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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

27.09.24

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

De entre os muitos géneros cinematográficos a viver um bom momento nos anos 80 e 90, o cinema de acção talvez seja, a par da animação, aquele que mais e melhores trabalhos viu serem lançados durante o referido período; aquela foi, afinal, a época áurea dos heróis musculados, a realizarem feitos impossíveis sem mais do que um par de arranhões e um penteado ligeiramente desfeito, que constituíam o equivalente da altura aos super-heróis de hoje. A par destes 'nacos de carne' e dos seus respectivos épicos de violência, no entanto, a era em causa via também surgir, no seio do cinema de acção, outro tipo de herói, menos bem preparado para a sua função e, muitas vezes, com uma aura de 'cidadão comum' que apenas tornava as suas façanhas ainda mais impressionantes, do simples polícia Axel Foley de 'O Caça-Polícias' ao John McClain da série 'Assalto'. A essa lista há, ainda, que juntar um personagem com o qual a maioria dos portugueses tomava contacto há quase exactos trinta anos, e cujo filme adquiriria a merecida reputação de clássico 'menor' da acção noventista.

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Falamos de Jack Traven, o especialista em desarme de bombas vivido por Keanu Reeves em 'Speed – Perigo a Alta Velocidade', o grande êxito do 'regresso às aulas' de 1994. Estreado nas salas de cinema lusitanas a 9 de Setembro desse ano, o filme do estreante Jan de Bont (que se viria a tornar um especialista reconhecido do género, responsável por filmes como 'Twister – Tornado', e 'Lara Croft – Tomb Raider', além da sequela do próprio 'Speed') rapidamente se tornava assunto dos primeiros recreios do novo ano lectivo, pela premissa original, ritmo frenético, sonoplastia impressionante (que lhe valeria um Óscar na cerimónia desse ano) e, claro, muitos tiros, explosões e 'malabarismos' diversos, além da presença de dois actores principais então em alta, Reeves (no seu período de transição entre galã adolescente com veia cómica e herói de acção consagrado) e Sandra Bullock, vinda de 'Homem Demolidor' no ano anterior, e prestes a iniciar a fase hegemónica de uma carreira lendária. Juntamente com Dennis Hopper (no papel do vilão, como já sucedera em 'Super Mário') e Jeff Daniels, os dois garantiam um nível de representação mais do que razoável, sobretudo para um filme de acção.

Era no argumento, no entanto, que 'Speed' brilhava. A ideia de um autocarro armadilhado que deve ser mantido a uma determinada velocidade era tão simples quanto criativa, conseguindo manter o espectador de respiração presa ao longo de toda a duração do filme - sobretudo por constituir uma premissa significativamente mais realista do que a da normal película de acção da época – e, embora o resultado final nunca estivesse em dúvida, proporcionar uma experiência cinematográfica entusiasmante e satisfatória. Foi, pois, sem surpresas que o filme rapidamente se tornou um dos dez mais lucrativos de 1994, surgindo em oitavo lugar de uma lista encabeçada pelos titãs 'Forrest Gump' e 'O Rei Leão'; mais surpreendente é, talvez, o facto de 'Speed' continuar a desfrutar de uma boa reputação tanto entre os fãs de filmes de acção como junto da crítica, algo de que poucos filmes da mesma época se podem gabar.

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Este alinhamento de circunstâncias era, claro está, propício à realização de uma sequela, e era com naturalidade que, três anos após o original, os cinéfilos viam chegar às salas 'Speed 2: Perigo a Bordo' (no original, 'Cruise Control'), pronto a ser um dos grandes êxitos veranis de 1997. A verdade, no entanto, é que a premissa da série não resulta da mesma forma quando transposta para um barco (um meio de transporte conhecido pela sua POUCA velocidade) factor que, aliado à substituição pouco feliz de Reeves por Jason Patric, fazia da sequela uma experiência significativamente inferior à do filme original. Nem as presenças de Jan de Bont novamente ao 'leme' (passe o trocadilho), de Bullock novamente como co-heroína, e do sempre competente Willem Dafoe foram suficientes para evitar que 'Speed 2' recebesse duras críticas, tanto da imprensa como dos próprios espectadores, e viesse a merecer um lugar na lista de piores sequelas de sempre, bem como em algumas listas dos piores filmes de acção de sempre.

Felizmente, tanto o realizador como os actores da referida 'bomba' (passe, novamente, o trocadilho) viriam a 'sobreviver' ao desastre, o qual tão-pouco beliscaria a reputação do original como representante de uma nova 'vertente' de filmes de acção, menos 'bombástica' e violenta e mais centrada no 'suspense', a qual viria a grassar durante as duas épocas seguintes, até ser sumariamente 'aniquilada' pelo 'assalto' dos super-heróis, não ao arranha-céus ou ao aeroporto, mas aos grandes ecrãs do Mundo civilizado. Ainda assim, trinta anos volvidos sobre a sua estreia, um filme como 'Speed' serve, quanto mais não seja, como lembrete de que é possível fazer cinema de acção sem heróis musculosos em uniformes justos ou efeitos CGI topo de gama, desde que se exerça alguma criatividade e imaginação...

07.09.24

NOTA: Este 'post' é respeitante a Sexta-feira, 06 de Setembro de 2024.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

Numa era em que os 'remakes' e 'reboots' se contam entre os géneros de filme mais produtivos em Hollywood e não só, e em que todas as maiores propriedades nostálgicas já viram ser-lhes aplicado tal tratamento, não é de admirar que toque a vez a franquias e personagens menos lembrados, ou com estatuto de culto. O mais recente exemplo desta mesma tendência estreou em Portugal há cerca de duas semanas, pouco mais de trinta anos após o original que o inspirou, e ao qual presta homenagem; e visto que tal data recaiu durante o período de férias do Anos 90, nada melhor do que aproveitar esta primeira Sessão após o hiato para recordar, oportunamente, esse primeiro filme, enquanto o seu sucessor ainda se encontra em cartaz nas salas lusitanas.

