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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

11.02.23

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais e momentos.

Já aqui por várias vezes fizemos referência aos centros comerciais tradicionais, 'residência' habitual de espaços hoje tão ultrapassados como videoclubes, lojas de discos independentes ou pequenas discotecas; estava, no entanto, ainda a faltar um artigo sobre estes espaços em si – falha que procuraremos, hoje, corrigir dedicando algumas linhas àquilo que passava por uma 'grande superfície' antes do advento dos 'shoppings' e hipermercados.

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O Apolo 70, em Lisboa, um dos mais icónicos estabelecimentos deste tipo

Presentes em quase todas as localidades ou povoações de algum tamanho em Portugal (e, ainda hoje, existentes em algumas delas, embora sob uma forma marcadamente mais 'esquelética' do que naqueles tempos) os centros comerciais tradicionais dividiam-se, grosso modo, em dois tipos: as chamadas galerias, que reuniam num mesmo espaço vários tipos de pequenos retalhistas, e aqueles que serviam, principalmente, de apoio a um supermercado. Ambos os tipos eram bastante comuns, não se podendo dizer que qualquer deles se superiorizasse ao outro, e ambos tendiam a oferecer algumas das 'necessidades básicas' do consumidor de bairro: boutiques, tabacarias, pequenos snack-bars, livrarias ou lojas de impressão, brinquedos ou informática (além dos espaços supramencionados) eram apenas alguns dos tipos de estabelecimento mais comummente encontrados em espaços deste tipo.

A ideia era, portanto, que um consumidor conseguisse encontrar num só edifício tudo aquilo de que necessitava, independentemente da sua natureza – daí o nome 'centro comercial'. Um conceito que, mais tarde, seria 'apropriado' e expandido pelas grandes superfícies, fazendo, ironicamente, com que os inovadores originais parecessem ultrapassados e pitorescos por comparação aos novos mega-espaços.

Ainda assim, a persistência do 'comércio de bairro' em muitas localidades portuguesas permitiu à maioria dos centros comerciais 'clássicos' protelar a sua extinção – ainda que, muitas vezes, a mesma se tenha apenas traduzido num modelo de 'morte lenta' tão deprimente quanto prejudicial às companhias que ocupavam o espaço. Na maioria dos casos, era o fecho do supermercado ou de uma das lojas principais (ou ainda a extinção da sala de cinema, outro apanágio deste tipo de espaços) que ditava o fim da galeria, sendo que muitas arriscavam, ainda, numa tentativa de renovação, invariavelmente (e infelizmente) malograda.

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O estado e aparência actual da maioria dos centros comerciais tradicionais portugueses.

Ainda assim, os habitantes das principais cidades do País (bem como de muitas vilas mais pequenas) terão ainda, potencialmente, contacto diário com este tipo de espaço, quanto mais não seja por lhes passarem à porta a caminho de casa, do emprego ou de qualquer outra actividade; e, nessas alturas, é de crer que a mente lhes 'voe' para outros tempos, em que percorriam com regularidade aqueles mesmos corredores, em busca das lojas favoritas e dos 'tesouros' que as mesmas escondiam.

12.03.22

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais.

Comprar ou receber brinquedos é um dos pontos altos da vida quotidiana de qualquer criança, independentemente da época em que viva. Seja algo mais pequeno e simbólico, como uma boneca ou uma figura de acção, ou um presente 'grande' – normalmente de anos ou Natal – este é daqueles momentos que, por muito que a sociedade mude, nunca deixa de perder o impacto para as gerações mais novas.

O que muitos destes actualmente jovens nunca saberão, no entanto – ou saberão apenas em 'segunda mão', através dos relatos dos pais – é que, nas últimas décadas do século XX, o acto de adquirir um brinquedo tinha, ainda, mais UM aspecto memorável e que adicionava (e muito) à experiência – nomeadamente, o próprio acto de ir à loja escolher o que se queria comprar.

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Sim, a Saída de hoje tem como destino um bastião da cultura e vida quotidiana infanto-juvenil do século XX, que não sobreviveu à 'viragem' digital do novo milénio: as lojas de brinquedos, na sua concepção tradicional. E por mais difícil que seja às crianças de hoje em dia conceber a existência de um ou mais destes estabelecimentos na maioria dos pequenos centros comerciais situados em bairros urbanos – ou mesmo a existência de brinquedos fora das prateleiras dos supermercados e hipermercados – a verdade é que a geração que tem hoje idade para ser progenitor dessas mesmas crianças passou muito tempo em lojas deste tipo, de boca aberta e olhos a brilhar, a tentar assimilar as possibilidades contidas naquilo que os rodeava.

