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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

11.09.23

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

As décadas de 80 e 90 representaram a chegada ao Ocidente, e respectiva expansão na popularidade, de um género televisivo e filmográfico já com cerca de década e meia de vida no seu país natal do outro lado do Mundo, à época designado 'Japanimação' e mais tarde conhecido pelo seu nome original: 'anime'. E se, em anos vindouros, este género viria a contribuir com uma mão cheia de clássicos absolutos para a juventude da geração 'millennial' – do inigualável fenómeno que foi Dragon Ball Z a séries tão nostálgicas como Samurai X, Navegantes da Lua ou Doraemon – os seus primeiros passos, embora mais modestos, também não foram, de todo, falhos em séries marcantes, bastando para esse efeito referir Esquadrão Águia, Capitão Falcão (mais tarde 'Oliver e Benji) ou Cavaleiros do Zodíaco.

A juntar a estas séries há, ainda – sobretudo para os 'millennials' mais velhos – uma outra, que iniciava há quase exactos trinta anos a sua terceira e última transmissão em Portugal e que, apesar de ficar ligada, sobretudo, à década anterior, ainda chegou a tempo de influenciar a grande maioria dos 'putos' lusitanos de inícios de 90; e, tal como sucede com alguns dos outros programas de que aqui falamos, este é daqueles casos em o primeiro passo tem, forçosamente, de passar pela partilha do tema de abertura.

Por esta altura, muitos dos nossos leitores já estarão, decerto, a cantar a plenos pulmões a letra...

Isto porque – apesar de notoriamente incompleta – a música introdutória (adaptada, como em tantos outros casos, da versão espanhola, e cantada por Francisco Ceia) é, sem qualquer dúvida, o elemento identificativo mais icónico de As Aventuras de Tom Sawyer (ou apenas Tom Sawyer), a adaptação livre, em formato animado, do famoso livro infantil do século XIX, da autoria de Mark Twain. Composta de cerca de cinquenta episódios, originalmente produzidos em 1979 e lançados no inícios do ano seguinte (tendo passado a quase totalidade de 1980 em exibição na televisão japonesa), a série chegaria a Portugal logo de seguida, sem a 'décalage' cultural habitual à época, indo pela primeira vez ao ar na RTP1 entre 1981 e 1982, já em versão dobrada, num exemplo de celeridade pouco habitual naqueles anos pré-digitais.

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Imagem promocional da série.

Escusado será dizer (pelo menos a quem faz parte da faixa de leitores deste 'blog') que a série se revelou um sucesso imediato, tendo marcado os jovens portugueses da 'Geração X' – sobretudo, como já referimos, através do seu icónico tema de abertura – e justificando a repetição, já no fim da década, com o intuito de a apresentar a quem não tinha tido oportunidade de a ver da primeira vez. Seria, assim, entre Março de 1989 e Fevereiro de 1990 que os 'millennials' tomariam, pela primeira vez, contacto com o 'anime' que fizera as delícias dos seus irmãos mais velhos anos antes, e que tornaria a 'repetir a dose' com a nova geração – tanto assim que viria ainda a ser exibida uma terceira vez, há cerca de trinta anos, novamente no então Canal 1, e com a mesmíssima dobragem realizada mais de uma década antes pela Nacional Filmes.

Esta última transmissão seria, no entanto, o 'canto do cisne' para Tom Sawyer, um desenho animado que, embora icónico, já pertencia, nessa época, a uma outra 'era' televisiva, algo distante dos produtos que vinham 'enlouquecendo' os jovens daqueles inícios dos anos 90. Para as crianças da década transacta, no entanto – tanto as que haviam seguido a transmissão original como as que tinham 'saltado a bordo' aquando da segunda exibição – a série é, ainda hoje, um dos principais pontos de referência nostálgicos ao falar da infância em Portugal em finais do século XX, ao nível dos referidos Dragon Ball Z e Navegantes da Lua, ou ainda de séries como Dartacão ou Power Rangers. E nunca é demais repetir que grande parte dessa fama se deve à lendária canção de abertura, sem a qual esta adaptação animada de um clássico da literatura talvez tivesse passado tão despercebida quanto as suas congéneres posteriores alusivas a Mogli, Zorro, Cinderela ou Robin dos Bosques – mais um testamento, caso ainda fosse necessário, do poder de um bom tema de abertura; e, no que toca à televisão infantil portuguesa, este talvez seja 'O' tema de abertura, mais icónico ainda do que 'Dragon Ball, de puro cristal', 'Vive a vida, como uma festa', 'Dartacão, Dartacão!' ou mesmo 'Eu quero ser, mais que perfeito, maior do que a imaginação'. Razão mais que suficiente para o recordarmos, e à série que introduzia e ajudou a tornar memorável. 'Tu andas sempre descalço, Tom Sawyer...'

Sim, existe uma letra completa...

 

29.08.23

NOTA: Este post é respeitante a Segunda-feira, 28 de Agosto de 2023.

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

Estava-se nos primeiros anos da década de 60 quando um produtor musical norte-americano tinha a genial ideia de gravar cantores a interpretar canções de forma deliberadamente lenta e, utilizando técnicas de aceleração, alterar as suas vozes para que ficassem com um timbre exageradamente alto, quase 'cartoonesco'. Para combinar com esta voz 'de hélio', o mesmo produtor criaria, então, três personagens animados: esquilos antropomórficos e falantes, adoptados por um músico, e subsequentemente transformados em grupo vocal. Nascia, nesse instante, um fenómeno que poucos preveriam vir a perdurar durante as seis décadas seguintes, mas que continua até hoje a fazer as delícias da criançada, bastando para isso atentar no desenho animado CGI actualmente disponível no Netflix e Nickelodeon, já a terceira a contar com os personagens em causa.

