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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

04.01.23

Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog.

E depois de termos já falado da série animada e dos jogos de vídeo baseados na popular série de livros infantis 'Onde Está o Wally?', nada mais natural do que dedicarmos algumas linhas aos volumes que deram início a uma das mais curiosas 'febres' infanto-juvenis dos anos 90.

Corria o ano de 1987 quando o ilustrador inglês Martin Handford logrou, finalmente, dar vida à ideia que tivera há já alguns anos a essa parte: a de criar um livro (ou série de livros) infantis cujo conceito principal fosse a procura de um único personagem em meio a uma cena propositalmente hiper-povoada, e cheia de pequenas 'distracções' e armadilhas para enganar o leitor e, assim, aumentar a diversão. O objecto da procura, esse, era um personagem criado pelo próprio Handford – um jovem de óculos e roupa listrada, equipado 'à explorador', a que o autor chamou Wally (ou, para as edições americanas, Waldo.) 

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O volume que começou a 'febre'.

Tinha assim, através de um singelo livro de capa azul-clara (ela própria uma cena onde procurar o protagonista) aquilo que viria a transformar-se numa das mais populares obras literárias da década, dando origem a uma série de volumes de conceito e realização cada vez mais complexa; não só as imagens se tornavam ainda mais movimentadas (ao ponto de o primeiro volume parecer quase um 'tutorial' para as suas próprias sequelas) como também surgiam novos personagens para serem descobertos pelo leitor – primeiro o sábio Barba-Branca, e mais tarde a namorada e cão de Wally, bem como o seu rival Odlaw, conhecido em Português pelo memorável nome de Estranho-À-Lei.

Junta, esta 'pandilha' aventurava-se pelos mais diversos lugares, desde Hollywood à Lua, chegando mesmo a quebrar barreiras espácio-temporais que lhes permitiam viajar para outras eras da evolução humana – tudo, claro, em nome da criação de 'puzzles' visuais bem divertidos, recheados de deliciosos pormenores e, claro, várias áreas vermelhas e brancas, que apenas em segunda análise se revelavam não ser o protagonista. Uma fórmula simples, mas extremamente original e divertida, que tornou (merecidamente) Wally um sucesso entre a juventude da altura, dando mesmo azo a uma onda de 'imitadores', alguns deles protagonizados por personagens tão populares como Astérix; escusado será dizer que nenhum destes tomos teve uma fracção do sucesso do original, ou não nos ensinasse a Kellogg's que 'o original é sempre o melhor...'

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O disfarce de Wally, uma escolha surpreendentemente popular em festas de Carnaval.

O próprio Wally teve, claro, também direito aos seus próprios produtos licenciados, que iam desde os 'puzzles' (dos verdadeiros, aqueles de peças) aos já referidos videojogos; ainda hoje, no entanto, o 'item' referente ao personagem mais popular entre o seu público-alvo são as réplicas carnavalescas da sua fatiota característica, uma escolha frequente mesmo em festas de Carnaval de adultos - prova cabal do impacto que Wally teve naquela que foi, talvez, a última geração a interessar-se, verdadeiramente, por coisas que não envolviam ecrãs, e que obrigavam a puxar pela cabeça...

07.12.22

Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog.

Durante os anos 90, o nome Majora foi praticamente sinónimo com diversos tipos de produtos infantis, em particular os jogos de tabuleiro, como o Sabichão. No entanto, o que muitas ex-crianças daquela época decerto não recordarão é que a companhia se lançou também, durante esse período, no campo da edição literária para crianças, conseguindo um sucesso nada negligenciável com duas colecções distintas, ambas, curiosamente, de volta às livrarias e bancas portuguesas três décadas depois: a famosa colecção 'recortada' e a sua congénere (literalmente) de bolso, a Colecção Formiiguinha – duas séries de livros com tanto em comum como de diferente.

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Alguns dos títulos de ambas as colecções.

