos e experiências positivas que faziam parte do Portugal dos anos 90 e inícios de 2000; no entanto, ocasionalmente, é também necessário recordar efemérides menos agradáveis, mas que deixaram ainda assim marca indelével na década em causa, bem como nas subsequentes, como foram o caso Aquaparque ou a tragédia de cariz desportivo que recordamos este Domingo, escassas vinte e quatro horas volvidas sobre o seu vigésimo-oitavo aniversário. Falamos, claro está, da morte de um adepto do Sporting como consequência da explosão de um artefacto pirotécnico, em pleno Estádio do Jamor, durante o 'derby' a contar para a final da Taça de Portugal entre os 'leões' e os rivais da Segunda Circular, a 18 de Maio de 1996.

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O momento da tragédia, captado pelas câmaras televisivas presentes no estádio.

Estavam decorridos apenas dez minutos da partida quando, como forma de celebrar o golo inaugural marcado por Mauro Airez, um membro da claque organizada benfiquista 'No Name Boys' lança um 'very light', um tipo de foguete já então proibido por lei em áreas habitadas. Não contente com essa violação da lei, Hugo Inácio decidiu fazer 'pontaria', não para o ar, mas para a bancada Sul do estádio, onde se encontravam os adeptos do Sporting, num gesto deliberado que terminaria com a morte de Rui Mendes, de trinta e seis anos.Um crime de assassinato que deveria ter feito parar o jogo, mas ao qual não foi dada, no momento, a devida importância, tendo a partida continuado, com eventual resultado de 3-1 a favor do Benfica, e respectiva consagração como vencedor da competição – uma decisão que causou, e continua a causar, polémica, sobretudo entre adeptos dos 'leões' que sentem que a perda da vida de Mendes foi trivializada pelo prosseguimento da partida.

De facto, só mais tarde a FPF viria a mostrar solidariedade para com a família do adepto falecido, doando dez por cento da receita bruta de um jogo da Selecção Nacional para ajudar às despesas da mesma, já depois de o Sporting ter custeado na íntegra o funeral. Já Hugo Inácio viria a ser detido e a cumprir quatro anos de prisão, naquela que foi a primeira de muitas passagens do adepto pela prisão em anos subsequentes – pena que parecia pouca para o crime de homicídio qualificado, num desfecho que, novamente, revoltaria os sportinguistas. Quanto aos adeptos rivais, os mesmos incorporariam, a partir desse dia, um novo som à sua panóplia de cantos e palavras de ordem – um assobio a simular um foguete, ainda hoje ouvido em qualquer partida frente ao Sporting, numa 'picardia' de inequívoco mau gosto, que trivializa ainda mais uma tragédia perfeitamente evitável, e dá a entender que os No Name Boys tiveram orgulho no sucedido – uma ideia quase grotesca de tão revoltante.

Aquele que muitos consideram, justificadamente, o dia mais negro do desporto português acabou, ainda assim, por ter alguns (pequenos) efeitos positivos, nomeadamente a imposição de controlos muito mais restritos sobre a pirotecnia no contexto de jogos dos campeonatos portugueses, por forma a assegurar que tal situação nunca mais se repetisse; há, ainda, que ressalvar o facto de o ataque em causa ter vitimado apenas um adepto, e adulto. numa bancada onde se encontravam inúmeras crianças, podendo a acção deliberada do elemento da claque benfiquista ter tido um desfecho ainda muito pior. No entanto, a verdade é que nenhum destes factos ajudará a trazer de volta à vida Rui Mendes, mártir de uma paixão que, por vezes, assume contornos bem negros. Que continue a descansar em paz, e que nunca seja esquecido.

21.04.24

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

Em qualquer colectivo desportivo, seja uma equipa de futebol ou de qualquer outra modalidade, existem, inevitavelmente, dois tipos de jogadores: os que se destacam pela técnica e talento inato, e fazem a diferença a ponto de rapidamente serem cobiçados por outros clubes, e os chamados elementos 'de equipa', 'de plantel' ou 'de balneário', que, sem chegarem aos níveis de qualidade das mega-estrelas, mantêm um padrão consistente, e acabam por cumprir sempre que solicitados. A equipa do Sporting que quebrou o jejum de dezoito anos, nos últimos meses do Segundo Milénio e primeiros do seguinte, não era excepção a esta regra, e para cada André Cruz, Acosta ou Jardel havia um jogador mais discreto, mas não menos importante na forma de jogar da equipa. Um desses jogadores - que até viria mesmo a perder o lugar, durante essa época, para um concorrente 'fora de série' chegado em Janeiro – era um defesa-esquerdo internacional marroquino, então com vinte e cinco anos, e que chega este Domingo, dia 21 de Abril, ao exacto dobro dessa idade.