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Chegado ao nosso País em pleno Verão de 1994 – estreou a 15 de Julho – a primeira adaptação oficial da banda desenhada 'The Crow' trazia um ambiente tudo menos estival, fielmente passado das páginas do material de base para o grande ecrã. Talvez por isso 'O Corvo' tenha rapidamente assumido contornos de culto entre as franjas mais alternativas da sociedade, com especial incidência nos movimentos gótico e 'heavy metal', para quem a estética sombria e narrativa de tendências poéticas eram sobremaneira apelativas.

Uma pena, pois, que a adaptação cinematográfica do 'comic' independente pouco mais tenha para oferecer do que esses mesmos aspectos estéticos. De facto, um desempenho carismático de Brandon Lee (filho de Bruce) no papel do protagonista homónimo não chega a ser suficiente para colmatar o argumento algo superficial, que reduz a relativa profundidade da narrativa da BD a uma simples história de vingança igual a tantas outras. Ainda assim, não faltam ao benjamim do clã Lee oportunidades para se afirmar como a estrela de acção perfeitamente viável que se teria, sob outras circunstâncias, certamente tornado, e o jovem enfrenta com desenvoltura as múltiplas cenas de pancadaria e tiroteios em que o seu personagem se vê envolvido.

E seria, precisamente, no decurso de um desses tiroteios que se daria a tragédia pela qual o filme é hoje, sobretudo, lembrado, quando Brandon foi fatalmente atingido por uma bala verdadeira, por oposição ao simulacro em borracha que deveria ter sido instalado no seu lugar. Uma morte envolta em inevitável controvérsia, e que ceifava o jovem actor aos apenas vinte e oito anos, pondo um ponto final macabro naquela que poderia ter sido uma carreira honrosa, nas passadas do pai, e cuja sombra assola inevitavelmente o filme, sobrepondo-se às criadas pelos artefactos cénicos do filme.

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Apesar da trágica perda do seu actor principal, no entanto, os estúdios de Hollywood não desistiram de adaptar as histórias d''O Corvo'; pelo contrário, o filme daria azo a nada menos do que três sequelas antes de ser refeito e iniciar nova continuidade. A primeira destas, 'O Corvo: Cidade dos Anjos', surgia quase exactamente três anos após o lançamento do original, novamente no Verão – estreou em Portugal a 1 de Agosto de 1997 – e trazia 'mais do mesmo', agora com Vincent Perez no papel do justiceiro. O grande relevo, no entanto, não vai para a estrela principal, e sim para a inusitada presença de Iggy Pop no papel de um dos vilões, a qual acentua ainda mais a ligação entre esta série de filmes e o movimento do rock pesado, do qual Iggy foi um dos pioneiros, como líder da banda The Stooges. Apesar do convidado 'de peso', no entanto, o filme falhou redondamente nas bilheteiras mundiais, tendo sido alvo de críticas manifestamente negativas por parte da imprensa especializada.

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Foi, portanto, com surpresa que os poucos fãs da franquia ainda restantes receberam, em 2001, uma segunda sequela alusiva ao espírito vingador. Chegado a Portugal a 8 de Junho de 2001, 'O Corvo 3: Pena Capital' traz Eric Mabius no papel de Alex Corvis, regressado dos mortos para ilibar o próprio nome num caso de homicídio, ao lado de Kirsten Dunst, então a poucos meses de filmar 'Tudo Por Elas'. Fruto da péssima recepção do filme anterior, esta terceira parte apenas teve direito a exibição limitada nos cinemas, tendo essencialmente sido lançado em formato 'direct-to-video', com orçamento e valores de produção a condizer, e sofrido o mesmo fado da maioria das produções do género, ou seja, o quase total esquecimento.

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Não ficava ainda por aqui, no entanto, a saga d''O Corvo', sendo que sairia ainda uma quarta parte, em 2005, novamente em formato 'direct-to-video', e que, apesar disso, conta com um elenco de luxo. Senão veja-se: em contraste com os anónimos actores do filme anterior (com excepção de Dunst) 'O Corvo: A Reencarnação' conta com a participação de Edward Furlong (de 'Exterminador Implacável 2' e 'América Proibida'), Tara Reid (de 'American Pie: A Primeira Vez'), David Boreanaz (o Angel de 'Buffy, Caçadora de Vampiros'), Dennis Hopper, Danny Trejo, do lutador Tito Ortiz e até da cantora Macy Gray, então 'em alta' entre a demografia-alvo do filme. Talento até demais para uma quarta parte de uma franquia há muito moribunda, e que era, mais uma vez, alvo de enormes críticas por parte da imprensa especializada.

Felizmente, ao contrário de franquias como 'Halloween' ou 'Sexta-Feira, 13', os criadores dos filmes d''O Corvo' souberam onde parar, deixando 'morrer' definitivamente a série antes de a mesma se adentrar ainda mais na espiral descendente em que já se encontrava. O filme de 2024 é, pois, uma oportunidade para 'começar de novo', e voltar a despertar interesse na obra de James O'Barr, a qual – ao contrário do que as suas adaptações cinematográficas poderiam indicar – tem algum mérito artístico, e merece ser conhecida ou relembrada por fãs de banda desenhada de teor obscuro e gótico. Já os filmes podem ser votados ao esquecimento onde já se encontram, sendo o original o único dos quatro digno de uma Sessão de Sexta nostálgica e de cérebro totalmente 'desligado'...