Falamos, é claro, dos Esquilos (actualmente designados como Alvin e os Esquilos) o grupo virtual criado por Ross Bagdasarian (também conhecido como Dave Seville, o 'pai' adoptivo dos três rapazes) e que foi muito além do seu estatuto como 'one-hit wonder' vagamente piadético, tendo chegado a ganhar dois Grammys (!) e tido direito, desde a sua criação, a uma série de banda desenhada, quatro (!!) filmes de acção real, um sem-fim de 'merchandising' e, claro, as referidas séries animadas, das quais a mais famosa (em Portugal e não só) é a segunda, produzida em 1983 e exibida no nosso País em duas ocasiões na década seguinte.

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Responsável pela criação e apresentação das Esquiletes (as namoradas dos personagens, que, como não podia deixar de ser, são versões femininas exactas dos mesmos) a série não deixa, no entanto, que as novas personagens ofusquem os três protagonistas principais; de facto, o foco continua declaradamente sobre Alvin (o travesso e teimoso Esquilo de boné e t-shirt vermelha), Simon (o Esquilo 'marrão' e atinado, oposto do irmão, e que veste de azul) e Theodore (o 'gordinho' sensível, tímido e comilão, cuja cor é o verde) e na sua relação por vezes difícil, mas sempre bem-intencionada, com o pai adoptivo humano. As histórias, essas, giram em torno dos habituais assuntos da vida quotidiana, pertinentes para o público-alvo, como as relações interpessoais ou as emoções próprias, intercalados com o aspecto mais 'show-business' da vida das três 'crianças', e uma ou outra aventura mais mirabolante. O resultado é um programa bem animado, bem conseguido a nível global, e que possui a característica mais importante para se destacar no mercado televisivo infanto-juvenil dos anos 90: um genérico de abertura daqueles instantaneamente reconhecíveis e entusiasmantes, que é já 'meio caminho andado' para o sucesso.

A segunda versão da abertura, quase uma transcrição literal do original.

E sucesso foi coisa que não faltou a esta série, que foi transmitida um pouco por todo o Mundo, incluindo (conforme acima referido) por duas vezes em Portugal, em ambos os 'extremos' da década de 90: primeiro logo a abrir a mesma, na RTP (então Canal 1) e com os nomes dos personagens 'aportuguesados', e mais tarde no Batatoon da TVI, em 1999, com nova dobragem a cargo da Nacional Filmes, e mais fiel ao original. Tal como 'Dennis o Pimentinha', esta foi, portanto, daquelas séries que tiveram a oportunidade de captar duas gerações de público-alvo totalmente distintas, e de as cativar a seguir as aventuras daquela pequena e invulgar família.

Tal como também já vimos acima, este desenho animado esteve longe de ditar o fim da popularidade dos Esquilos, que renovariam ainda a audiência por mais duas vezes ao longo das três décadas seguintes, primeiro através dos filmes e, mais tarde, do actual desenho animado. Nada mal para uma 'ideia parva' tida por um descendente de Arménios de Fresno, Califórnia em meados do século passado...

 

16.08.23

NOTA: Este post é respeitante a Segunda-feira, 14 de Agosto de 2023.

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

Na passada Sexta-feira, falámos aqui dos dois filmes de 'acção real' alusivos ao personagem de Dennis, o Pimentinha (ou Dennis, The Menace) lançados durante os anos 90, numa época em que era grande o volume de séries animadas a terem direito a uma adaptação deste género; nada mais justo, portanto, do que recordarmos agora a animação original cujo sucesso deu azo às referidas tentativas cinematográficas.

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Baseada na decana banda desenhada do mesmo nome, a série animada de 'Dennis, O Pimentinha' foi produzida originalmente em 1986, através da então habitual cooperação entre estúdios norte-americanos e asiáticos, ficando estes a cargo de grande parte da componente animada. A título de curiosidade, este programa em particular contava, ainda, com o patrocínio da companhia de cereais norte-americana General Mills, que surgia, inclusivamente, como detentora dos direitos, mas sobre a qual os 'putos' portugueses não tinham qualquer referência.

Àparte este curioso 'sponsor', no entanto, 'Dennis, o Pimentinha' trazia todos os elementos comuns às séries infantis da altura, do genérico ritmado e ultra-memorável (com animação a condizer) ao formato com duas histórias por episódio, aos próprios argumentos, que seguiam a linha das situações quotidianas, focando-se, sobretudo, nas brincadeiras do protagonista e dos amigos Joey, Margaret e Gina, além do cão Ruff, e nos 'tormentos' causados pelo grupo aos vizinhos reformados, os Wilsons, e sobretudo ao sofredor patriarca George. Uma receita que arriscava pouco, mas não deixava de render vinte minutos bem passados a quem gostava desse tipo de conteúdo, como era o caso lá por casa.

Um daqueles genéricos que 'reside' de graça na cabeça de muitos 'millennials'.