Em comum, ambas as colecções tinham os desenhos 'fofinhos', os quais, no caso da colecção 'recortada', eram transversais a todo o livro, enquanto que na 'Formiguinha' se cingiam apenas a algumas das capas, tendo outras ilustrações mais realistas, semelhantes às encontradas no interior dos livros. Outro ponto em comum era a linguagem rebuscada, por vezes com palavras além da compreensão do público-alvo ou fraseamentos fora do vulgar, que acabavam por formar parte da identidade destas duas séries.

Terminavam aí, no entanto, os pontos em comum - pelo menos se não se contar com o facto de ambas serem dirigidas a um público declaradamente infantil; isto porque, enquanto que a colecção 'recortada' ser destinada a uma demografia extremamente jovem, ainda em fase de alfabetização, a 'Formiguinha' tinha, já, mais 'que ler', sendo apropriada para um sector algo mais 'crescido' do público-alvo. Outra diferença importante prendia-se com o facto de, enquanto que a colecção 'recortada' apresentava, invariavelmente, histórias prazerosas, ao estilo 'slice of life' e sem grandes perigos ou consequências, a 'Formiguinha' basear muitos dos seus volumes em histórias, contos e lendas pré-existentes, fossem tradicionais ou criados por um dos grandes nomes do género – o que significava que, ao contrário do que acontecia com a sua 'prima direita', as histórias nem sempre eram isentas de situações 'fortes' ou tinham finais felizes, antes pelo contrário; de facto, não deixa de ser surpreendente ver a 'Formiguinha' de regresso ao convívio dos jovens portugueses, numa era em que alguns dos seus conteúdos fariam tremer certos sectores da sociedade...

Não deixa também, ainda assim, de ser agradável para quem cresceu com estes livros ver restaurado este elo nostálgico ao final do século passado, mesmo que seja através do equivalente infantil a literatura 'de cordel' (nenhuma das colecções declarava quaisquer autores, como é óbvio); mais, os pais que cresceram com estas histórias de cachorrinhos a tomar banho ou pobres enteadas alimentadas a 'côdeas de pão duro e bolorento' podem, agora, apresentar as mesmas aos seus filhos, fomentando-lhes o gosto pela leitura ao mesmo tempo que mantêm viva a chama nostálgica da sua própria infância – uma situação, portanto, em que todos saem a ganhar...

16.11.22

Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog.

Em edições passadas desta rubrica, passámos em revista alguns dos principais títulos da literatura infanto-juvenil produzida durante os anos 90, tanto em Portugal, como no estrangeiro. No entanto, apesar de termos tentado ser o mais metódicos possível, deixámos, na altura, que um par de obras importantes nos 'escapassem' por debaixo do 'radar'; e se, numa Quarta posterior, corrigimos esse erro em relação à colecção Viagens no Tempo, chega agora o momento de abordar outro dos grandes títulos 'esquecidos' pela nossa quadrilogia de posts, e que fez parte integrante da juventude literária da maioria da geração de 80, 90 e 2000.

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Falamos de 'A Lua de Joana', obra de Maria Teresa Maia Gonzalez (metade do duo responsável pela série ''O Clube das Chaves') editada em Outubro de 1994 e que se afirma, acima de tudo, como a resposta (ou antes, a versão) portuguesa de 'Perguntem À Alice', obra popular durante a década de 1970 e cuja temática e estrutura eram praticamente idênticos ao do livro aqui em análise, cuja única (mas crucial) diferença é a ausência da 'artimanha' que tornou o referido livro famoso à época do lançamento e, mais, tarde, infame. De facto, 'A Lua de Joana' nunca tenta fazer-se passar pelo testemunho real de uma verdadeira adolescente toxicómana; pelo contrário, o nome da autora figura de forma bem proeminente na capa, permitindo a qualquer potencial leitor saber que se trata de uma obra de ficção - ainda que sobre um problema bem real, especialmente à época. De resto, tanto o formato em primeira pessoa (no caso sob o formato de cartas a uma amiga falecida, por oposição a um diário) como o percurso da protagonista rumo a um final inevitavelmente infeliz fazem lembrar o relato da antecessora estrangeira, ainda que devidamente adaptado à realidade portuguesa.