19.04.24

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

A mistura cinematográfica de acção e aventura com toques de humor e romance foi, desde o início da História da Sétima Arte, uma das mais populares combinações entre o grande público, um paradigma que se mantém até aos dias de hoje – ou não fosse esta a fórmula-padrão para qualquer 'blockbuster' de super-heróis ou ficção científica lançado nos últimos quinze anos. Apesar deste apelo perene, no entanto, o género sofre, como qualquer outro, de 'altos e baixos' de popularidade, e o final dos anos 90 representava um dos períodos 'baixos'. O dealbar da era mais 'futurista', 'extrema' e 'radical' da História da humanidade não tinha lugar para aventuras 'à moda antiga', e a maioria dos filmes mais populares da época iam, propositadamente, na direcção contrária, apresentando estéticas sombrias e heróis sorumbáticos e sem grande apetência para interacções sociais, e menos ainda para ligações românticas - e os que não iam ou se traduziam em, na melhor das hipóteses, entradas menores nas respectivas franquias, ou, na pior, lendários 'flops' . Em meio a este paradigma, no entanto, um filme tentou 'resgatar' o clássico 'cocktail' que produzira, em décadas anteriores, mega-sucessos como a trilogia 'Indiana Jones', e acabou por dar início a, não uma, mas duas franquias distintas em décadas subsequentes.

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Falamos de 'A Múmia', um 'remake' do filme com o mesmo nome lançado pela icónica Hammer em 1932 protagonizado por Brendan Fraser e Rachel Weisz que chegava às salas de cinema portuguesas há quase exactos vinte e cinco anos, a 16 de Abril de 1999 – curiosamente, duas semanas antes da sua estreia em solo norte-americano – e cuja toada ao estilo comédia de acção imediatamente captava o interesse da 'geração Matrix', que crescera a ver a trilogia original de Lucas e Spielberg na televisão, e acolhia de bom grado uma actualização da fórmula 'incrementada' pelos novos recursos tecnológicos. E a verdade é que o primeiro capítulo da nova franquia excedia expectativas, conseguindo 'acertar' tanto no tom leve mas intenso que caracterizara as aventuras de Indy, como também na estética 'anos 30' e até na química do par romântico, que transcende o ecrã, e que apenas se viria a destacar ainda mais na sequela. De facto, só as interpretações de Fraser e Weisz fazem com que valha a pena 'gastar' duas horas de uma noite de final de semana com o filme, ou, melhor ainda, fazer uma Sessão de Sexta dupla com a sua igualmente divertida sequela; no entanto, há muito mais do que gostar nesta nova encarnação d''A Múmia', das paisagens desérticas de Marrocos aos efeitos especiais da lendária Industrial Light & Magic, de George Lucas, passando pela trilha sonora do não menos famoso Jerry Goldsmith.

Dado o envolvimento de todos estes nomes, e a boa recepção de que gozou por todo o mundo aquando da estreia, não é de admirar que este primeiro filme da franquia tenha rapidamente tido direito a uma sequela, com o óbvio título de 'A Múmia Regressa' lançada já no Novo Milénio, e que, apesar da duvidosa adição ao elenco de personagens de um 'puto esperto' – um dos piores personagens-tipo do cinema moderno – e do infame efeito especial durante a batalha climática com o Rei Escorpião (sim, esse mesmo), consegue manter e a até superar o nível do primeiro filme, afirmando-se como um dos melhores 'filmes de família' de inícios do século XXI, e valendo bem a visualização ao lado do seu antecessor.

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Talvez o legado mais importante da sequela, no entanto, tenha sido a personagem do referido Rei Escorpião, interpretada por um lutador da WWF à época acabado de se lançar na carreira cinematográfica, e de quem ninguém esperava mais do que o fraco nível atingido por antecessores como Hulk Hogan – um tal de Dwayne Johnson, conhecido como 'The Rock', e que, em 2002, daria vida à encarnação anterior do Rei Escorpião, um guerreiro residente num mundo de 'espadas e sandálias' puramente fantástico, a remeter às velhas aventuras de Conan, o Bárbaro.

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Este filme, por sua vez, faria tal sucesso entre o público-alvo que se transformaria, ele próprio, no ponto de partida de uma franquia, que renderia nada menos do que mais quatro filmes, embora todos já sem o contributo de 'The Rock', que seria substituído por uma sucessão de lutadores da UFC com talentos dramáticos consideravelmente mais limitados. Escusado será dizer que as restantes aventuras do Rei Escorpião são tão fracas como qualquer outra continuação de baixo orçamento destinada ao mercado do vídeo e DVD, merecendo bem o esquecimento a que são hoje em dia votadas; o mesmo, no entanto, não se pode dizer do original, um filme de aventura familiar 'tão mau que é bom', e que fará certamente as delícias de um público jovem e pouco exigente.

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'A Múmia', essa, voltaria apenas mais uma vez na presente encarnação - já depois de muitos imitadores terem, sem sucesso, tentado ocupar o seu trono nos anos subsequentes - numa aventura que via Jet Li juntar-se a Fraser e Maria Bello (que substituía Weisz), no papel do Imperador Dragão, o novo vilão que o casal deve combater. Apesar de perfeitamente aceitável, no entanto, o nível desta segunda continuação ficava bastante aquém do dos originais, sendo o filme bastante 'esquecido' (porque pouco memorável) e tendo, inadvertidamente, lançado a franquia para um limbo de vários anos, do qual só um 'desastre' encabeçado por Tom Cruise a retiraria – e para muito pior...

Apesar deste desaire, no entanto, os primórdios da franquia continuam a constituir excelentes comédias de acção de índole familiar - os chamados 'filmes de família' de molde clássico – tendo sido responsáveis pela ressurreição, qual múmia do Antigo Egipto, de um género que se julgava morto e enterrado, mas que estes filmes vieram provar ainda ter 'pernas para andar' no panorama cinematográfico da viragem de Milénio. Quanto mais não seja por isso, os filmes de Stephen Sommers merecem ser recordados (e elogiados) por alturas do vigésimo-quinto aniversário da estreia do original...