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Em acção pelo Sporting

Falamos de Abdelilah Saber, contratado dois anos antes ao seu primeiro clube, o local Wydad Athletic Club, de Casablanca, onde se estreara na equipa principal com apenas dezanove anos, e pelo qual realizara mais de uma centena de jogos, deixando indicações suficientes para lhe permitirem esse primeiro 'salto' para a Europa, no defeso de Inverno da época 1996/97, para integrar o Sporting de Octávio Machado. E se aqueles primeiros meses até correram de forma positiva, rapidamente o que parecia ser um sonho, se revelaria um pesadelo, já que o Sporting entraria em fluxo, ocasionando a famosa época dos quatro treinadores, durante a qual Saber trabalharia, no espaço de poucos meses, com Octávio, o seu adjunto Vital, o italiano Vicente Cantatore e, finalmente, José Couceiro, o nome que voltaria a trazer estabilidade ao Sporting.

Para o jovem marroquino, no entanto, este autêntico 'vendaval' pouco ajudava à sua adaptação a uma nova realidade e às distintas filosofias dos diferentes treinadores, causando alguns problemas de afirmação durante as temporada 97/98. Uma vez ultrapassado esse obstáculo, no entanto, Saber seria finalmente capaz de 'agarrar' a titularidade do lado direito da defesa, partindo para uma segunda temporada completa a bom nível, que o veria cimentar o seu lugar não só no plantel do Sporting mas também no da Selecção Nacional marroquina, que representava no Mundial de França '98, e pela qual conseguiria nesta fase o seu primeiro e único golo, num amigável frente ao Senegal que terminaria, precisamente, com um resultado de 1-0.

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Ao serviço da Selecção Nacional marroquina.

Esse momento de forma manter-se-ia, aliás, durante o que restava do século XX, sendo apenas já nos primeiros dias do Novo Milénio que o lateral perderia o estatuto de titular que a tanto custo conquistara, passando a actuar como suplente de um dos reforços de Janeiro – um brasileiro de nome César Prates, que os sportinguistas ainda hoje recordam com carinho pelas suas prestações ao serviço do clube e, sobretudo, pela forma letal como batia livres, muitos deles traduzidos em golos. Subitamente sem espaço no clube que representava há já três épocas, Saber viu por bem aceitar a proposta que lhe chegava de Itália, para um empréstimo ao Nápoles. Após uns primeiros meses bem sucedidos, no entanto, a proposta tornou-se permanente, encerrando o ciclo do marroquino no Sporting, que duraria quase exactamente quatro anos e se saldaria em cerca de seis dezenas de jogos.

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Com a camisola do Turim.

O resto da (surpreendentemente curta) carreira de Saber seria passado na Série B italiana, primeiro com duas temporadas em bom plano ao serviço do Nápoles, por quem contabilizaria quase cinquenta jogos, e depois com uma última como segunda linha do Turim; nesse mesmo Verão, com apenas trinta anos, o antigo internacional marroquino daria por encerrada a carreira como futebolista profissional, efectuando a inevitável transição para cargos técnicos, a qual o levaria de volta ao seu Marrocos local para treinar o Union Ait Melloui, clube formado poucos anos antes, em 1999.

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No Turim, onde faria a última época como profissional.

Seguir-se-iam períodos como treinador adjunto e interino do clube que o vira despontar para o futebol, o Wydad Casablanca, e onde ainda hoje actua como adjunto técnico – cargo, aliás, que combina com a personalidade consistente, competente e discreta que revelou durante o tempo nos relvados, e que o tornou elemento acarinhado, ainda que não idolatrado, dos plantéis do Sporting de finais do Segundo Milénio. Parabéns, e que conte muitos mais.

07.04.24

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

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O jogador com a camisola que o celebrizou.