Reside precisamente aí um dos factores do sucesso desta obra: enquanto que Alice vivia na realidade dos anos 70, e personagens como os irmãos Dores (da duologia 'Mania da Saúde') eram 'emigrantes' localizados (no caso, do Reino Unido), Joana e a sua família e amigos são portugueses de raiz e de 'gema', e vivem uma existência bem típica de uma família de classe média-alta nacional de meados dos anos 90 – a mesma que, certamente, muitos dos leitores conheceriam do seu próprio dia-a-dia, embora neste casos sem a presença de drogas. Por sua vez, esse facto torna mais fácil a identificação e empatia com a protagonista, factor essencial para o sucesso do livro.

Com isso em mente, não é de admirar que 'A Lua de Joana' tenha sido, e continue a ser, um sucesso de vendas (a edição mais recente é já a vigésima-sexta!) tendo, inclusivamente, sido alvo de uma adaptação para teatro, quase uma década e meia após o seu lançamento, que foi vista por mais de vinte e cinco mil pessoas durante os seis meses em que percorreu o País, e que, espera-se, continue a ser instrumento importante na sensibilização da nova geração para os perigos das drogas pesadas; afinal, por muito que a sociedade tenha mudado nos quase trinta anos desde a morte de Joana, esse continua, infelizmente, a ser um flagelo bem relevante, e de cariz universal...

02.11.22

Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog.

Quando se fala de literatura infanto-juvenil feita em Portugal – como, aliás, já aqui fizemos – um nome afirma-se como incontornável, tendo já entretido múltiplas gerações de crianças desde a sua criação: o da colecção Uma Aventura.

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O logotipo da série é tão icónico quanto os seus restantes elementos.

Para a geração nascida entre as décadas de 70 e 90, em particular, as aventuras dos cinco jovens criados por Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada representaram aquilo que as séries juvenis de Enid Blyton (que, aliás superaram em vendas) tinham sido para os seus pais, e que a saga de Harry Potter viria a ser para a geração seguinte: um dos primeiros, senão mesmo O primeiro, exemplo de literatura 'a sério' a chegar-lhes às mãos, e companhia continuada no processo de crescimento e adolescência. Mesmo quem não gostava de ler, fazia uma excepção para as 'Aventuras', cujos enredos entusiasmantes e vocabulário relativamente simples (embora não tanto quanto o de certas outras séries) serviam como 'chamariz' para estes leitores mais renitentes. E porque a icónica colecção completa, este ano, uns espantosos quarenta anos de publicação ininterrupta – e sem dar sinais de abrandar! - nada melhor do que dedicarmos algumas linhas a uma retrospectiva da mesma, como, aliás, já fizemos para a sua série-irmã, 'Viagens no Tempo.'

De facto, corria o já longínquo e quase 'perdido' ano de 1982 quando o primeiro volume da série idealizada por Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada – duas professoras do segundo ciclo frustradas com a falta de alternativas de leitura para os seus alunos – 'aterrava' nas bancas portuguesas, após aturadas rondas de 'testes' conduzidas entre os próprios alunos das autoras. Tratava-se de 'Uma Aventura na Cidade', tomo que apresentava aos jovens leitores o icónico grupo e alunos do segundo e terceiro ciclo, e respectivas mascotes; as gémeas Teresa e Luísa e o seu caniche 'Caracol', os 'melhores inimigos' Pedro e Chico – o primeiro o típico 'marrão', o segundo um 'bully' em potência – e o 'minorca' João, dono do pastor-alemão 'Faial', todos devidamente representados e identificados na contracapa, nos icónicos traços de Arlindo Fagundes, ainda hoje responsável pelas capas e ilustrações interiores dos livros da série.

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O já histórico primeiro volume da série, lançado há quase exactos quarenta anos (em cima) e os icónicos 'retratos' dos protagonistas presentes em todas as contra-capas (em baixo)

A proposta, essa, era simples – uma 'versão portuguesa' das aventuras dos Cinco e dos Sete, com enredos talvez menos rebuscados, mas a mesma premissa de um grupo de jovens com diferentes características que se envolvia na resolução dos mais variados crimes e mistérios, fazendo uso dos seus talentos para capturar os vilões antes que os adultos à sua volta sequer se apercebessem do que se passava. Uma premissa intemporal, e que funcionou tão bem para a dupla portuguesa como já o havia feito para Blyton – senão mesmo melhor, dado nenhuma das icónicas séries da escritora britânica ter alguma vez chegado aos 65 volumes ou quatro décadas de publicação!