08.03.24

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

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Há quase exactos trinta anos, no fim-de-semana de 18, 19 e 20 de Fevereiro de 1994, dois filmes completamente distintos dividiam as atenções do público cinéfilo português; e se os mais velhos ou eruditos gravitavam naturalmente para 'Filadélfia', drama que versava sobre assuntos relevantes e importantes, bem veiculados por excelentes interpretações de Tom Hanks e Denzel Washington, para os mais novos ou 'descompromissados' a atracção principal era mesmo a terceira parte de uma das muitas franquias de acção e ficção científica 'herdadas' dos anos 80, que marcava o regresso aos écrãs nacionais de um dos ciborgues mais famosos da História do cinema – e, dada a boa recepção de que os dois primeiros filmes alusivos ao mesmo tinham sido alvo aquando da sua estreia, era natural que esta nova película fosse, também, aguardada com enorme entusiasmo.

De facto, o 'RoboCop' original, de 1987, ainda hoje goza do estatuto (merecido) de clássico da ficção científica oitentista, louvado por conseguir 'disfarçar' uma mensagem sobre a condição humana e a substituição de mão-de-obra por maquinaria de filme de 'acção científica', cheio de tiros e frases de efeito, como era apanágio da época, e 'fazer milagres' com um orçamento relativamente baixo. O sucesso imediato e considerável não podia, evidentemente, deixar de dar azo a uma sequela (lançada já nos primeiros meses da nova década, e estreada em Portugal em Novembro de 1990) de orçamento e pretensões filosóficas significativamente reduzidas (a ênfase era agora posta nos tiros e cenas de acção) mas que constituía, ainda assim, uma divertida proposta dentro do seu campo, perfeita para uma ida ao cinema ou 'sessão da tarde' de fim-de-semana descontraída e despretensiosa. 'RoboCop 3 – Fora da Lei' apenas precisava, portanto, de oferecer 'mais do mesmo', e o sucesso de bilheteira estaria quase garantido, tal era a força do nome da franquia no mercado cinematográfico.

E se é verdade que o terceiro filme consegue atingir esse objectivo, também não deixa de ser justo dizer que o mesmo fica alguns furos abaixo dos seus dois sucessores, como reflecte a opinião da crítica especializada, tanto da altura como dos dias de hoje. Comparativamente ao inflexível original e mesmo à algo mais simplista segunda parte, 'RoboCop 3' afirmava-se como um filme consideravelmente mais sanitizado e, simultaneamente, menos inteligente – uma combinação ainda piorada pela ausência de Peter Weller (icónico no papel do humano por baixo da armadura), substituído pelo desconhecido Robert Burke. Para agravar ainda mais a situação, o orçamento para filmagens foi ainda mais reduzido que o de 'RoboCop 2', tendo o projecto sido realizado meramente como tentativa de evitar a falência da produtora e distribuidora Orion Pictures – missão na qual falhou redondamente, tendo sido um falhanço de bilheteira não só nos EUA como um pouco por todo o Mundo, e contando hoje em dia com uma classificação média de apenas 9% (sim, NOVE POR CENTO!) no 'site' agregador de críticas especializadas Rotten Tomatoes.

Ainda assim, e de alguma forma, a franquia 'RoboCop' conseguiu sobreviver a esta verdadeira 'bomba' durante tempo suficiente para dar azo a não uma, mas duas séries televisivas (em 1994 e 2001), ambas as quais vêem o polícia-ciborgue lutar não só contra outros robôs futuristas, mas também contra as restrições de orçamento e argumento típicas de produções televisivas. Apesar de praticamente irrelevantes, ambas estas séries (mais tarde lançadas em alguns países como 'filmes', contidos num único DVD estilo '4 em 1') conseguiram ainda assim manter RoboCop suficientemente relevante no seio da cultura popular para que se justificasse um 'reinício' da franquia, com um inevitável 'remake' dirigido por Fernando Meirelles em 2014. O generalizado insucesso dessa tentativa de regresso (em contraste absoluto com o 'renascimento', no mesmo período, de outro polícia futurista, o Juiz Dredd) deverá, no entanto, ter ditado o fim de RoboCop como personagem cinematográfica relevante, relegando-o à condição de 'relíquia' de décadas passadas e deixando-o longe dos tempos em que, num fim-de-semana de Fevereiro de 1994, tinha feito toda uma geração de crianças e jovens portugueses antecipar o que previam vir a ser uma experiência inesquecível numa sala de cinema, a acompanhar as peripécias do polícia-robô...

26.01.24

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

Os anos 80 e 90 foram décadas de excelência para o cinema de acção, responsáveis por uma série quase infindável de 'blockbusters' capitaneados por 'heróis' tão conhecidos como Arnold Schwarzenegger, Jean-Claude Van Damme ou Sylvester Stallone. Este último, em particular, há muito que deixara os contornos independentes da sua estreia com 'Rocky' (que também realizara) ou com o primeiro filme da série 'Rambo', e se acomodara à figura de herói musculado, carrancudo e de poucas palavras a que a sua caracterização deste último personagem o associara. Em inícios da década de 90, este era já, praticamente, o único tipo de papel para o qual Stallone era escalado – excepção feita à ocasional comédia de acção, à semelhança do congénere Schwarzenegger – o que não invalidava que o actor e realizador tentasse, ainda assim, injectar alguma variedade à sua filmografia, nomeadamente através de incursões por outros géneros.

Destes, era a ficção científica a que mais frequentemente captava a atenção do astro, que, só no ano de 1993, participaria em duas super-produções do género – primeiro a pouco unânime adaptação da banda desenhada 'Juiz Dredd', em 'O Juiz', e depois 'Homem Demolidor', um filme de estética e enredo muito semelhantes e que, em conjunto com o seu antecessor, ajudou a que o nome de Stallone fosse, durante alguns meses, sinónimo com o género da acção futurista.