Essa opinião devia, aliás, ser generalizada um pouco por todo o País, já que 'Dennis, o Pimentinha' passou, não uma, mas duas vezes na televisão portuguesa - primeiro na RTP, em versão original legendada, e mais tarde na TVI, onde surgiu em 1995 com uma nova dobragem em Português da Somnorte, em que a família Mitchell se transformava em Meireles. E apesar de se ter ficado por aí a presença de Dennis e seus amigos nos televisores portugueses (a menos que se conte a transmissão no Canal Panda, ainda alguns anos mais tarde) a influência do 'pestinha' de seis anos estendeu-se até finais da década seguinte, tendo uma série de DVDs sido lançada no mercado em 2008, com ainda uma outra dobragem em Português, agora a cargo da PSB. Nada mau para um desenho animado lançado mais de duas décadas antes e que, para o público original norte-americano, era já algo passado e bafiento, tendo constituído um daqueles casos em que o maior sucesso é encontrado num país que não o de origem.

E se, hoje, o 'puto' Dennis é algo menos conhecido - tendo a Geração Z encontrado os seus próprios heróis animados, do qual não faz parte - para os 'millennials', o rapazito loiro de jardineiras vermelhas e 't-shirt' às riscas será, para sempre, um ícone das tardes de infância passadas em frente à televisão a ver os 'bonecos', justificando por isso estas breves linhas recordatórias da sua passagem pelas ondas televisivas nacionais.

31.07.23

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

No primeiríssimo 'post' deste blog, falámos do inesquecível e irrepetível fenómeno que foi Dragon Ball Z; já na última Segunda de Séries, comemorámos os vinte e cinco anos da sua algo desapontante sequela, Dragon Ball GT. Agora, apenas será de bom tom completar a 'trilogia', e falar da série que deu início a toda a 'febre', o Dragon Ball original.

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Criada por Akira Toriyama em 1986 e livremente baseada no antigo conto épico chinês sobre o Rei Macaco, Dragon Ball contava a história de Son Goku (ou Songoku, como era muitas vezes chamado) um rapaz de força prodigiosa, a beirar os super-poderes, com uma estranha cauda de macaco e detentor de uma nuvem mágica que obedece ao seu comando, que procura, simultaneamente, aprender artes marciais e reunir as sete bolas de cristal espalhadas pelo seu fantástico Mundo e que, quando juntas, invocam um dragão realizador de desejos; no caso de Son Goku, o desejo seria o de ressuscitar o avô, detentor original da quarta bola, agora na posse do jovem herói. O destino reúne-o a Bulma, uma adolescente desmiolada que também quer encontrar as bolas de cristal, Yamcha, um fora-da-lei, e Krillin, o outro discípulo do Mestre Tartaruga Genial, de quem Son Goku se torna aluno. Juntamente com personagens mais periféricos como Lunch (uma inocente e tímida menina que, ao espirrar, se torna numa irascível guerrilheira loira e musculada, ao estilo Rambo) Oolong (um ganancioso e oportunista porco antropomórfico) e Puar (um gatinho azul voador e transmorfo) este grupo irá viver muitas aventuras e enfrentar muitos inimigos, entre eles os alunos do Mestre Corvo Genial, Ten Shin Han (um monge com um terceiro olho implantado na testa) e Chaos (um príncipe com a aparência de um boneco de cristal), e os malvados extraterrestes Pilaf e Satã (sim, é mesmo esse o seu nome) cujo 'rabugento' filho se viria a tornar aliado dos heróis em 'Z'.

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O grupo de protagonistas - e alguns rivais.

E ainda que a sequela tenha sido o verdadeiro 'fenómeno' (ainda hoje inigualado em Portugal), a verdade é que Dragon Ball foi também imediatamente bem recebido pela juventude portuguesa aquando da sua estreia no mítico Buereré da SIC, quase uma década após a sua criação. Com o seu excelente balanço de acção e humor (com o segundo a ganhar largamente, ao contrário do que acontece com 'Z') história cativante e personagens imediatamente icónicos, a série não tardou a tornar-se uma das favoritas de uma demografia que já tinha acolhido de braços abertos séries como Tartarugas Ninja ou Moto-Ratos de Marte, de índole muito semelhante. Em relação a essas, no entanto – e a animes da 'primeira vaga', como Esquadrão Águia – Dragon Ball é mais centrado na fantasia, por oposição à ficção científica, destacando-se assim da maioria dos seus congéneres, o que também ajudou à sua rápida popularização; a versão portuguesa contou, ainda, com as vantagens acrescidas de uma dobragem abertamente cómica e largamente improvisada - que se tornaria um dos aspectos mais memoráveis tanto desta série como da sua sucessora– e de um tema de abertura absolutamente épico e clássico, considerado por muitos portugueses como sendo muito superior ao de 'Z' e mesmo ao de 'GT' (e que, decerto, figurará neste preciso momento na cabeça de muitos leitores).

Impossível não cantar.

Em suma, apesar de não ter atingido os contornos de fenómeno de massas do seu sucessor (e de alguma polémica relativa à suposta morte de uma criança ao cair de uma janela, esperando ser recolhida pela Nuvem Mágica) o Dragon Ball original não deixou de se afirmar como um sucesso entre os jovens portugueses de meados da década de 90, que, sem ter gerado tanto 'merchandising' como o seu sucessor, teve ainda assim direito às inevitáveis cassettes da Prisvídeo, no caso com filmes inéditos, como foi também o caso com 'Z'.

Uma das OVAs do Dragon Ball original lançadas pela Prisvídeo, no caso a terceira, e que serve como uma excelente introdução à série.