De facto, a essa primeira aventura, seguiram-se outras sessenta e quatro, que viram o quinteto viajar de Norte a Sul de Portugal e até para o estrangeiro, vivendo experiências que iam de 'Alarmantes' (num volume legitimamente traumatizante) a 'Petigosas', 'Fantásticas', 'Secretas', 'Musicais' e até 'Voadoras' – grande parte das quais foi, além dos livros, também imortalizada em formato televisivo, já no novo milénio, através de uma também super-popular série transmitida pela SIC, (também responsável pela adaptação em filme de longa-metragem de 'Uma Aventura na Casa Assombrada', de 2009) e que ajudou a apresentar os personagens a todo um novo segmento de potenciais fãs.

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Os elencos do filme de 2009 (em cima) e de uma das séries televisivas (em baixo), ambas produções da SIC

Mais espantoso do que a longevidade em si ou do que os sucessos passados, no entanto – ou talvez não – é o facto de, durante esse período que engloba, pelo menos, duas gerações, as 'Aventuras' não terem jamais perdido o seu atractivo nem descido de popularidade entre o público alvo – pelo contrário, a 'geração iPad' continua a gostar tanto destes livros como os seus irmãos mais velhos e pais o haviam feito, justificando a continuada criação de novos imbróglios a serem resolvidos pelos cinco jovens e seus dois cães, agora um pouco mais velhos do que há quarenta anos, mas ainda assim parados naquela 'eterna adolescência' que sempre caracterizou os heróis de séries infanto-juvenis. Numa altura em que tantas das referências das duas gerações anteriores se começam a perder entre jogos casuais, vídeos hiperactivos de YouTube e experiências de realidade virtual, é nada menos do que reconfortante depararmo-nos com uma propriedade intelectual (ainda para mais literária) que não só se mantém 'viva e de saúde', como também continua a ser conhecida, sobretudo, na sua forma original, por oposição a uma qualquer adaptação audio-visual, como é o caso com 'Harry Potter', por exemplo. Parabéns, 'Uma Aventura' – e que contes muitos mais anos como a série favorita da juventude portuguesa!

12.10.22

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Numa semana que temos vindo a dedicar exclusivamente ao mais popular herói de BD franco-belga em Portugal, Astérix, seria quase insultuoso deixarmos de analisar as adições feitas durante a 'nossa' década ao meio que o tornou conhecido; como tal, e porque a popularidade do pequeno gaulês durante a referida década não foi apenas retroactiva, dedicaremos as próximas linhas a uma breve visão geral dos dois álbuns alusivos ao mesmo lançados durante a última década do século XX.

Da autoria exclusiva de Albert Uderzo (que havia acumulado funções desde a morte do seu parceiro de criação, René Goscinny, uma década antes) qualquer destes álbuns constitui uma adição honrosa à colecção de aventuras do guerreiro gaulês e do seu rechonchudo melhor amigo, Obélix – ainda que o segundo dos dois volumes assinale, também, os primeiros vestígios do ligeiro decréscimo de qualidade que se faria sentir nos últimos dois álbuns assinados pelo ilustrador.

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Antes, porém, havia ainda tempo para um último clássico, sob a forma de 'A Rosa e o Gládio', de 1991, que vê Astérix a braços com uma admiradora furiosamente feminista, e a ter que rever os seus conceitos sobre o lugar da mulher na sociedade, enquanto procura adaptar a sua linguagem e personalidade para não ofender ninguém. Uma premissa, ao mesmo tempo, divertida e relevante, que antecipa o movimento 'woke' com cerca de três décadas de antecedência, e cuja mensagem é transmitida de forma suficientemente caricatural para nunca parecer forçada ou piegas, tornando o álbum digno de figurar ao lado de outros clássicos da era pós-Goscinny, como o também excelente 'O Filho de Astérix', de 1983.