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E se, em 'O Juiz', o carrancudo herói de acção surgia acompanhado de Rob Schneider, no papel de coadjuvante com veia cómica, aqui a co-estrela é bem mais inesperada, e bem menos irritante: trata-se, nada mais nada menos, do que de Wesley Snipes, o futuro 'Blade', aqui no papel de antagonista do polícia futurista de Stallone. O trio de personagens centrais do filme completa-se com Sandra Bullock, mais tarde reconhecida por filmes como 'Speed – Perigo a Alta Velocidade' ou 'Miss Detective', e que aqui interpreta a parceira de Stallone no caso que este investiga.

O resultado são duas horas acima da média no tocante a ficção científica noventista (uma fasquia que apenas seria elevada no final da época) que foram, à época, consideradas um 'regresso à forma' para Stallone, após uma série de filmes menos conseguidos, e que tiveram mesmo honras de adaptação oficial em livro, publicada em Portugal pela inevitável Europa-América, magnata deste género de publicação no nosso País.

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Capa nacional da novelização da trama, lançada pela inevitável Europa-América.

Grande parte deste sucesso, e do apelo do filme, ter-se-à devido à veia satírica do enredo, que ajudava a destacá-lo dos outros filmes 'de explosões' futuristas que povoavam os cinemas e videoclubes da época. Quase exactos trinta anos após a sua estreia nacional (a 21 de Janeiro de 1994, dois meses e meio após 'abrir' nos Estados Unidos) 'Homem Demolidor' é, decididamente, um produto do seu tempo, mas ainda apresenta qualidade suficiente para poder ser considerado um dos melhores exemplos do género de ficção científica pré-'Matrix', e para entreter qualquer fã do género disposto a contextualizá-lo correctamente.

08.12.23

NOTA: Por motivos de relevância, todas as Sextas-feiras de Dezembro serão Sessões.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

Hoje em dia, os filmes de super-heróis, ou simplesmente baseados em obras de banda desenhada, são um dos géneros mais prolíficos, bem-sucedidos e de maior orçamento do panorama cinematográfico. No entanto, quem já era fã deste tipo de filme antes do advento dos Multiversos Cinematográficos Marvel e DC sabe que nem sempre foi esse o caso, antes pelo contrário, e que os filmes baseados em BD's tiveram, durante várias décadas, custos de produção baixíssimos e níveis de qualidade que oscilavam entre o aceitável e o tenebroso. De facto, já nos primeiros anos do Novo Milénio, era ainda possível sentir o receio dos 'nerds' de todo o Mundo sempre que era anunciado um novo filme do estilo, mesmo depois de terem já havido vários exemplos do género de qualidade muito acima da média. E se os 'Batmans' de Tim Burton e Joel Schumacher e os 'X-Men' de Bryan Singer são, normalmente, creditado como os primeiros filmes a contribuir para o inverter da tendência, a verdade é que o género 'quadradinhos no grande ecrã' produzia, na mesma altura, outro filme de algum sucesso, sobre cuja estreia em Portugal se celebram na próxima semana vinte e cinco anos.

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Surgido nas salas lusas a 11 de Dezembro de 1998 (mesmo dia em que era lançado o muito diferente 'Pai Para Mim...Mãe Para Ti', de que falámos na última edição desta rubrica), 'Blade' baseava-se no personagem da Marvel com o mesmo nome, um 'híbrido' de vampiro e humano conhecido como 'dhampir', que utiliza as suas habilidades vampíricas para caçar e eliminar os 'puros sangues', em cenas bem 'sangrentas', repletas de acção com armas brancas e do tipo de artes marciais que viria a ganhar (ainda mais) popularidade com o lançamento de 'Matrix', no ano seguinte.

No papel do enigmático e sorumbático personagem surgia Wesley Snipes, actor em tempos tido como revelação (actuou em filmes como 'New Jack City', por exemplo) mas cuja carreira ficara marcada pela combinação de um temperamento complicado com abuso de substâncias, que o vira embarcar em obras de muito menor calibre – embora ainda tivesse conseguido trabalhar com um dos grandes heróis de acção dos anos 80 e 90, Sylvester Stallone, durante a segunda 'fase áurea' deste último, ao representar o vilão em 'Homem Demolidor', de 1994. No entanto, 'Blade' é geralmente tido como o filme que permitiu trazer Snipes de volta à ribalta, numa trajectória semelhante à que Eddie Murphy encetava no mesmo período, com a sua participação vocal em 'Mulan' e o sucesso de 'Doutor Doolittle'.

E a verdade é que, sem ser nenhum portento cinematográfico, 'Blade' resulta bem para aquilo que é – um veículo para Snipes, que nada mais pretende do que oferecer noventa minutos de entretenimento descartável para adolescentes e fãs do personagem. A referida demografia respondeu, aliás, em peso, tornando 'Blade' num dos primeiros verdadeiros sucessos de um género até então representado por obras medianas, como 'O Juiz', ou declaradamente fracas.

Tendo em conta este sucesso, não é de surpreender que Snipes tenha voltado a vestir a capa de cabedal do 'dhampir' dos quadradinhos, não uma, mas duas vezes – a primeira em 2002, sob a direcção do 'lunático' Guillermo del Toro, num filme considerado uma versão melhorada e alargada do seu antecessor, e a segunda em 2004, para o menos consensual 'Blade III: Trinity', que conseguiu ainda assim um desempenho meritório nas bilheteiras tanto nacionais quanto mundiais. Já a série baseada no personagem, também com argumento de David S. Goyer (que escrevera todos os filmes e realizara o terceiro) mas com o 'rapper' Sticky Fingaz no lugar do demissionário Snipes, não chegou a estrear em Portugal.

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Os dois filmes que completam a trilogia, também eles bastante bem sucedidos.