No futebol português dos anos 80, 90 e 2000 (ainda mais do que no actual) existiu um conjunto bem demarcado de jogadores que, sem atingirem o nível de fama ou os altos vôos de alguns dos seus contemporâneos (nomeadamente os da chamada 'Geração de Ouro') conseguiram, ainda assim, afirmar-se como ícones de um ou mais clubes e, pela sua presença constante nos campeonatos nacionais da época, atingir o estatuto de Lendas da Primeira Divisão. Um dos principais nomes desse grupo – onde se incluem ainda jogadores como Emílio Peixe, Rui Barros ou Folha – foi um médio que, após iniciar a carreira como Cara (Des)conhecida ainda na década de 80, acabou eventualmente por fazer também parte do selecto contingente de jogadores que representaram mais do que um 'grande' em Portugal durante a sua carreira; falamos de António Manuel Pacheco Domingos (vulgarmente conhecido apenas pelo seu primeiro apelido), o 'histórico' do Benfica que chegou, também, a representar o Sporting, e que faleceu há cerca de duas semanas – a 20 de Março de 2024 – aos cinquenta e sete anos, em consequência de um ataque cardíaco. E porque, à data da sua morte, o 'blog' se encontrava em hiato temporário, fica agora, embora já com algum atraso, a nossa merecida homenagem a uma das muitas caras icónicas do futebol nacional de finais do século XX.

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Ainda jovem, no Torralta.

Nascido em Portimão, Algarve, no primeiro dia de Dezembro de 1966, António Pacheco iniciou carreira no modesto Torralta, clube em que realizara a maior parte da sua formação enquanto futebolista. Durante a única época em que representou o emblema, o médio fez pouco mais de três dezenas de jogos, contribuindo com oito golos, marca que se provaria suficiente para lhe garantir três presenças na Selecção Nacional Sub-18 despertar o interesse do outro clube por onde Pacheco passara enquanto jovem - o Portimonense, que representara na categoria de Iniciados. Assim, com apenas dezanove anos, e exactamente meia década após ter deixado o clube da sua terra natal, o atleta voltava a vestir de preto e branco, dando assim o considerável 'salto' das divisões distritais para o principal escalão nacional.

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O plantel do Portimonense para a época 1986-87; Pacheco está em baixo, à direita.

Este desafio não intimidou, no entanto, o médio, que partiria para nova época de destaque: sem ser titular indiscutível, Pacheco logrou registar vinte e três presenças ao serviço do Portimonense, bem como nove pela Selecção Nacional Sub-21, no decurso das quais demonstrou qualidade suficiente para alargar ainda mais os seus horizontes futebolísticos. Previsivelmente, não tardou a surgir na secretaria portimonense uma oferta pelos préstimos do promissor futebolista, oriunda da capital portuguesa, e de um dos principais emblemas dos campeonatos nacionais, o Sport Lisboa e Benfica.

Face a esta oferta nada menos do que irrecusável, o jovem Pacheco não teve outra escolha senão 'fazer as malas' e mudar-se de 'armas e bagagens' para Lisboa, no Verão de 1987, para equipar de vermelho e branco. E se muitos jogadores nas mesmas condições têm uma entrada mais gradual na equipa, por forma a habituá-los ao desafio, já no caso de Pacheco, o impacto foi imediato, tendo o médio logrado participar em mais de três dezenas e meia de partidas logo na sua primeira época, e contribuído com seis golos.

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Ao serviço da Selecção Nacional A.

Estava dado o mote para seis épocas a espalhar classe na zona intermédia benfiquista, sempre como peça-chave, durante as quais levantaria por duas vezes o troféu de Campeão Nacional (em 1988-89 e 1990-91), bem como uma Taça de Portugal e uma Supertaça, além de marcar presença em duas finais da então Taça dos Campeões Europeus (hoje Liga dos Campeões). Um autêntico 'conto de fadas', que estabeleceria Pacheco como um dos grandes ícones do clube encarnado, lhe carimbaria um lugar na Selecção Nacional A (que representaria seis vezes) e só viria a terminar no 'Verão quente' de 1993, fruto de um desentendimento com o então treinador do Benfica, Toni; pouco depois, os adeptos encarnados viam, com horror, Pacheco juntar-se ao colega de sector (e membro da 'Geração de Ouro') Paulo Sousa, e atravessar a Segunda Circular, ingressando no plantel do maior rival das 'águias', o Sporting.