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O mesmo não se pode, infelizmente, dizer de 'O Pesadelo de Obélix', lançado cinco anos depois e que, longe de ser mau, é no entanto menos memorável do que os seus antecessores directos. A trama não deixa de ser interessante, permitindo descobrir quão nefastos podem ser os efeitos da poção mágica de Panoramix sobre o perpetuamente 'super-poderoso 'Obélix, mas não chega, infelizmente, para elevar o álbum além daquele contingente de títulos de Astérix que tendem a ficar esquecidos por entre os clássicos absolutos, a exemplo de 'Astérix e o Caldeirão', 'Astérix e os Godos' ou 'O Grande Fosso'. Ainda assim, uma aventura bem divertida (embora se sinta a falta do sarcástico e inocente Obélix) e que vale a pena ter na colecção, quanto mais não seja em nome do completismo.

Infelizmente, e como já acima indicámos, estes dois álbuns representam o fim da 'época áurea' de Astérix; os dois primeiros livros do novo milénio (e últimos dois da 'era Uderzo', antes de a série ser 'cedida' a dois perfeitos desconhecidos), embora ainda de qualidade acima de qualquer suspeita, já revelam alguma falta de inspiração e ideias, ficando bem abaixo do que o universo cinematográfico do herói gaulês vinha produzindo ('Astérix e Obélix: Missão Cleópatra' é tão bom ou melhor do que qualquer álbum da fase clássica, e altamente recomendado a qualquer fã dos personagens de Goscinny e Uderzo). Quem deixou de ler a série nos anos 90, no entanto (fosse por decréscimo de interesse ou simplesmente pela entrada na idade adulta) teve a sorte de ainda se conseguir 'despedir' da série com a mesma em alta, através de dois bons livros que, ainda hoje, vale bem a pena tentar adicionar à colecção.

05.10.22

Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog.

Um dos principais aspectos do regresso às aulas, em qualquer época da História, é a compra do material necessário para o novo ano lectivo, quer o mesmo consista de uma mochila ou dos livros requisitados pela escola; e, nos anos 90, existia uma pequena mas indispensável publicação que assumia tanta ou mais importância do que qualquer destes na lista de qualquer aluno da instrução primária.

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A clássica publicação original, utilizada pelos alunos de finais do século XX

Falamos da Tabuada Escolar Ratinho, o seminal tomo da autoria de Alfredo Cabral e editado pela Papelaria Fernandes (que, aliás, foi durante muito tempo o único local onde o mesmo podia ser adquirido). Tal como o nome indica, esta publicação tem um único objectivo: ensinar a tabuada às crianças, oferecendo-lhes um suporte visual para os ensinamentos adquiridos na sala de aula, e servindo como 'auxiliar de memória' no momento da aplicação desse mesmo conhecimento. Não é, portanto, de estranhar que a mascote homónima na capa (uma espécie de irmão mais novo e mais 'atinado' do rato da Sacoor) fosse mesmo a única concessão feita pela edição original do tomo no que toca a 'floreados' gráficos, sendo o interior constituído, sobretudo, por texto preto sobre fundo branco; para Alfredo Cabral, e para a Papelaria Fernandes, o importante era o conteúdo do livro, e não a forma como o mesmo era apresentado. Esta é, aliás, a principal diferença entre a Tabuada Ratinho 'clássica', com que os leitores deste blog terão crescido, e a versão actual, que dá bastante mais importância ao aspecto gráfico, a começar pela capa.

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As publicações actuais da gama 'Ratinho' englobam uma grande variedade de disciplinas para lá da Matermática.

A versão actual não se encontra, aliás, sozinha nas prateleiras das papelarias e lojas de material portuguesas; pelo contrário, o sucesso da Tabuada original – uma daquelas publicações que marcam toda uma geração – incentivou a Papelaria Fernandes a expandir a 'gama' Ratinho, a qual, hoje em dia, inclui também auxiliares de gramática, vocabulário, língua inglesa e até música, além de uma versão actualizada do manual de tabuada; para a geração que originalmente conviveu com a publicação, no entanto, a única e genuína versão será sempre aquela mais 'gorda', de capa totalmente branca, nas páginas da qual aprenderam a tabuada, ali por volta do terceiro ou quarto ano de escolaridade...