E a verdade é que a série faz por merecer essa recepção calorosa por parte do público-alvo, tratando-se, ainda hoje, de uma excelente série animada, dirigida a espectadores mais novos, sim, mas que os trata com respeito, e que talvez até seja mais agradável de rever do que o interminável 'Z', com as suas sagas de centenas de episódios em que apenas metade é relevante e avança a história – algo muito menos frequente nesta primeira série. Assim, quem quiser mostrar aos filhos – ou simplesmente a membros da geração mais nova – o que estava 'na berra' entre os 'putos' na sua infância, pode bem começar por lhes inculcar indelevelmente na cabeça o mesmo tema que tanto 'cantarolou' no recreio naquela época já longínqua: 'Dragon Ba-all, de puro cristaaaal...'

28.07.23

NOTA: Por motivos de relevância, esta Sexta será também de cinema. Voltaremos a falar de moda na próxima semana.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

O Verão foi, e continua a ser, tradicionalmente uma 'época alta' no que toca a estreias de filmes, sobretudo 'blockbusters' e películas destinadas a um público mais jovem, tendo, inclusivamente, sido um dos dois períodos do ano, juntamente com o Natal, em que era expectável um novo lançamento por parte da Disney; e, tendo os anos 90 sido um dos períodos áureos do cinema infanto-juvenil (com a própria Disney, por exemplo, em plena 'Renascença'), não é de estranhar que os últimos dias de Julho tivessem, tanto há trinta anos como há um quarto de século, visto chegar ao nosso País filmes capazes de entusiasmar o público mais jovem, e que se tornariam clássicos nostálgicos para os hoje adultos da geração 'millennial'.

De facto, os dias 30 e 31 de Julho tanto de 1993 como de 1998 assinalaram a estreia nacional de nada menos do que três longas-metragens hoje recordadas com carinho pelos portugueses na casa dos trinta a quarenta anos, duas delas explicitamente destinadas a um público infantil, e a terceira um potencial alvo para o tradicional visionamento 'às escondidas', com amigos ou depois de os pais já terem ido para a cama.

Começando pelo 'início' – isto é, pelo filme mais antigo dos três – o dia 30 de Julho de 1993 via chegar às salas lusas 'Ferngully', filme de Don Bluth que, em Portugal, receberia o incompreensivelmente longo sub-título de 'As Aventuras de Zak e Krysta na Floresta Tropical'. Lançada no auge da era de ouro da sensibilização para a ecologia, a longa-metragem conta com uma mensagem de protecção da natureza, envolta na habitual história de um humano comum 'puxado' para um reino mágico que deve ajudar a proteger - neste caso, o das fadas protectoras da 'última floresta tropical', que se encontra ameaçada por madeireiros.

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Com o padrão de qualidade habitual de Bluth, e talentos vocais de qualidade (entre eles Robin Williams, então em estado de graça após a sua interpretação do Génio em 'Aladdin', do ano anterior, e que ainda em 1993 faria outro clássico, 'Papá Para Sempre') o filme divide, hoje em dia, opiniões, com muitos críticos a apontarem para a mensagem do filme e para o número musical do personagem de Williams, Batty - que interpreta um 'rap' bem ao estilo da década então em curso - como pontos negativos. Para quem lá esteve em 1993, no entanto - a duas semanas de completar oito anos, 'impante' e ufano por ter conseguido bilhetes para a ante-estreia – nada disso era minimamente relevante, e 'Zak e Krysta' pareceu um excelente filme; ou seja, para o público-alvo, menos preocupado com questões de detalhe, esta foi, e provavelmente continuará a ser, uma excelente forma de passar uma hora e meia com uma animação de qualidade, a qual fez sucesso suficiente para, inclusivamente, dar azo a uma sequela, esta sem qualquer repercussão em Portugal.

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Um dia após a estreia da última obra de Bluth, a 31 de Julho, chegava ao nosso País um futuro 'clássico' dos canais de filmes a cabo: 'O Último Grande Herói', uma comédia de acção que via Arnold Schwarzenegger fazer um papel bem 'meta-textual', interpretando o personagem titular, o típico herói musculado da época, que se vê a braços com um jovem espectador que, graças a um bilhete mágico, consegue entrar no filme, e se vê envolto na trama do mesmo. Os dois membros deste insólito par têm, assim, de trabalhar juntos para travar o vilão, aliando a força e armamaento de Arnie ao conhecimento sobre estereótipos e fórmulas cinematográficas do seu jovem coadjuvante.

E é, precisamente, a química entre os 'músculos de Bruxelas' e o jovem Austin O'Brien que rende os momentos mais divertidos deste filme, como aquele em que o Danny Madigan de O'Brien menciona, jocosamente, o facto de todos os números de telefone do filme começarem por 555, o indicativo tradicionalmente usado por Hollywood neste tipo de situações. Apesar de não ser uma obra-prima intemporal (o único filme de Arnie qualificado para essa categoria continua a ser 'O Predador') trata-se de uma longa-metragem bem divertida, que doseia bem o humor e a acção (à maneira de antecessores como 'O Caça-Polícias' e de sucessores como 'Hora de Ponta'), sabe explorar a veia cómica de Schwarzenegger, e conta com uma banda sonora à altura, povoada por nomes como AC/DC, Alice in Chains, Def Leppard, Queensryche, Aerosmith, Anthrax ou Cypress Hill, entre outros.

