11.06.23
NOTA: Por motivos de relevância temporal, este Domingo vai ser Desportivo, e não Divertido.
Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.
O estigma da transferência entre clubes arqui-rivais – ainda bem presente no meio futebolístico de hoje em dia – não impediu (nem impede) que, ao longo dos anos, tenha havido um sem-número de jogadores a tornarem-se voluntariamente 'vira-casacas', juntando-se a um dos 'Grandes' após terem servido qualquer dos outros dois. Os nomes são bem conhecidos, e continuam a causar alguma 'comichão' aos adeptos dos clubes 'traídos': Luís Figo (em Espanha), Simão Sabrosa, João Moutinho, João Pereira, Mário Jardel, João Vieira Pinto, Ricardo Quaresma, Silvestre Varela, Yannick Djaló, Lazar Markovic e, mais recentemente, João Mário Eduardo são apenas algumas das 'caras' mais marcantes deste fenómeno. E ainda que este percurso seja, normalmente, feito por via indirecta, geralmente após uma experiência internacional falhada, por vezes, este tipo de troca é mesmo levada a cabo 'à descarada', como no caso do jogador cuja carreira celebramos neste post, por ocasião do seu quinquagésimo-quarto aniversário: o soviético Sergey Yuran, figura maior e mítica do Benfica de inícios da década de 90 mas que, na temporada de 1994/95, foi protagonista de uma controversa transferência para o então hegemónico Futebol Clube do Porto.
O jogador com as duas camisolas que envergou em Portugal.
Nascido na cidade ucraniana de Lugansk – então parte do bloco soviético – Yuran começou a sua carreira em clubes locais: primeiro o Zorya, pelo qual se estreia com apenas dezasseis anos e onde passa duas épocas e meia (sendo a de 1987/88 a da consagração como elemento-chave da equipa) e depois no Dínamo de Minsk, para o qual se transfere ainda a meio da época supramencionada, e onde consegue marcas impressionantes ao nível dos golos marcados em relação à média de jogos, que desde logo dava indícios das características 'matadoras' do soviético. As boas prestações, fulcrais para a conquista do último Campeonato Soviético por parte do Minsk, foram, aliás, premiadas com a distinção como jogador ucraniano do ano em 1990.
Talvez tenha, aliás, sido esse 'faro' para golo acima da média que motivou o Sport Lisboa e Benfica a ir buscar o jogador à sua terra-natal e trazê-lo para Lisboa, logo no início da época de 1991/92. Pelos encarnados, Yuran faria três épocas que, apesar de menos impressionantes ao nível dos tentos obtidos, o veriam afirmar-se como parte importante da equipa, tendo o avançado alinhado em todos ou quase todos os jogos do clube ao longo do período em causa, sido o melhor marcador da então chamada Taça dos Campeões Europeus na primeira época completa ao serviço do clube, sido presença assídua nas selecções da União Soviética e da efémera Comunidade dos Estados Independentes, e conquistado o carinho dos adeptos com as suas contribuições – além de um Campeonato Nacional, referente à época que se desenrolava há exactos trinta anos.
Ao serviço da Selecção soviética.
O papel fundamental do avançado na forma de jogar do Benfica, o respeito que obtivera por parte dos adeptos e, especialmente, a conquista do referido campeonato fizeram com que a mudança de Yuran para o FC Porto, logo no início da época seguinte, fosse um 'soco no estômago' ainda maior para os adeptos benfiquistas, já que nada faria esperar que o soviético se decidisse desvincular de um clube onde aparentava ser feliz. Ainda assim, a perda dos adeptos do Benfica foi o ganho dos do Porto, já que a única época de Yuran ao serviço dos nortenhos o veria afirmar-se, também, como peça importante da equipa, pesem embora os apenas cinco golos obtidos.
Essas mesmas boas prestações suscitariam, aliás, o interesse do Spartak de Moscovo, que conseguiria mesmo aliciar o avançado a regressar ao Leste europeu, ainda que apenas por uma época, já que o ano de 1996 o veria rumar a Inglaterra para jogar no Millwall, naquele que seria o primeiro 'passo atrás' da sua carreira. Uma decisão, aliás, de que Yuran demoraria a recuperar, já que os anos seguintes o viram 'deambular' por clubes (então) menores do campeonato alemão – Fortuna Dusseldorf e VfL Bochum – antes de regressar ao Spartak, para uma segunda época algo mais bem sucedida que a primeira. Ainda assim, e apesar destes anos menos bem conseguidos, o avançado continuou a ser opção frequente na Selecção Nacional russa, que representaria até 1999.
O dealbar do Novo Milénio parecia trazer consigo nova esperança para Yuran, que recuperava a estabilidade longe dos holofotes mediáticos, no campeonato austríaco, ao serviço do Sturm Graz. No decurso da segunda época ao serviço do clube, no entanto, o soviético sofreria uma lesão grave na cabeça, que acabaria por ditar o afastamento prematuro dos relvados, aos trinta e dois anos.
Yuran no papel de treinador.
Daí, o próximo passo era comum e previsível: Yuran tornou-se treinador, iniciando a sua carreira em 2003, ao serviço da equipa de reservas do Spartak, e sendo mais tarde promovido a adjunto dentro do mesmo clube. A primeira experiência como treinador principal, essa, deu-se ao serviço do modesto Dinamo Stavropol, tendo a restante carreira sido feita exclusivamente em clubes de Leste, com destaque para o campeonato russo. Hoje, o outrora prolífico avançado é treinador do Pari NN, clube recém-fundado mas que actua já na Primeira Liga russa – uma posição estranhamente modesta, para quem, em tempos, se contou entre os melhores jogadores não de um, mas de dois dos principais clubes de um campeonato como o português. Ainda assim, aqui ficam os votos de parabéns, e de continuação de uma carreira honrosa como técnico.