De facto, as lojas de brinquedos, tal como eram entendidas à época, eram verdadeiros 'baús do tesouro', repletos de sonhos e potenciais brincadeiras, e cujas prateleiras – normalmente apenas meia dúzia, em duas ou três secções – pareciam não ter fim. Nas mais pequenas, este efeito era ainda exacerbado pela disposição anárquica do inventário, normalmente exposto onde havia espaço, independentemente de qualquer lógica – o que resultava, inevitavelmente, em 'pilhas' de brinquedos apenas vagamente relacionados uns com os outros, exactamente como se de um tesouro se tratasse; já as lojas maiores colmatavam a disposição mais organizada dos seus produtos com a presença de consolas, muitas vezes disponíveis para jogos de teste, embora a presença de comandos desligados ou escondidos atrás de um vidro protector fosse também frequente.

Fosse qual fosse a configuração, no entanto, o efeito no público-alvo era o mesmo – algo equivalente ao consumo de açúcar em excesso, que fazia a criança querer comprar tudo o que via, independentemente do preço. E apesar de o produto adquirido ser, na maioria das vezes, de índole menos extravagante (por aqui, por exemplo, era normalmente um conjunto de veículo e mini-figura da LEGO, embora, numa ocasião memorável, se tenha regressado de uma das lojas do nosso bairro com um Game Boy edição especial, verde, e o então novíssimo jogo 'Pokémon Blue') a verdade é que, ao sair de uma loja de brinquedos, a criança deixava intactas todas as possibilidades da mesma, com a promessa mental de voltar muito em breve - e quiçá com mais disponibilidade monetária - para novamente as explorar...

Este efeito foi, aliás, exacerbado a partir de 1993, quando os jovens portugueses ficaram a conhecer esse verdadeiro 'hipermercado dos brinquedos' que os seus congéneres americanos conheciam há já várias décadas: o Toys'R'Us. As primeiras lojas da multi-nacional especializada norte-americana a abrir em Portugal, situadas em Lisboa, e em Vila Nova de Gaia, tiveram sobre o seu público-alvo o previsível impacto, tornando uma 'romaria' periódica a esse mesmo espaço algo obrigatório para quem morava na área - o autor deste blog, por exemplo, visitou várias vezes a loja de Lisboa, situada no espaço do supermercado Carrefour (hoje Continente) na zona de Telheiras.

Isto porque, embora o Toys'R'Us não tivesse o charme e ambiente de 'caixinha de surpresas' das lojas a que a juventude daquele tempo estava habituada, este factor era mais do que compensado por uma loja do tamanho de um hipermercado, mas em que os brinquedos e outros produtos de interesse directo para as crianças, como as bicicletas, não ficavam confinados a apenas uma secção, dominando antes, pelo contrário, todo o espaço; onde o Carrefour, mesmo ali ao lado, tinha roupa, electrodomésticos ou produtos alimentares, o Toys'R'Us tinha brinquedos, bicicletas, jogos de tabuleiro, consolas e respectivos jogos, e muitos outros produtos altamente desejáveis para a demografia que procurava aliciar; e quem visitou este espaço na idade certa, certamente se lembrará da sensação que tal visita provocava, tornando ainda mais deprimente a realidade do desaparecimento da companhia, por motivos de insolvência, em 2019.

Qualquer que fosse o tipo de loja de brinquedos visitado, no entanto, a experiência saldava-se, invariavelmente, como extremamente positiva, e até memorável – afinal, qual a criança que não gosta de ter brinquedos novos, especialmente por si escolhidos? Infelizmente, e como já referimos no início deste texto, esta é, à semelhança de outras Saídas de que aqui falamos, uma visita irrepetível; a loja de brinquedos 'de bairro', como conceito, desapareceu, 'esmagada' pelos hipermercados e pelo vertiginoso crescimento dos retalhistas 'online', como a Amazon. Os poucos estabelecimentos deste tipo que ainda restam têm a tradicionalidade como parte do seu conceito distintivo, ou seja, são especificamente concebidos para evocarem uma loja de brinquedos tradicional, por oposição a serem apenas um negócio de venda de brinquedos, igual a tantos outros, que alguém montou numa loja de segunda-cave de um centro comercial 'à moda antiga'; essas, onde tantos jovens de fins do século XX passaram tantos bons momentos na infância e adolescência, são hoje do domínio exclusivo do 'álbum de retratos' mental que a maioria de nós ainda retém daquele tempo...

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