Exactos cinco anos após a literal explosão de Arnie nos cinemas nacionais, estreava em Portugal outro filme teoricamente para um público mais 'maduro', mas que muitas crianças terão, decerto, visto em anos subsequentes, no contexto do 'home video' – aqui, por exemplo, viu-se aos cerca de treze ou catorze anos, na noite de cinema da colónia de férias.

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Falamos de 'O Enigma do Horizonte' (no original, 'Event Horizon') um excelente filme de ficção científica encabeçado por Laurence Fishburne (em 'ensaios' para 'Matrix', dois anos depois), Sam Neill e Jason Isaacs e realizado pelo hoje conceituado Paul W. S. Anderson. Com uma história algo semelhante à de 'Alien – O Oitavo Passageiro' (em que uma equipa de salvamento espacial fica presa numa nave abandonada, à mercê de uma força sinistra) o filme é notável, sobretudo, pelos efeitos especiais, de entre os quais se destaca o 'rio' de sangue a descer um dos corredores da nave – imagem que deixou boquiaberto aquele adolescente de finais do Segundo Milénio, sentado em colchões no chão da sala principal de uma colónia de férias presencial na Margem Sul do Tejo. Mesmo para um público mais adulto e exigente, no entanto, este filme continua a ser uma boa proposta para uma noite mais escura e chuvosa, de preferência em boa companhia...

Em suma: em apenas dois dias de dois anos distintos, o público infanto-juvenil português viu surgirem nas telas nacionais três excelentes filmes (mais ou menos) apropriados à sua faixa etária, e que ainda hoje são conceituados dentro dos seus respectivos estilos – uma coincidência, sem dúvida, digna de nota nas páginas deste 'nosso' Portugal Anos 90, numa altura em que se assinalam aniversários marcantes sobre as estreias de todos os três.

05.06.23

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

Todas as gerações nascidas ou crescidas após o advento da televisão têm os seus programas míticos, religiosamente seguidas por toda uma demografia, pelo menos até a mesma se tornar demasiado madura para os referidos conteúdos. A geração crescida em Portugal em finais do século XX não é, de todo, excepção a esta regra, sendo longa e evidente a lista de séries e programas que se inserem nesta categoria, da 'Rua Sésamo' às 'Tartarugas Ninja' e 'Moto-Ratos de Marte', de 'Power Rangers' a 'Pokémon', das 'Navegantes da Lua' ao 'Samurai X' e de 'Dartacão' a 'Inspector Gadget' ou ao inevitável 'Dragon Ball Z', talvez o programa mais consensual e agregador entre a juventude lusa da altura.

No entanto, a par destes ícones da memória nostálgica, as décadas de 80, 90 e 2000 foram, também, pródigas em séries mais 'de culto', saudosamente lembradas por quem a elas assistiu, mas não necessariamente tão omnipresentes na cultura popular infanto-juvenil da época como os nomes supracitados. Fazem parte desta categoria programas como 'As Aventuras do Bocas', 'Artur', 'Os Cavaleiros do Zodíaco', 'Esquadrão Águia', 'Alvin e os Esquilos', 'A Carrinha Mágica' e a série abordada neste post, apenas recentemente recuperada do esquecimento por quem dela tem gratas memórias.

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Falamos de 'O Panda Tao-Tao', ou apenas 'Tao-Tao', uma produção nipo-germânica (apesar de ambientada na China, e relativa á cultura daquele país) sem grandes pretensões à imortalidade, mas produzida com evidente cuidado (tanto a nível da escrita como da animação) e que, como tal, se afirmou, enquanto esteve no ar, como um dos programas infantis de maior qualidade na grelha de programação da RTP de finais da década de 80 e inícios da seguinte.

Com as florestas de bambu da China como pano de fundo, a série propõe uma premissa tão simples quanto cativante: cada episódio começa com o personagem titular e os seus amigos (com destaque para o irrequieto e irreverente macaco Kiki) a encontrarem, no decurso das suas brincadeiras diárias, algum tipo de problema ou catalista, prontamente aproveitado pela Mãe Panda, progenitora de Tao-Tao, como pretexto para partilhar a história da semana, cujos protagonistas são, invariavelmente, animais antropomorfizados - ou não fosse o sub-título da série 'Histórias de Animais de Todo o Mundo' – e que tem, normalmente, como lição de moral algo relacionado ao problema encontrado pelas crias. No final, com o problema ou objecto de controvérsia sanado, todos voltam à brincadeira anterior – pelo menos até ao episódio seguinte, em que o ciclo recomeça.

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Tao-Tao e o inseparável amigo Kiki

Esta abordagem nem totalmente lúdica nem totalmente educativa é, aliás, um dos pontos fortes de 'Tao-Tao'. Apesar de o foco de cada episódio ser declaradamente a história narrada pela Mãe Panda (normalmente retirada ou baseada no folclore das mais diversas partes do Mundo) a moldura narrativa não é, em momento algum descurada; pelo contrário, Tao-Tao, Kiki e a Mãe Panda são personagens por demais memoráveis (com todo o mérito para a dobragem, uma das primeiras a ficar a cargo da própria RTP), que incentivam à reentrada no seu 'mundo', ainda que apenas por breves instantes antes e após a história central – uma característica extremamente importante em programas desta índole, e que 'Tao-Tao' partilha, por exemplo, com a supracitada 'Rua Sésamo'. O genérico absolutamente épico e totalmente inesquecível é, assim, apenas a cereja no topo daquele que é já, só por si, um 'bolo' de alta qualidade, e que merecia ser mais conhecido e lembrado no âmbito da programação infantil daquele tempo.