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Com a 'listrada' do maior rival benfiquista.

Embora muito lembrado em Alvalade, no entanto, duraria apenas duas épocas a estadia de Pacheco no referido estádio, tendo o médio sido praticamente 'carta fora do baralho' na segunda (a de 1994-95), após ter estado ao seu nível na época anterior, em que foi um dos infelizes intervenientes num dos mais famosos 'derbies' da História do futebol português. Ainda assim, e apesar das 'desavenças' com o treinador Carlos Queiroz, as três presenças do médio na sua segunda temporada de leão ao peito chegariam para adicionar novo título ao seu palmarés pessoal, com a conquista da Taça de Portugal, um ano depois de ter visto o seu antigo clube voltar a sagrar-se campeão. Em Alvalade, Pacheco foi, ainda, colega de nomes tão ilustres no 'reino do leão' como Balakov, Oceano, Iordanov, Cherbakov, Stan Valckx, Juskowiak, Jorge Cadete, Emílio Peixe, Amunike, Ricardo Sá Pinto ou mesmo Luís Figo, além de uma futura Cara (Des)conhecida, um promissor jovem de nome Nuno Valente

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A homenagem do Belenenses, um dos vários clubes por que passou após deixar o Sporting.

Sem que ainda se soubesse, começava aí o declínio da carreira de Pacheco, que as épocas seguintes transformariam naquilo a que os britânicos chamam um 'journeyman' – um jogador que transita de clube em clube, sem nunca ter grande impacto em qualquer deles. Assim, foi decerto com tristeza que os fãs do médio viram um ex-internacional português ser peça 'periférica' dos plantéis de Belenenses, Santa Clara e Atlético, bem como da Reggiana, de Itália, que lhe proporcionou a primeira e única experiência 'fora de portas' – emblemas, note-se, que, pese embora o fugaz envolvimento com o jogador, não deixaram de lhe prestar homenagem aquando da notícia do seu falecimento.

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A única 'aventura' do médio fora de Portugal foi em Itália, ao serviço da Reggiana, que também lhe prestou homenagem aquando da nota de falecimento.

Seria, pois, necessário esperar até à ponta final do Segundo Milénio para ver a carreira de Pacheco ganhar um 'segundo fôlego': uma boa época ao serviço do Estoril garantiu alguma visibilidade ao então já veterano médio, que contribuiu para a campanha dos 'canarinhos' com quatro golos em cerca de duas dezenas e meia de presenças.

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Com a camisola do Estoril-Praia, na sua 'última salva' enquanto futebolista profissional.

Não foi, no entanto, suficiente para revitalizar o interesse no jogador, que saía pela 'porta pequena' logo na época seguinte, novamente ao serviço do Atlético, clube no qual faria a transição para cargos técnicos, assumindo a posição de treinador. Seguir-se-ia nova experiência como técnico, agora na sua 'casa-mãe', o Portimonense, antes de o ex-futebolista decidir enveredar por novos rumos, com a abertura de um bar em Lagos, estabelecimento que viria a gerir até ao seu prematuro falecimento em Março de 2024.

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No papel de treinador.

Para a história fica uma carreira honrosa, mas algo prejudicada pelo temperamento rebelde, sem o qual Pacheco talvez tivesse conseguido inscrever o seu nome junto dos de alguns dos seus mais ilustres contemporâneos – o que não invalida que o médio seja, por direito próprio, uma das Lendas da Primeira Divisão portuguesa noventista. Que descanse em paz.

11.02.24

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

Uma das grandes 'verdades implícitas' do futebol afirma que o melhor jogador das camadas jovens nem sempre será necessariamente o detentor da melhor carreira sénior; pelo contrário, na maior parte dos casos, uma mistura de falta de sorte, falta de oportunidade, imaturidade e factores externos acaba por condenar estes jovens a uma carreira não mais que honrosa, ou até mesmo ao 'esquecimento', bastando atentar nos famosos comentários de Cristiano Ronaldo sobre o colega de formação Fábio Paim para ter uma prova 'acabada' deste mesmo fenómeno.