É fácil de perceber, portanto, que apesar de algo esquecida vinte anos passados, a trilogia 'Blade' não deixou de marcar época entre os adolescentes das gerações 'X' e 'millennial', aos quais ofereceu, precisamente, aquilo que procuravam: acção bem sangrenta e com a estética de 'cabedal negro' tão apreciada naqueles anos de viragem de Milénio. Além disso, a série explora o reavivar de interesse em vampiros, iniciado com 'Entrevista com o Vampiro', de 1995, e que viria, em anos subsequentes, a inspirar várias versões do conto de Drácula, além, claro, da inescapável 'Saga Crepúsculo'. Em finais de 1998, no entanto, os vampiros estavam, ainda, muito longe de brilhar ao sol, sendo Blade um muito melhor exemplo de como modernizar as míticas criaturas, e o seu primeiro filme um clássico nostálgico menor para a geração crescida durante os anos 90.

22.09.23

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

Quando se fala em heróis de cinema de acção de finais do século XX, vêm imediatamente à memória uma série de nomes: Arnold Schwarzenegger (cuja fama fora adquirida na década de 80, e apenas aumentaria no início da seguinte, com filmes como 'Exterminador Implacável 2'  e 'O Último Herói de Acção', não-obstante um 'desvio' para filmes de índole mais cómica), Sylvester Stallone, Bruce Willis, Steven Seagal e, claro, Jean-Claude Van Damme, o culturista e ginasta que se transformaria na principal estrela de filmes de artes marciais da época.

Revelado ao Mundo, como os restantes nomes da lista acima, em meados dos anos 80, o belga conhecido pela alcunha de 'Músculos de Bruxelas' tinha já o estatuto mais do que definido à entrada para a última década do Segundo Milénio; filmes como 'Força Destruidora', de 1988, 'Cyborg' e 'Kickboxer – Golpe de Vingança', ambos do ano seguinte, haviam cimentado a perícia do actor nas mais mirabolantes peripécias físicas, que suplantavam o seu forte sotaque e limitado talento dramático e o tornavam num dos grandes ídolos para as crianças e jovens daquele período.

Era, pois, já com o rótulo de 'mega-estrela', e um público totalmente rendido às suas capacidades, que o belga chegaria àquele que era o seu décimo filme como actor principal, e o oitavo em apenas três anos: 'Duplo Impacto', que celebra na próxima semana os trinta e dois anos sobre a sua estreia em Portugal, a 27 de Setembro de 1991, e que se destaca pela invulgar particularidade de ver Van Damme representar não um, mas dois papéis, encarnando ambas as metades de um par de irmãos gémeos.

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O facto de permitir ao público-alvo experienciar Van Damme em 'dose dupla' foi, aliás, posicionado como o principal atractivo do filme à época – e o mínimo que se pode dizer é que resultou em cheio (pelo menos com o autor deste blog), O facto de os dois personagens interpretados pelo belga apenas se distinguirem por características superficiais e estereotipadas (um deles é mais recatado e usa óculos, o outro mais rebelde e vestido com o inevitável blusão de cabedal) e se tornarem homólogos a partir de meados do filme (quando o irmão 'choninhas' se revela tão capaz quanto o seu gémeo) pouco importava à demografia-alvo, demasiado ocupada a ponderar como teriam os realizadores conseguido fazer com que dois Jean-Claudes estivessem em cena ao mesmo tempo, e a conversar um com o outro – uma questão que apenas teria cabimento naquela era pré-DVD e reportagens de produção. O intuito declarado de Van Damme em fazer algo diferente do habitual e com maior âmbito dramático (à semelhança do que Arnie vinha fazendo, com sucesso, na mesma altura) ficava, assim, algo diluído, naquela que acaba por ser apenas mais uma película típica da filmografia do belga, ainda que com menor ênfase nas artes marciais e maior nos tiroteios e cenas de acção.

Ainda assim, 'mais do mesmo (mas em dobro)' era precisamente o que o público-alvo queria e esperava de um filme com esta premissa, e 'Duplo Impacto' saldou-se como mais um sucesso de bilheteira para a parceria entre Jean-Claude Van Damme, Sheldon Lettich (o homem que escrevera 'Força Destruidora' e realizara 'Coração de Leão', um dos filmes anteriores de Van Damme) e o lendário Bolo Yeung, amigo pessoal do belga desde 'Força Destruidora' e especialmente requisitado pelo mesmo para encarnar o 'mau da fita', tal como fizera naquele filme. E ainda que – à semelhança da maioria da restante filmografia do belga daquela época – o filme não tenha envelhecido, de todo, bem, vale ainda assim a pena recordar aquele que, para os 'millennials' mais novos, terá sido um dos primeiros contactos directos com os 'Músculos de Bruxelas', e talvez mesmo - como foi o caso com o autor deste blog - um dos primeiros filmes 'para crescidos' alguma vez vistos em 'primeira mão' numa sala de cinema.

26.08.23

NOTA: Este post é respeitante a Sexta-Feira, 25 de Agosto de 2023.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

Hoje em dia, o nome de Quentin Tarantino é sinónimo de um certo e determinado tipo de cinema, pleno de referências à cultura 'pop', diálogos inteligentes e cheios de palavras incomuns, humor negro e, muitas vezes, doses cavalares de 'molho de tomate'. Mas se, hoje em dia, o cinema do realizador (com todos os elementos supracitados) faz parte das referências de qualquer cinéfilo, em Maio de 1993, o mesmo era um ilustre desconhecido - pelo menos para os jovens lusitanos, que se preparavam (sem o saber) para tomar contacto com a sua primeira obra-prima.

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Terceiro filme do realizador (embora seja o primeiro de maior expressão, e considerado por muitos como a sua verdadeira estreia), 'Cães Danados' ('Reservoir Dogs', no original) traz já todos os elementos supracitados, bem como outros típicos de Tarantino (como a 'ponta' do próprio realizador numa das cenas), tendo sido responsável por os implementar e apresentar ao grande público. E se, em trabalhos subsequentes, QT se desdobraria em arroubos de história, aqui, o argumento não pode ser mais simples: todo o filme se passa num único local, um armazém abandonado, e se centra num único grupo de seis homens, ali refugiados após um assalto mal-sucedido. Sem saberem nada uns sobre os outros, além dos nomes de código referentes a cores, os mesmos acabam, ainda assim, por desenvolver relações interpessoais de cariz tragicómico, num resultado final que fica entre a comédia negra e a vertente mais sarcástica dos filmes de crime (ao estilo Guy Ritchie).