Quem sabe, sabe.

A razão para o estatuto de culto desta série junto da demografia 'Millennial' é, aliás, um caso de estudo, já que 'Tao-Tao' gozou de exposição não só à época da sua transmissão (tendo, aliás, sido exibida três vezes distintas entre 1988 e 1990) mas também em anos subsequentes, quando a inevitável Prisvídeo 'desenterrou do baú' os episódios e os lançou no não menos inevitável formato VHS de 'banca de jornal', colados às icónicas cartolinas e com reproduções 'mais ou menos' fiéis dos personagens nas capas.

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Capa de um dos VHS da Prisvídeo.

Previsivelmente, no entanto, essa edição apenas interessou mesmo a quem já convivera com Tao-Tao, Kiki e a Mãe Panda alguns anos antes, tendo a demografia então na idade certa passado totalmente 'ao lado' de uma série cujo conceito diferia bastante da habitual acção e aventura, podendo estar precisamente aí a razão para não ser mais conhecida. Uma pena, já que, conforme referimos, se trata de um dos melhores programas infantis da televisão portuguesa de finais dos anos 80 e inícios dos 90.

 

22.05.23

NOTA: Este 'post' é dedicado ao leitor e colega 'bloguista' Pedro Serra, que deixou a sugestão nos nossos comentários.

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

Embora, hoje em dia, seja conhecida como uma televisão de índole popular (senão mesmo 'popularucha') aquando do seu surgimento há quase exactos trinta anos, a TVI posicionava-se como algo diametralmente oposto: um canal 'bem-comportado', ao estilo RTP2, com uma programação pouco controversa e focada, sobretudo, em conteúdos de índole mais cultural, didáctica e religiosa – ou não fosse a estação de Queluz directamente financiada, em parte, pela Igreja Católica. Naturalmente, esta abordagem estendia-se, também, à programação infantil da emissora, bastando comparar a proposta infanto-juvenil da 'Quatro' nessa primeira fase, 'A Casa do Tio Carlos', com o 'Buereré' da rival SIC para se perceber a diferença de estilos - um paradigma que se manteria, aliás, durante alguns anos, até à chegada de 'Batatoon', esse sim, um concorrente directo ao programa de Ediberto Lima e Ana Malhoa.

De facto, é difícil imaginar a SIC, mesmo a daqueles primeiros tempos, a transmitir algo tão declaradamente pouco laico como 'No Princípio: As Histórias Mais Bonitas', série transmitida pelo quarto canal em 1994 e cuja proposta passava por recontar as histórias do Velho Testamento num formato passível de agradar ao público-alvo – no caso, a animação japonesa, ou 'anime'. Anos antes de 'Zorro', 'Cinderela', 'Robin dos Bosques' e do ex-libris 'Samurai X' – e anos antes de a concorrente de Carnaxide trazer 'Dragon Ball Z' para Portugal e iniciar a maior febre de recreio do século XX no nosso país – já a emissora de Queluz dava os primeiros passos pelo Mundo dos personagens de olhos grandes, embora, novamente, por meio de uma série que os professores de Catequese podiam mostrar aos alunos como complemento educativo, e que contrastava abertamente com os conteúdos comercializantes e voltados à acção exibidos pelas outras televisões.

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Da autoria do mestre Ozamu Tezuka – lenda da primeira 'era' do 'anime', mais conhecido por ter criado os personagens de Astro Boy e Leo, o leão branco, cuja série chegou a passar na RTP e se diz ter inspirado fortemente 'O Rei Leão', da Disney – a série teve co-produção italiana (como acontecia, aliás, com tantas outras no mesmo período) e estreou originalmente em 1991; a Portugal, chegaria apenas três anos mais tarde, em versão dobrada, pela mão da recém-nascida estação independente de Queluz (que a viria, aliás, a repetir dentro de outros três anos, em 1997) tendo mais tarde sido editada, na íntegra, em VHS, pela distribuidora Ediclube, no habitual formato 'um episódio por cassette' que 'estourava' com as finanças de quem procurasse completar a colecção na íntegra – apesar de, neste caso, essa abordagem ser mais justificada do que é habitual, dado cada um dos vinte e seis episódios focar uma história bíblica distinta, podendo a junção de dois ou mais episódios numa só cassette diluir o impacto individual das mesmas.

Independentemente do formato, no entanto, a verdade é que a série chegou a marcar quem a ela assistiu naqueles anos longínquos de infância, possuindo qualidade suficiente para 'converter' até mesmo quem não tinha grande interesse em religião, ou simplesmente não era Católico. Infelizmente, a versão portuguesa transmitida pela TVI encontra-se, hoje, Esquecida Pela Net, encontrando-se os episódios disponíveis no YouTube dobrados em brasileiro ou espanhol; ainda assim, para quem tiver curiosidade ou simplesmente quiser reviver (parcialmente) as manhãs da infância, fica a 'dica...'

08.05.23

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

O genérico inicial é um dos mais importantes factores de qualquer série de ficção, independentemente do seu público-alvo, pelo seu papel fulcral como primeiro factor de atracção de potenciais espectadores; quando o conteúdo em causa é dirigido a um público infanto-juvenil (uma demografia conhecida pela volatilidade dos seus níveis de atracção e interesse) tal papel reveste-se de ainda maior preponderância, fazendo com que a maioria das séries deste tipo ponham especial esmero nas suas sequências de abertura.