29.08.22

NOTA: Este post é respeitante a Sábado, 27 de Agosto de 2022.

NOTA: Dado o carácter temporalmente relevante deste post, o Sábado aos Saltos programado foi adiado uma semana. Assim, os próximos dois Sábados serão ambos de Saltos.

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais.

Apesar da enorme diversidade de títulos de qualidade para crianças e jovens, a leitura nunca foi, e continua a não ser, um passatempo consensual entre esta demografia: no entanto, para quem gosta de ler, há um evento anual que vem, desde há décadas, constituindo um dos pontos altos do calendário de cada ano: a Feira do Livro, o tradicional certame que, durante duas semanas de cada ano, reúne num só local todas as principais editoras nacionais, cada uma numa das tradicionais e icónicas 'barraquinhas', e todas oferecendo promoções e preços exclusivos para visitantes do referido evento.

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A Feira do Livro do Porto

Com lugar, habitualmente, de finais de Maio a meados de Junho (apesar de este ano terem sido adiadas um par de meses, tendo finalmente aberto na semana que ora finda, especificamente a 25 de Agosto) as Feiras do Livro de Lisboa e Porto podem já não ter o atractivo que outrora tiveram – na de Lisboa, por exemplo, sente-se a falta das tradicionais barracas coloridas, tendo a opção por um esquema de cores uniformizado em preto e castanho retirado ao certame muito do seu 'charme' visual – mas continuam a ser ponto de passagem obrigatório, a cada Verão, para os fãs de leitura (e intelectuais em geral) das duas principais cidades do País, oferecendo uma excelente oportunidade de colmatar lacunas na biblioteca pessoal, descobrir novos títulos em negócios de ocasião ou contactar em primeira mão com autores e editores. Assim, não é de todo de admirar que ambos os eventos continuem a ter níveis de adesão bastante consideráveis por parte das respectivas populações locais – até porque a localização de cada Feira (em bonitos parques do centro de ambas as cidades) propicia, e até convida, a um passeio, mesmo que não se tenha grande interesse em livros...

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O Parque Eduardo VII, a icónica localização da Feira do Livro de Lisboa

Conforme referido, no entanto, as Feiras do Livro perderam algum do charme e individualismo de que gozavam em finais do século XX e inícios do Terceiro Milénio, seguindo hoje um formato bastante mais padronizado e, como tal, menos interessante; ainda assim, a relevância e interesse deste certame no calendário cultural português continua a justificar plenamente a sua realização, que – espera-se – continuará em anos vindouros; afinal, qualquer incentivo à leitura, principalmente entre os jovens, apenas poderá ser considerado positivo...

 

27.07.22

Em quartas-feiras alternadas, falamos sobre tudo aquilo que não cabe em nenhum outro dia ou categoria do blog..

...como é o caso das listas telefónicas.

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Alguns dos muitos volumes que todo o português viu serem deixados à sua porta, anualmente, durante as últimas décadas do século XX.

Uma das mais subtis e, no entanto, mais importantes mudanças trazidas à sociedade pela era digital foi a possibilidade de comunicar com qualquer pessoa de (praticamente) qualquer parte do Mundo civilizado. O advento, primeiro, dos telemóveis e, mais tarde, dos computadores portáteis com acesso à Internet fez com que deixasse de ser necessário esperar até chegar a casa ou procurar uma cabine telefónica (e potencialmente comprar um Credifone) para efectuar chamadas ou enviar mensagens de forma remota, e fez com que os próprios telefones caseiros se transformassem, progressivamente, numa raridade, cada vez mais frequentemente descartada pelas gerações que já cresceram na era da sociedade em rede.