Alicerçado nas excelentes exibições de Harvey Keitel, Steve Buscemi, Tim Roth e Michael Madsen, 'Cães Danados' não tardou a ganhar renome como um dos filmes mais sangrentos até então filmados, e também como uma descontrução dos filmes de crimes, semelhante à sua inspiração directa, 'The Killing', de Stanley Kubrick. O seu sucesso contribuiu também, em larga medida, para estabelecer o nome de Tarantino como jovem realizador a ter em conta, um estatuto que seria cimentado pelo seu trabalho seguinte, o lendário 'Pulp Fiction', lançado em 1994. 'Cães Danados' é, no entanto, muito mais do que apenas um 'ensaio geral' para esse filme, e continua a merecer os elogios de que é alvo, mesmo após completadas três décadas sobre a sua chegada a Portugal.

28.07.23

NOTA: Por motivos de relevância, esta Sexta será também de cinema. Voltaremos a falar de moda na próxima semana.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

O Verão foi, e continua a ser, tradicionalmente uma 'época alta' no que toca a estreias de filmes, sobretudo 'blockbusters' e películas destinadas a um público mais jovem, tendo, inclusivamente, sido um dos dois períodos do ano, juntamente com o Natal, em que era expectável um novo lançamento por parte da Disney; e, tendo os anos 90 sido um dos períodos áureos do cinema infanto-juvenil (com a própria Disney, por exemplo, em plena 'Renascença'), não é de estranhar que os últimos dias de Julho tivessem, tanto há trinta anos como há um quarto de século, visto chegar ao nosso País filmes capazes de entusiasmar o público mais jovem, e que se tornariam clássicos nostálgicos para os hoje adultos da geração 'millennial'.

De facto, os dias 30 e 31 de Julho tanto de 1993 como de 1998 assinalaram a estreia nacional de nada menos do que três longas-metragens hoje recordadas com carinho pelos portugueses na casa dos trinta a quarenta anos, duas delas explicitamente destinadas a um público infantil, e a terceira um potencial alvo para o tradicional visionamento 'às escondidas', com amigos ou depois de os pais já terem ido para a cama.

Começando pelo 'início' – isto é, pelo filme mais antigo dos três – o dia 30 de Julho de 1993 via chegar às salas lusas 'Ferngully', filme de Don Bluth que, em Portugal, receberia o incompreensivelmente longo sub-título de 'As Aventuras de Zak e Krysta na Floresta Tropical'. Lançada no auge da era de ouro da sensibilização para a ecologia, a longa-metragem conta com uma mensagem de protecção da natureza, envolta na habitual história de um humano comum 'puxado' para um reino mágico que deve ajudar a proteger - neste caso, o das fadas protectoras da 'última floresta tropical', que se encontra ameaçada por madeireiros.

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Com o padrão de qualidade habitual de Bluth, e talentos vocais de qualidade (entre eles Robin Williams, então em estado de graça após a sua interpretação do Génio em 'Aladdin', do ano anterior, e que ainda em 1993 faria outro clássico, 'Papá Para Sempre') o filme divide, hoje em dia, opiniões, com muitos críticos a apontarem para a mensagem do filme e para o número musical do personagem de Williams, Batty - que interpreta um 'rap' bem ao estilo da década então em curso - como pontos negativos. Para quem lá esteve em 1993, no entanto - a duas semanas de completar oito anos, 'impante' e ufano por ter conseguido bilhetes para a ante-estreia – nada disso era minimamente relevante, e 'Zak e Krysta' pareceu um excelente filme; ou seja, para o público-alvo, menos preocupado com questões de detalhe, esta foi, e provavelmente continuará a ser, uma excelente forma de passar uma hora e meia com uma animação de qualidade, a qual fez sucesso suficiente para, inclusivamente, dar azo a uma sequela, esta sem qualquer repercussão em Portugal.

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Um dia após a estreia da última obra de Bluth, a 31 de Julho, chegava ao nosso País um futuro 'clássico' dos canais de filmes a cabo: 'O Último Grande Herói', uma comédia de acção que via Arnold Schwarzenegger fazer um papel bem 'meta-textual', interpretando o personagem titular, o típico herói musculado da época, que se vê a braços com um jovem espectador que, graças a um bilhete mágico, consegue entrar no filme, e se vê envolto na trama do mesmo. Os dois membros deste insólito par têm, assim, de trabalhar juntos para travar o vilão, aliando a força e armamaento de Arnie ao conhecimento sobre estereótipos e fórmulas cinematográficas do seu jovem coadjuvante.

E é, precisamente, a química entre os 'músculos de Bruxelas' e o jovem Austin O'Brien que rende os momentos mais divertidos deste filme, como aquele em que o Danny Madigan de O'Brien menciona, jocosamente, o facto de todos os números de telefone do filme começarem por 555, o indicativo tradicionalmente usado por Hollywood neste tipo de situações. Apesar de não ser uma obra-prima intemporal (o único filme de Arnie qualificado para essa categoria continua a ser 'O Predador') trata-se de uma longa-metragem bem divertida, que doseia bem o humor e a acção (à maneira de antecessores como 'O Caça-Polícias' e de sucessores como 'Hora de Ponta'), sabe explorar a veia cómica de Schwarzenegger, e conta com uma banda sonora à altura, povoada por nomes como AC/DC, Alice in Chains, Def Leppard, Queensryche, Aerosmith, Anthrax ou Cypress Hill, entre outros.

