06.01.22
Os anos 90 viram surgir nas bancas muitas e boas revistas, não só dirigidas ao público jovem como também generalistas, mas de interesse para o mesmo. Nesta rubrica, recordamos alguns dos títulos mais marcantes dentro desse espectro.
O segmento adolescente é, tradicionalmente, um dos mais directamente desejados pela maioria das companhias de venda e criação de produtos, seja qual for o sector. Armados com dinheiro próprio, ao contrário do público infantil, e sem despesas obrigatórias em que o gastar – além dos impulsos e desejos ainda por refrear e das emoções constantemente à flor da pele – este segmento de mercado é um dos que mais gastos não-essenciais faz, pelo que não é de admirar que, ano após ano, surjam inúmeros produtos exclusivamente a eles dedicados.
Nos anos 90, antes do advento da Internet e do subsequente acesso directo a toda e qualquer informação desejada (bem, excepto imagens de certos produtos de época que ninguém se lembrou de registar...) um dos mais prolíferos sectores no que toca a produções dirigidas em específico a adolescentes era a imprensa. Ainda sem 'smartphones' nem 'websites' de onde extrair a informação (o píncaro da tecnologia móvel no final dos 90s ainda eram os telemóveis Nokia, e os sites ainda consistiam de 'layouts' básicos, em cores berrantes, e com muitos 'gif's à mistura) os adolescentes procuravam nas bancas as últimas novidades sobre os temas que mais lhes interessavam – e a imprensa oferecia-lhes precisamente o que procuravam. Dos videojogos à música e do desporto às 'fofocas' sobre celebridades atraentes, os quiosques e tabacarias portugueses dos anos 90 tinham de tudo um pouco para agradar aos jovens, e a maioria das publicações desta era da imprensa portuguesa tiveram ciclos de vida de vários anos, senão mesmo décadas, acabando por ter como carrasco, precisamente, a Internet 2.0.
Um destes títulos, que encerrou funções em 2018 após honrosos vinte e cinco anos de publicação, foi a versão portuguesa da revista 'Ragazza', um conceito originalmente idealizado em Espanha (e não em Itália, como se poderia pensar) e que se posicionava, em termos simples, como a resposta a publicações como a 'Cosmopolitan' para um público adolescente.
Capa de uma edição moderna da versão portuguesa da revista
Lançada em Portugal em 1993, e recheada, mês após mês, com exactamente o tipo de artigos em que se pensa quando se pensa neste tipo de revistas – de supostos 'truques' para atrair o sexo oposto a artigos com conselhos sobre saúde ou moda, passando pelos inevitáveis 'posters' de artistas bem-parecidos e pela ainda menos evitável secção de cartas das leitoras – a 'Ragazza' servia, para grande parte do seu público, como um complemento ao binómio 'Super Pop' e 'Bravo', na altura ainda importadas dos respectivos países de origem, e cujos conteúdos tendiam a ser bem mais leves e superficiais; já a 'Ragazza' conseguia combinar essa leviandade com temas bem mais sérios, mas nem por isso de menos interesse para um público ávido de conselhos, e que, regra geral, tendia a não confiar nos adultos que lhe eram próximos para os elucidar.
Não é, pois, de estranhar, que a revista tenha sido um verdadeiro sucesso de vendas à época do seu lançamento, conseguindo um nível de tracção entre a demografia-alvo (e, consequentemente, de sucesso e longevidade) a que nenhuma das suas duas concorrentes directas à época do lançamento conseguiu alguma vez almejar. Prova disso é que não existe, na Internet actual, qualquer vestígio da '20 Anos', e o artigo da Wikipédia relativo à 'Teenager' consiste de...uma linha, que menciona apenas as datas de início e fim da publicação e o nome do editor: já a ´Ragazza´ tem páginas e blogs a si dedicados, maioritariamente por ex-leitoras desiludidas com o encerramento da publicação.
A esses memoriais junta-se agora mais este, por parte de alguém que, apesar de fazer parte da metade errada da população humana para alguma vez ter lido sequer uma linha desta publicação (ainda mais à época!), nem por isso deixa de reconhecer a influência e importância, no contexto da imprensa juvenil nacional de finais do século XX e inícios do seguinte, de uma revista que, mesmo tendo sido descontinuada, continua ainda assim a viver nas mentes e nos corações das suas antigas leitoras.