No entanto, ainda que esta missão seja, regra geral, bem sucedida, apenas um número muito restrito de programas conseguem criar genéricos verdadeiramente memoráveis, daqueles que continuam a 'ressoar' nas cavidades cranianas de toda uma geração anos, ou mesmo décadas, depois de terem deixado de servir a sua função original. A série que abordamos hoje faz parte desse lote restrito, merecendo ombrear com programas como 'Pokémon', 'Artur', 'Power Rangers', 'Tartarugas Ninja', 'Dragon Ball' e 'Dragon Ball Z', 'Digimon', 'Onde Está o Wally?', 'Dartacão', 'As Aventuras do Bocas' ou 'As Novas Aventuras Disney' no panteão dos temas mais 'pegajosos' e memoráveis da televisão portuguesa.

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Falamos de 'Inspector Engenhocas', mais conhecida como 'Inspector Gadget', o desenho animado sobre um agente especial da Interpol com inúmeros recursos mecânicos secretos – as suas 'engenhocas' homónimas – escondidas no chapéu e casaco, às quais podia aceder a qualquer momento através da icónica frase-chave 'go, go, gadget', algo como 'activar engenhoca' em Português. A acompanhá-lo nas suas missões contra o malvado Dr. Claw – e, muitas vezes, a corrigir os frequentes erros resultantes da sua personalidade algo atrapalhada – estavam sempre a sua sobrinha, Sofia (ou Penny), e o cão desta última, Finório (ou Brain) uma daquelas criaturas dotadas de inteligência humana bem típicas dos desenhos animados desta época.

Apesar dos inúmeros factres memoráveis dos episódios em si, no entanto – de 'go, go, gadget' à inevitável proclamação do Dr. Claw de que venceria 'da próxima vez, Engenhocas...da próxima vez' – não há dúvida de que o verdadeiro elemento que rendeu à série 'morada' perpétua no cérebro de toda uma geração de crianças ao redor do Mundo foi o seu genérico, que consegue a proeza de não só se integrar perfeitamente no espírito e ambiente do programa, como também se recusar a alguma vez abandonar as sinapses de quem alguma vez a ouviu; de facto, a reacção mais normal de um ex-'puto' noventista ao ver sequer uma imagem dos personagens da série será a de começar imediatamente a trautear o icónico tema - se com ou sem letra, dependerá da versão com que cresceu...

As duas aberturas da série, de 1990 e 1994, respectivamente.

Ao contrário do que por vezes acontece, no entanto, no caso do 'Inspector Engenhocas' há 'vida' para lá do genérico, tendo a própria série qualidade suficiente para cativar não só quem a viu durante a primeira passagem na RTP, em 1990 (com inexplicável mas também icónica dobragem francesa) como quem a conheceu alguns anos mais tarde, já em versão portuguesa, por intermédio da SIC ou do Canal Panda, ou até quem apenas se inteirou da existência do personagem através das duas adaptações (fraquinhas) com actores de 'carne e osso' lançadas pela Disney em 1999 e 2003 -- que paulatinamente aqui terão a nossa atenção - ou mesmo do inevitável 'remake' em CGI lançado em 2015. Por agora, ficamo-nos pela recordação da muito mais icónica série animada produzida em parceria entre a França, EUA e Canadá, e que pôs toda uma geração a cantar 'du-dudu-dudu, Ins-pec-tor Gad-get...' até aos dias de hoje – prova cabal do impacto que um genérico de abertura verdadeiramente memorável pode ter na longevidade nostálgica de um programa de televisão.

28.03.23

NOTA: Este 'post' é correspondente a Segunda-feira, 27 de Março de 2023.

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

Apesar de ser a fonte de muita da iconografia mais apelativa para o público mais jovem, como flores e passarinhos, a Primavera encontra-se, ainda assim, sub-representada no campo da animação; apesar de muitos desenhos animados adoptarem a estética de campos verdejantes e paisagens idílicas, apenas um número muito reduzido se dá ao trabalho de localizar a acção especificamente nesta estação. No entanto, os anos 80 e a primeira metade da década seguinte viram, talvez, o maior influxo de produtividade neste capítulo em particular, pelo que – numa altura em que se celebra a chegada da estação das flores – nada melhor do que recordar algumas das mais marcantes.

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E nada mais certo do que começar por aquela que foi uma das séries mais acarinhadas por uma dada geração de portugueses, que a chegou a ver três vezes no espaço de uma década, tendo a mesma ido ao ar originalmente em 1985, na RTP1, e repetido depois em 1988, novamente na '1', e 1994, no bloco 'Um-Dó-Li-Tá', na RTP2. Falamos de 'Fábulas da Floresta Verde', um daqueles 'animes' da fase clássica da indústria (é, originalmente, de 1973) cujo nome não deixa grande lugar a dúvidas quanto ao seu tema; mais curioso é perceber que a série tem como base uma série de contos escritos pelo mesmo autor das populares histórias de 'Pedro Coelho' (Peter Rabbit), que chegaram a inspirar dois filmes de acção real, já no Novo Milénio.