Exactos cinco anos após a literal explosão de Arnie nos cinemas nacionais, estreava em Portugal outro filme teoricamente para um público mais 'maduro', mas que muitas crianças terão, decerto, visto em anos subsequentes, no contexto do 'home video' – aqui, por exemplo, viu-se aos cerca de treze ou catorze anos, na noite de cinema da colónia de férias.

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Falamos de 'O Enigma do Horizonte' (no original, 'Event Horizon') um excelente filme de ficção científica encabeçado por Laurence Fishburne (em 'ensaios' para 'Matrix', dois anos depois), Sam Neill e Jason Isaacs e realizado pelo hoje conceituado Paul W. S. Anderson. Com uma história algo semelhante à de 'Alien – O Oitavo Passageiro' (em que uma equipa de salvamento espacial fica presa numa nave abandonada, à mercê de uma força sinistra) o filme é notável, sobretudo, pelos efeitos especiais, de entre os quais se destaca o 'rio' de sangue a descer um dos corredores da nave – imagem que deixou boquiaberto aquele adolescente de finais do Segundo Milénio, sentado em colchões no chão da sala principal de uma colónia de férias presencial na Margem Sul do Tejo. Mesmo para um público mais adulto e exigente, no entanto, este filme continua a ser uma boa proposta para uma noite mais escura e chuvosa, de preferência em boa companhia...

Em suma: em apenas dois dias de dois anos distintos, o público infanto-juvenil português viu surgirem nas telas nacionais três excelentes filmes (mais ou menos) apropriados à sua faixa etária, e que ainda hoje são conceituados dentro dos seus respectivos estilos – uma coincidência, sem dúvida, digna de nota nas páginas deste 'nosso' Portugal Anos 90, numa altura em que se assinalam aniversários marcantes sobre as estreias de todos os três.

19.05.23

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

Num panorama cinematográfico em que os super-heróis da Marvel avançam rapidamente para um monopólio nos géneros de acção e fantasia – com cada novo filme a constituir um sucesso de bilheteira tão automático como garantido – pode parecer irónico que, há apenas pouco mais de duas décadas, as longas-metragens adaptadas da banda desenhada norte-americana redundassem, quase sempre, em falhanços a quase toda a linha. No entanto, a verdade é que, antes da adaptação ao cinema de 'X-Men' realizada por Bryan Singer já no Novo Milénio, era mesmo quase impossível encontrar um único filme de super-heróis que reunisse o consenso de críticos e fãs. Alguns chegavam a atingir estatuto de culto (como o 'Blade' de Wesley Snipes) e outros afirmavam-se mesmo como sucessos de bilheteira (caso de 'A Máscara', da série 'Homens de Negro' ou dos filmes de Batman e das Tartarugas Ninja) mas a maioria acabava mesmo por se 'afundar' no mesmo 'buraco negro' que 'vitimava' as adaptações cinematográficas de videojogos.

'Spawn - O Justiceiro das Trevas', a longa-metragem de 1997 que completou o mês passado vinte e cinco anos sobre a sua estreia em Portugal, é apenas mais um exemplo desta tendência, a juntar a filmes como 'Howard, o Pato', de George Lucas (sim, esse mesmo!) ou 'Steel – O Homem de Aço', com Shaquille O'Neal. Apesar do enorme sucesso gozado, à época, pela criação homónima de Todd McFarlane (que ajudara, quase por si só, a lançar a Image Comics como 'terceira grande' na 'guerra' da BD norte-americana) a sua adaptação para o grande ecrã foi, e é, universalmente considerada desapontante, conseguindo capturar o espírito da banda desenhada original, mas sendo prejudicada pelo baixo orçamento e subsequentes limitações na produção.

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Não são apenas os 'trailers' que mentem - os cartazes, por vezes, também o fazem...

Trazendo o musculado e sorumbático Michael Jai White no papel do demoníaco protagonista (um falecido ex-polícia trazido de volta à vida como vigilante sobrenatural) e John Leguizamo por trás da maquiagem de palhaço do vilão, e coadjuvantes como Martin Sheen, Theresa Randle e D. B. Sweeney, o filme tinha tudo para dar certo; no entanto, apesar das maquiagens cuidadas dos protagonistas sobrenaturais, aspectos como a história, cenários ou efeitos especiais (todos típicos da época, ou até de alguns anos antes) deixam algo a desejar, acabando por fazer com que o produto final fique aquém das expectativas. Filmes como 'O Corvo' (lançado três anos antes) já haviam mostrado ser possível 'contornar' esse tipo de questões e criar, ainda assim, um produto entusiasmante e bem conseguido, mas, infelizmente, 'Spawn – O Justiceiro das Trevas' não consegue ser bem-sucedido nessa missão, acabando por ser mais um dos muitos filmes de super-heróis pré-Milénio a merecer o escárnio tanto de cinéfilos como de fãs da BD original.

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Michael Jai White na pele do protagonista.

Ainda assim, para as crianças e jovens fãs do herói de McFarlane (e, em Portugal,ia já havendo umas quantas, graças à cada vez maior penetração de BD's americanas no nosso País, pela mão da Abril/Controljornal) o filme terá representado uma oportunidade de ouro de ver o 'seu' herói, em carne e osso, no grande ecrã – um factor que terá certamente, à época, ajudado a mitigar quaisquer críticas ao filme ao nível técnico. À distância de um quarto de século, no entanto, é fácil perceber as razões para 'O Justiceiro das Trevas' não ser lembrado e discutido no mesmo patamar de 'X-Men', 'O Homem-Aranha' ou até 'Blade', e muito menos da actual safra de filmes da Marvel; hoje em dia, a longa-metragem é, sobretudo, documento de uma época em que os fãs de banda desenhada sofriam 'as passas do Algarve' de cada vez que iam ao cinema ver o mais recente 'assassinato' cinematográfico da sua forma de arte de eleição...

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