Outro famoso exemplo, este cerca de uma década mais 'antigo', é o do jogador que recordamos este Domingo, apenas três dias após, aos cinquenta e dois anos, ter perdido a batalha contra a leucemia: um médio ofensivo (ou 'número dez') de consumado e reconhecido talento, Campeão do Mundo de sub-20 como parte da famosa 'Geração de Ouro', mas cuja carreira nunca logrou atingir os mesmos patamares das dos seus colegas de equipa na Selecção de Carlos Queiroz, incluindo a de um seu homónimo e colega de Selecção. Falamos de João Manuel de Oliveira Pinto, normalmente conhecido pelos seus dois apelidos, para o distinguir de dois homónimos contemporâneos: o histórico defesa-central do Porto com quem partilhava os dois nomes próprios, e o referido colega de posição na Selecção sub-20 de Lisboa '91, e futura estrela de Benfica e Sporting, João Vieira Pinto.

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O jogador ao serviço da Selecção

Formado nas então já célebres escolas do Sporting - onde foi campeão nacional de Juvenis e partihou o campo com nomes como Abel Xavier ou o futuro colega de Selecção Luís Figo - João Oliveira Pinto logrou vestir a camisola dos 'leões' apenas em uma ocasião, num jogo contra o Estoril a contar para a Taça de Honra de 1991/92, em que entrou como suplente, já na segunda parte; este efémero concretizar do sonho chegou já depois de um empréstimo ao Atlético lisboeta, então satélite do clube de Alvalade, onde o médio logrou realizar meras treze partidas antes do regresso a 'casa'.

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O cromo da Panini dos tempos do Gil Vicente (crédito da foto: Cromo Sem Caderneta)

Treze seria, também, o número de encontros que João Oliveira Pinto disputaria na temporada seguinte, já desvinculado do seu clube formador e efectivo no Vitória de Guimarães 'europeu' de Pedro Barbosa, Paulo Bento, Dimas, Quim Berto e Nuno Espírito Santo – apenas o primeiro de uma longa lista de clubes pelos quais o médio passaria nas nove temporadas subsequentes. Logo na época seguinte à passagem por Guimarães, por exemplo, Pinto ingressava no mesmo Estoril Praia que defrontara no seu único jogo com a 'listada' verde e branca, marcando presença em trinta e um jogos, contribuindo ainda com um golo.

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Com a camisola do Sporting de Braga.

Por sua vez, as boas exibições pelos 'canarinhos' valer-lhe-iam a transferência para o Gil Vicente, onde apenas na segunda época se lograria afirmar, com vinte e um jogos contra os quatorze de 1994/95, o suficiente para despertar o interesse do Braga de Quim e Karoglan. E se a primeira época na 'Pedreira' correu de feição, com vinte e seis presenças na equipa principal e um golo marcado, já a segunda veria o médio perder lugar no seio do plantel, figurando em apenas oito partidas no total da época. Estava, pois, na altura de novo 'salto', que levaria João Oliveira Pinto de um extremo ao outro do País, para assinar pelo Farense. Nova época em bom plano, com trinta e duas presenças no 'onze' e três golos (um recorde de carreira) suscitariam nova 'viagem', desta feita rumo às ilhas, para representar o Marítimo.

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O médio no Farense.

Na Madeira, o médio passaria duas épocas como elemento de 'rotação' (contribuindo, ainda assim, com vinte e quatro partidas e três golos) antes de, no final da primeira época completa do Novo Milénio, rumar à Académica, da então chamada Segunda Divisão de Honra. Apesar da temporada em relativamente bom plano, seria o primeiro de sucessivos 'passos atrás' na carreira, que veriam o outrora promissor médio passar de peça importante em históricos do escalão máximo do futebol nacional para reforço parcamente utilizado de clubes de ligas secundárias ou mesmo distritais, como o Imortal, Sesimbra, Amora (último clube onde se logrou impôr, com trinta presenças e dois golos na época 2003/04) e Alfarim, onde terminaria a carreira, já perto dos quarenta anos.

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João Pinto era, actualmente, dirigente do Sindicato dos Jogadores e delegado da FPF.