Com temática e estilo semelhantes aos também mega-populares 'Bana e Flapi', trata-se, no entanto, de uma série distinta, que segue as aventuras de duas marmotas, Rocky e Polly, no seu dia-a-dia na Floresta do título, com tudo o que isso implica – incluindo ataques por parte de predadores bastante realistas, como raposas, doninhas e, claro, seres humanos. Com um genérico memorável e uma atitude despretensiosa, é fácil de perceber o porquê de esta série ter sido grande favorita entre as crianças da época.

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Outra série que focava especificamente a Primavera era 'As Ervilhinhas de Poddington', uma série britânica que seguia o então popular 'formato Estrumpfes' e o adaptava quase directamente a outro meio – neste caso, uma plantação de ervilhas, habitada por todos os habituais estereótipos, incluindo uma única personagem feminina (denominada Ervilha de Cheiro e que, claro, é loira, ao melhor estilo Estrumpfina.) Com apenas treze episódios, a série destacou-se, aquando da sua passagem por Portugal – em 1992, na RTP1 - sobretudo pelo contagiante genérico, sendo, de resto, apenas mais uma série infantil dentro da média da época em que foi criada.

O contagiante genérico da série

Por último, mas não menos merecedora de destaque, vem a série 'A Família Silvestre', transmitida pela RTP e baseada na linha de brinquedos do mesmo nome lançada pela Tomy em finais dos anos 80, e que, em Portugal, era distribuída pela inevitável Concentra. Curiosamente, o conceito do desenho animado pouco tinha a ver com a linha original, adoptando um formato mais próximo ao dos populares 'Ursinhos Carinhosos', em que a titular Família Silvestre e restantes habitantes da floresta mágica, que o ajudam a resolver o seu problema enquanto tentam derrotar os vilões de serviço. Pela sinopse, já deu para ver que se trata, apenas e tão-sómente, de 'mais uma' série destinada a promover uma linha de brinquedos, sem nada que a distinga de congéneres mais famosas como os referidos 'Ursinhos Carinhosos' ou ainda os Pequenos Póneis.

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É pena, pois, que a estação que tantas crianças fascinou e inspirou ao longo das gerações não tenha ainda tido um representante condigno no mundo da animação; ainda assim, vale a pena recordar os poucos exemplos de séries da 'era de Ouro' que faziam uso da estação nas suas tramas, ou simplesmente no Mundo que criavam.

24.01.23

Porque nem só de séries se fazia o quotidiano televisivo das crianças portuguesas nos anos 90, em terças alternadas, este blog dá destaque a alguns dos outros programas que fizeram história durante aquela década.

Os anos 90 constituíram uma verdadeira 'época áurea' no que tocou aos blocos de programação infantil em Portugal, tendo visto nascer alguns dos mais memoráveis exemplos deste formato da História da televisão portuguesa; do 'Buereré' da SIC à 'Casa do Tio Carlos' e, mais tarde, o 'Batatoon' e 'Mix Max' (todos na TVI) as crianças portuguesas daquela década tiveram muito por onde escolher no tocante a programas que intercalavam a exibição de desenhos animados e séries infantis com jogos, passatempos e interlúdios musicais, com animação a cargo de um ou mais apresentadores carismáticos e bem-dispostos.

No caso da RTP, o representante deste tipo de programa começou por ser 'A Hora do Lecas', passando depois a chamar-se 'Brinca Brincando' (termo que se aplicou a uma série de formatos, sendo o mais memorável 'Os Segredos do Mimix') até, em 1993, se fixar como 'Um-Dó-Li-Tá', nome pelo qual o bloco infantil da emissora estatal seria conhecido até praticamente ao final da década.

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Alternando, durante os seus cinco anos de vida, entre a RTP1 e a RTP2, o programa foi alvo de várias re-estuturações de formato, por vezes concomitantes com estas mudanças. A proposta inicial não andava longe da das concorrentes, consistindo em desenhos animados intercalados com segmentos moderados por dois apresentadores - no caso Francisco Barbosa e Vera Roquette, esta última já bem querida da 'pequenada' devido à sua associação com o 'Agora Escolha', programa onde revelara uma aptidão especial para comunicar com os mais novos.

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Vera Roquette foi a primeira apresentadora do programa. (Crédito da foto: Desenhos Animados Anos 90)

Mais tarde, em 1994, a 'apresentação' passaria a ficar a cargo de dois bonecos, o 'Umdó' e a 'Litá', duas molas com vida que, nos anos finais do programa, foram substituídos por outros dois bonecos, HumHum e Benzé, que ocupariam o 'cargo' até à extinção do formato, em 1998, num caso óbvio de discriminação contra humanos...

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As molas animadas Umdó e Litá substituiriam os apresentadores humanos a partir de 1994

O que não se alterou ao longo do tempo de vida do programa foram a duração, que se manteve nas duas horas, e a aposta em conteúdos nacionais, como 'Rua Sésamo', 'Os Amigos de Gaspar' ou 'No Tempo dos Afonsinhos', à mistura com as habituais séries estrangeiras. Um formato perfeitamente 'seguro', sem grandes inovações, e sem a agitação frenética dos concorrentes directos (aproximava-se mais do ambiente tranquilo de 'A Casa do Tio Carlos' do que do 'espalhafato' de Ana Malhoa ou Batatinha) mas perfeitamente capaz de lhes fazer frente, até por dispôr de alguns bons argumentos a nível de séries e programas – e, como tal, bem digno de homenagem num ano em que se comemoram, simultaneamente, os trinta anos da sua estreia e os vinte e cinco da sua última emissão...

Dois excertos de eras diferentes do programa.

 

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