27.06.24
NOTA: Este 'post' é respeitante a Quarta-feira, 26 de Junho de 2024.
Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog.
Numa altura em que o dinheiro se torna cada vez mais digital e virtual – havendo mesmo quem se oponha explícita e abertamente ao pagamento em notas ou moedas – e em que os cartões Multibanco surgem na vida dos jovens em idades cada vez mais novas, o conceito de um recipiente onde se depositavam, religiosa e afanosamente, os 'trocos' que compunham a mesada ou semanada, ou as notas maiores recebidas nos anos e Natal, pode parecer perfeitamente obsoleto, e até algo pitoresco. E, no entanto, tal objecto fez parte integrante da infância e adolescência de qualquer português integrante da geração 'millennial' ou de qualquer das anteriores, perfilando-se muitas vezes como um 'baú do tesouro' ou até como o 'salvador da Pátria' em momentos de maior 'aperto' financeiro.
Um modelo bem típico - em todos os sentidos.
Falamos, é claro, do mealheiro (ou 'cofre'), eternamente simbolizado na cultura popular sob a forma de um porquinho, mas que, para os jovens portugueses de finais do século XX, tinha uma aparência substancialmente diferente, normalmente oval ou cilíndrica, e decorada a toda a volta com motivos que iam desde padrões 'da moda' a personagens de banda desenhada e filmes, ou até logotipos de bandas ou clubes desportivos - curiosamente, foi apenas nos últimos anos que o 'porquinho mealheiro' propriamente dito penetrou na sociedade portuguesa, através de uma série de cofres 'de autor', cada um decorado consoante um determinado tema. De igual modo, ninguém no seu 'perfeito juízo' pensaria em partir o mealheiro, como tantas vezes se vê em filmes ou livros: isto porque, além de serem feitos de lata (e, como tal, manifestamente difíceis de quebrar) estes mealheiros tinham, regra geral, tampas removíveis, bastando aplicar pressão no sítio certo para que as mesmas saltassem e permitissem acesso aos conteúdos do cofre, anulando assim a necessidade de recorrer a medidas drásticas. Até mesmo a outra variante popular de mealheiros – estes, sim, de gesso, e esculpidos em forma de animais ou figuras humanas caricaturadas – possuía uma pequena tampa em borracha, extremamente fácil de levantar, tornando assim redundante o habitual martelo utilizado por inúmeros personagens de ficção para aceder às suas economias. Um toque manifestamente prático, e que maximizava a funcionalidade destes mealheiros, os quais seria um 'crime' partir, dada a sua função dupla como atraentes objectos de decoração para a prateleira do quarto – um propósito no qual os mealheiros mais 'tradicionais' também não se saíam, diga-se, nada mal...
Fosse qual fosse a 'variante' preferida, no entanto, não haverá nos dias que correm português na casa dos trinta ou mais anos que não tenha, na infância, guardado as suas (parcas) economias em formato físico, num mealheiro, quiçá sonhando com o dia em que teria o suficiente para adquirir os patins em linha ou a consola há tanto desejados. Pena é, apenas, que o avanço tecnológico tenha negado também esta experiência à Geração Z, ficando assim a mesma restrita exclusivamente ao domínio nostálgico das gerações mais velhas, e a páginas como a deste 'blog' nostálgico, onde não deixa, ainda assim, de receber a devida (e merecida) homenagem.