Esta passagem para o digital, e subsequente obsolescência de meios como o telefone, teve, no entanto, um efeito colateral a lamentar, pelo menos de um ponto de vista nostálgico – a progressiva redundância e (eventualmente) inevitável desaparecimento das listas telefónicas. E enquanto que as gerações mais novas já dificilmente saberão o que tal denominação apresenta, quem cresceu no milénio transacto certamente terá, ainda, bem presente a imagem de encontrar, uma vez por ano, dois ou três 'calhamaços' à entrada de casa, ali deixados pelo distribuidor de serviço, e prontamente levados para dentro e colocados junto ao telefone; viva será também, na mente desses ex-jovens, a memória de querer telefonar a um amigo (ou 'àquela' miúda especial) e percorrer com o dedo as aparentemente infinitas colunas da lista, tentando adivinhar qual das múltiplas iniciais com apelidos semelhantes corresponderia à dos pais da referida pessoa – uma tarefa em muito facilitada quando o destinatário tinha um daqueles apelidos invulgares ao ponto de serem únicos...

Muito mais interesse do que a lista telefónica 'normal', no entanto, tinha o outro tomo normalmente distribuído em conjunto com esta, que continha os números de empresas e serviços e era baptizada segundo a sua característica mais marcante; isto porque, ao contrário das listas residenciais, as Páginas Amarelas permitiam a inserção de anúncios, alguns dos quais com ilustrações e outros detalhes que faziam com que a referida publicação parecesse quase um catálogo, ainda que sem quaisquer produtos que se pudessem adquirir directamente...

Conforme já referimos no início deste texto, as listas telefónicas (de ambos os tipos) foram, ao longo dos anos, perdendo preponderância praticamente ao mesmo ritmo que perdiam páginas - do formato A3 bem grosso com que a geração de 90 cresceu, ambas as publicações passaram, no novo milénio, a um formato mais pequeno e bastante mais delgado, até cederem definitivamente o papel de referência para consulta de números de telefone aos motores de pesquisa. Mesmo assim, as Páginas Amarelas souberam adaptar-se à era digital, reinventando-se sob a forma de uma directoria de serviços 'online' – o bem conhecido Yell (ou Yelp, dependendo da parte do Mundo em que se esteja). Para muitos ex-jovens de finais do século XX no entanto, a mera menção de qualquer dos dois volumes abordados nestas linhas evocará, de imediato, memórias de uma pilha de 'calhamaços' amontoados por baixo ou ao lado do telefone, prontos a revelar o número de telefone daquele familiar ou conhecido com quem apenas esporadicamente se falava...

07.07.22

NOTA: Este post é respeitante a Quarta-feira, 06 de Julho de 2022.

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Embora seja um dos tópicos mais importantes do currículo escolar básico, a História de Portugal não é, de modo algum, consensual entre os alunos desse nível de ensino, dado o seu pronunciado ênfase na memorização de datas, locais e nomes, que rapidamente se torna algo 'maçuda'; assim, não é de todo de admirar que, ao longo das últimas décadas, tenham sido levadas a cabo uma série de tentativas de tornar o estudo dos acontecimentos que levaram ao momento presente mais atractivo e agradável para a demografia-alvo.

Destas, uma das mais marcantes e bem-sucedidas surgiu pela mão (e pena) de A. do Carmo Reis (também responsável pela colecção História Júnior, de índole bastante semelhante), em finais dos anos 80 – embora a sua presença nas livrarias e estantes infantis durante a década seguinte tenha sido suficientemente vasta para justificar a sua inclusão nestas páginas. Tratava-se de uma série de adaptações em banda desenhada de momentos-chave da História lusitana, publicadas pelas Edições Asa sob o auto-explicativo nome de 'História de Portugal em BD'.

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Um número da colecção com o grafismo original de finais da década de 80, entretanto alterado

Com início em 1987, esta série continua hoje – exactas três décadas e meia depois – a marcar presença nos escaparates, e por bom motivo: além do método mais 'leve' e ligeiro como a informação é transmitida, a série pauta-se pelo excelente grafismo, algures entre a vertente mais séria e adulta da BD franco-belga e o estilo que ia, à época, imperando 'dentro de portas'. O resultado, ainda que potencialmente 'adulto' demais para o público-alvo (e atractivo, sobretudo, para quem já tinha interesse prévio no tema) é de evidente e indisfarçável qualidade, factor que terá contribuído para tornar esta colecção popular em bibliotecas quer tradicionais, quer inseridas num contexto escolar – onde se presume que continue a marcar presença até aos dias de hoje, ainda que em edições póstumas e ligeiramente diferentes a nível de apresentação gráfica.