Ao contrário de muitos dos seus contemporâneos, João Oliveira Pinto não assumiu, após pendurar as botas, a carreira de treinador, embora se tivesse mantido ligado à Federação Portuguesa e Sindicato dos Jogadores do desporto do qual, em tempos, fora tido como uma das grandes esperanças, mas onde, fosse por que razão fosse, nunca se conseguira afirmar ao nível desejado. Ainda assim, a imagem que fica após a sua 'partida' é a de um jogador tenaz, talentoso, e a quem apenas faltou uma 'pontinha' de sorte para chegar a ser mais do que aquilo a que os britânicos se referem como um 'journeyman'; um caso, portanto, semelhante ao dos inúmeros outros jovens de que falávamos no início deste texto, e que deveria ser 'caso de estudo' para os mesmos nas Academias deste País, como símbolo de perserverança, esforço e ética profissional em prol da manutenção da carreira. Que descanse em paz.

14.01.24

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

Já aqui anteriormente aludimos a jogadores que atingiram o sucesso em dois ou mais dos chamados 'três grandes' portugueses. Apesar de a referida lista não ser, de modo algum, extensa, é ainda relativamente fácil, mesmo para o adepto mais 'distraído', recordar nomes como Simão Sabrosa, Ricardo Quaresma, João Moutinho, Zlatko Zahovic ou – mais distanciados no tempo – João Vieira Pinto, Mário Jardel, Paulo Bento ou Sergei Yuran. O futebolista que abordamos este Domingo – por ocasião do seu quinquagésimo-segundo aniversário – alia a sua presença nessa lista a um estatuto de 'Grande dos Pequenos' que só lhe é negado, precisamente, pelo facto de ter jogado em ambos os lados da Segunda Circular lisboeta.

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Um jovem Rui Bento em início de carreira ao serviço do Benfica.

Isto porque Rui Fernando da Silva Calapez Patrício Bento – médio-defensivo algarvio integrante oficial da Geração de Ouro campeã de sub-20 em 1991 e da equipa Olímpica de Atlanta 1996, e um dos dois 'Bentos' a ganhar fama nessa posição durante a década de 90 – passou a grande maioria da sua carreira, não na Lisboa onde se formara para o futebol, mas na capital rival, onde envergou a 'malha' axadrezada do histórico Boavista, então em meio a uma das melhores fases da sua ilustre História.

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Bento com a camisola que o celebrizou

Contratado ao Benfica no início da época 1991/92após uma temporada em que foi elemento importante do plantel, e que de forma alguma faria prever tal transferência – o médio de 'trunfa' encaracolada apenas viria a deixar o Bessa exactas dez épocas depois, já com estatuto de lenda viva e histórico do clube, para ingressar no terceiro emblema da sua carreira (e segundo 'grande'), onde ainda chegaria a tempo de - ao lado do 'outro' Bento e dos referidos Ricardo Quaresma, Mário Jardel e João Vieira Pinto, além de colegas de Selecção como Dimas e Rui Jorge - ser peça-chave na conquista do segundo título de Campeão Nacional em três anos, ainda hoje o intervalo entre títulos mais curto para o Sporting da era moderna. Curiosamente, Bento chegava a Alvalade já com estatuto de campeão, tendo feito parte integrante do inédito e histórico triunfo do Boavista na época transacta.

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O médio no Sporting.

Seguir-se-iam mais duas épocas em Alvalade, ao longo das quais Rui Bento assistiria em 'primeira mão' ao despontar do maior talento de sempre no futebol português (o médio encontrava-se, aliás, em campo quando Cristiano fez o primeiro, e impressionante, golo da sua carreira sénior, frente ao Moreirense) antes de perder preponderância como consequência da idade, dando lugar a novos talentos na zona central. Para trás ficavam mais de uma dúzia de temporadas como jogador sénior, das quais apenas a primeira e a última não o tinham visto actuar como peça preponderante da equipa em que militava – um registo mais do que honroso para aquele que foi, simultaneamente, um dos principais nomes da Primeira Divisão portuguesa noventista, e um dos seus mais discretos.

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Ao serviço da Selecção Nacional.

Tal como tantos outros nomes que figuram nesta rubrica, também Rui Bento não deixou que o 'pendurar de botas' equivalesse ao seu 'fim' para o futebol, transitando para cargos técnicos após o final da carreira, nomeadamente para o de treinador. Académico de Viseu, Barreirense e Penafiel proporcionaram ao ex-médio defensivo as suas primeiras experiências profissionais nessa categoria, antes de o mesmo ser contactado pelo 'seu' Boavista, no início da época 2008-2009. Infelizmente, a passagem de Bento pelo Bonfim como treinador ficaria muito longe da que fizera enquanto jogador, durando apenas um ano, após o qual o ex-internacional português seria destacado pela Federação Portuguesa de Futebol para o cargo de Seleccionador Nacional sub-17; a estadia neste cargo seria, no entanto, novamente curta, tendo Rui Bento rapidamente regressado ao universo clubístico, para treinar o Beira-Mar.