Em suma, ainda que incapaz de ultrapassar os preconceitos da maioria dos alunos em relação ao estudo da História, esta colecção representou uma tentativa corajosa de mudar esse paradigma, missão na qual foi, infelizmente, apenas parcialmente bem sucedida – mas, ainda assim mais do que suficiente para lhe dedicarmos alguns parágrafos nesta Quarta de Quadradinhos...

23.06.22

Os anos 90 viram surgir nas bancas muitas e boas revistas, não só dirigidas ao público jovem como também generalistas, mas de interesse para o mesmo. Nesta rubrica, recordamos alguns dos títulos mais marcantes dentro desse espectro.

Já aqui por várias vezes falámos do monopólio da Planeta DeAgostini no respeitante a enciclopédias ou séries educativas em fascículos. De cursos de inglês a colecções sobre dinossauros, cães, acontecimentos históricos ou qualquer outro tema, era praticamente certo que qualquer edição deste tipo surgida nas bancas portuguesas durante um determinado período de tempo teria a chancela da editora do globo.

No entanto, como também aqui discutimos no nosso último post, o referido domínio absoluto sobre o mercado dos fascículos não se afirmou suficiente para a editora, que, ainda nos anos 90, procurou diversificar a sua oferta para os campos da banda desenhada e das colecções de livros; e se na primeira destas categorias a Planeta se ficou por uma única série de seis álbuns produzidos para uma promoção da Repsol, a segunda trouxe à editora mais dois enormes sucessos a juntar ao seu impressionante portfólio, sob a forma das versões em livro das populares séries animadas 'Era Uma Vez...', do francês Albert Barillac.

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Mais do que apenas transpôr os episódios para um formato literário, no entanto, a Agostini utilizou os mesmos – disponibilizados em VHS, e mais tarde DVD, com cada um dos livros – como base para criar uma verdadeira obra didáctica, com o envolvimento de cientistas e pedagogos; o resultado foram duas memoráveis colecções, que muitos dos ex-jovens daquela época ainda recordam.

Sim, apenas duas – o capítulo 'do meio' da trilogia, 'Era Uma Vez...O Espaço', foi deixado de lado nesta iniciativa, por razões que não são inteiramente claras; assim, apenas 'Era Uma Vez...O Homem' e 'Era Uma Vez...A Vida' (re-intitulada 'Era Uma Vez...O Corpo Humano') tiveram direito ao tratamento 'intelectual', com cada uma a fomentar cerca de trinta volumes de conteúdo, sempre apoiado nas imagens e argumentos criados duas décadas antes por Barillac.

É claro que, tratando-se da Planeta DeAgostini, não podiam faltar as habituais ofertas que incentivavam à compra da colecção inteira – e, nesse capítulo, o esqueleto humano oferecido semanalmente, membro a membro, com os livros d''O Corpo Humano' perdeu apenas para o esqueleto de dinossauro da respectiva colecção como um dos melhores de entre estes 'incentivos'. A verdade, no entanto, é que as referidas colecções não necessitavam, de todo, deste tipo de táctica de vendas, já que ambas constituíam excelentes misturas entre pedagogia, factos científicos, e uma abordagem divertida e apelativa para o público-alvo – para além de, quando completas, formarem uma bonita imagem que 'fazia vista' em qualquer estante de livros de um quarto de criança ou adolescente.

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A junção das lombadas de todos os volumes das colecções criava um bonito efeito na estante

Assim, não foi de admirar que qualquer das duas edições tenha gozado de considerável sucesso junto da referida demografia, e sejam ainda hoje recordadas com enorme carinho e nostalgia por quem as coleccionou; razão mais que suficiente para lhes dedicarmos estas breves linhas.

O anúncio televisivo original para a colecção 'O Corpo Humano', datado de 1994

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