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Bento na sua posição actual como treinador do Kuwait.

Em Aveiro, o ex-médio mal chegaria a aquecer o banco, antes de embarcar na primeira 'aventura' no estrangeiro de toda a sua vida, assumindo o comando do Bangkok United, do campeonato tailandês; mais uma vez, no entanto, a estadia de Bento na Ásia duraria apenas uma época, tendo o ex-internacional português regressado ao seu país-natal no Verão de 2015 para treinar o Tondela, antes de reassumir o cargo de seleccionador das camadas jovens, em 2016. Durante os seis anos seguintes, Bento trabalharia com todos os escalões entre sub-17 e sub-20, antes de ser promovido a seleccionador sénior...da Selecção do Kuwait, cargo que actualmente desempenha. Um posto algo aquém do que a sua carreira como jogador mereceria, talvez, mas que consegue ser, simultaneamente, discreto e essencial para o desempenho da equipa – precisamente como o era Rui Bento enquanto jogador de campo. Parabéns, e que conte ainda muitos.

04.01.24

Os anos 90 viram surgir nas bancas muitas e boas revistas, não só dirigidas ao público jovem como também generalistas, mas de interesse para o mesmo. Nesta rubrica, recordamos alguns dos títulos mais marcantes dentro desse espectro.

Embora tradicionalmente dominada pelos três aparentemente perenes jornais diários, a imprensa desportiva em Portugal tem visto, ao longo dos anos, serem feitas várias outras tentativas de penetração de mercado, nomeadamente através do lançamento de revistas especializadas. Infelizmente, são poucos os exemplos deste tipo de publicação que atingem, verdadeiramente, algum grau de sucesso, preferindo o público, invariavelmente, adquirir os 'magazines' ligados aos três diários, em vez de uma publicação nova. De facto, as únicas publicações dignas de nota nas últimas três a quatro décadas foram a 'Futebolista' (publicada já no Novo Milénio) e a revista de que falamos hoje, que conseguiu obter uma longevidade honrosa entre o seu aparecimento em meados da década de 80 e a sua extinção em inícios da seguinte.

104638175.jpg(Crédito da foto: TodoColección)

Falamos da simplesmente intitulada 'Foot', uma daquelas publicações de que hoje restam apenas as capas, no contexto de leilões em 'sites' como o OLX e o TodoColección (de onde sai a capa que ilustra este 'post'); assim, e à semelhança do que aconteceu anteriormente com revistas como a 'Basquetebol', quaisquer ilações sobre o conteúdo proposto por esta publicação têm, necessariamente, de ser retiradas apenas das 'parangonas', cabeçalhos e imagens das referidas capas. Com base neste elementos, é possível deduzir que a 'Foot' se centrava, sobretudo, no futebol nacional, com natural ênfase nos três 'grandes', mas sem esquecer o que se passava no panorama internacional, quer a nível de clubes, quer de selecções - e, ao contrário de outras publicações do género, sem deixar espaço a outras modalidades; esta era, exclusivamente, uma revista de futebol, à semelhança do que, uma década mais tarde, sucederia com a 'Mundial'.

Sendo o mesmo, de longe, o desporto mais popular em Portugal, foi com naturalidade que a 'Foot' encontrou o seu público, logrando manter-se nas bancas do seu lançamento em 1984 até pelo menos a Dezembro de 1990, mês em que saiu a revista que ilustra esta publicação. Assim, e apesar de a grande maioria da sua trajectória ter tido lugar na década de 80, a revista em causa qualifica-se para inserção nas páginas desta nossa rubrica, que, como sucedeu em casos anteriores, passa por definição a ser a principal fonte de informação sobre esta publicação algo 'Esquecida Pela Net', mas decerto lembrada pelos adeptos da geração 'X' , pelos 'millennials' mais velhos, e por qualquer outro adepto que já seguisse as competições profissionais portuguesas nos anos 80.

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