Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

06.03.23

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

Apesar de não ter, de longe, tanta expressão como a vizinha Espanha e os outros 'enclaves' mediterrânicos, como a Itália e a Grécia, Portugal não deixa, ainda assim, de ter uma cena hard rock e heavy metal bastante saudável, com várias bandas a conseguirem ganhar reconhecimento a nível nacional ao longo dos anos, e mais do que uma publicação especializada a gozar de alguma longevidade. Ainda assim, a triste verdade é que, destas, são mesmo muito poucas as que chegam a gozar de algum sucesso ao nível do 'mainstream', sendo pouco provável que o fã médio de música radiofónica (mesmo que com inclinações mais 'rock') seja capaz de nomear mais do que dois ou três nomes nesta categoria. Destes, o primeiro será inevitavelmente o dos Moonspell, expoente máximo do metal português, e talvez a única banda pesada verdadeiramente bem-sucedida a alguma vez sair do nosso país; logo atrás dos 'mestres' liderados por Fernando Ribeiro virão talvez, no entanto, nomes como os dos Tarantula – veterana banda de metal clássico do Porto, no activo há quase quatro décadas – e o da banda visada nesta Segunda de Sucessos, os lisboetas R.A.M.P.

29129_1448001716147_1116316092_31329243_7374366_n.

Caso paradoxal da música nacional, o grupo da Margem Sul do Tejo (cujo nome é um acrónimo das iniciais dos membros fundadores) conseguiu a proeza – considerável mesmo nos dias de hoje, e ainda mais nos anos 90 - de atingir a aceitação do grande público melómano sem nunca comprometer ou 'amaciar' a sua sonoridade power/thrash/groove, muito influenciada por bandas como Pantera. Ao contrário do que acontece em tantos outros casos, as guitarras pesadas e vocalizações fortes do fundador Rui Duarte não impediam a banda de bater recordes de vendas para uma banda pesada (o segundo disco, 'Intersection', entrou nos tops nacionais em 1995) e ser convidada a marcar presença em eventos e programas de índole generalista, como o 'Buereré', no qual se afirmaram como, talvez, o convidado musical mais insólito, incongruente e inesperado da década, senão mesmo da História da televisão portuguesa. A imagem daqueles 'cabeludos' a berrar e a fazer o tradicional 'headbanging' no cenário multi-colorido do programa de Ana Malhoa, rodeados de 'bonecos' e crianças em idade de instrução primária ficou, desde esse momento, gravada na memória de toda uma geração – o que, no fundo, faz com que a presença da banda no programa possa ser considerada um sucesso...

Imaginem ligar a televisão num fim-de-semana de manhã e 'ouver' isto entre o Dragon Ball Z e os Power Rangers...

Não era só a televisão infanto-juvenil que dava um nível inusitado de atenção à banda do Seixal; também a rádio parecia gostar do colectivo liderado por Rui Duarte e Ricardo Mendonça, tendo a Rádio Comercial considerado 'For A While', uma das faixas de 'Evolution, Devolution, Revolution', o terceiro trabalho do grupo, como uma das dez melhores músicas do ano de 1998 – uma distinção meritória e difícil de atingir para muitos artistas pop, que dizer de uma banda de metal! Também radialistas como António Sérgio consideravam o grupo uma 'pedrada no charco' do rock português, tendo-se este apoio (declarado ainda por alturas do primeiro álbum do grupo, 'Thoughts', de 1992) provado determinante na ascensão da banda dentro da cena musical nacional.

'For a While', o tema considerado como um dos dez melhores de 1998 pela Rádio Comercial.

Ascensão essa que, aliás, continuaria Novo Milénio adentro, com o grupo a continuar a ser 'a' banda de abertura por excelência para grandes nomes do metal mais pesado em território nacional, e a lançar mais dois álbuns álbuns de originais, um ao vivo, e uma colectânea celebratória do quarto de século de actividade, todos bastante bem sucedidos, pesem embora algumas mudanças de formação.

Comemorada a referida marca de vinte e cinco anos de actividade, no entanto, o grupo perde proeminência, remetendo-se ao relativo silêncio (pelo menos a nível discográfico) durante quase uma década, antes de ensaiar um regresso tão inesperado quanto explosivo em 2022 – a reacção ao qual foi suficientemente entusiasta para provar que os R.A.M.P. continuavam a ser capazes de atrair os 'metaleiros' portugueses em massa, e que a reputação da banda dentro da cena se mantinha intacta, mesmo que longe do sucesso comercial de outros tempos. Quanto ao que o futuro reserva para o grupo de Rui Duarte e companhia, há que esperar para ver, mas uma coisa é certa: os R.A.M.P. merecem já o seu lugar na lista de grandes nomes da música alternativa portuguesa, não só dos anos 90 como a nível geral – uma façanha invejável para um grupo de um estilo tão pouco 'acessível' como o thrash metal...

20.02.23

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

E em pleno período de Carnaval, nada melhor do que recordar aquele que foi um dos discos de maior sucesso entre a 'criançada' portuguesa noventista, e que tinha como intérpretes uma dupla de palhaços, um dos símbolos máximos desta época do ano.

R-14864674-1583067255-9130.jpgR-14864674-1583067388-5537.jpg

Capa e alinhamento do álbum.

Falamos do primeiro dos quatro (!) álbuns alusivos ao programa infantil Batatoon, lançado em 1999, e que foi talvez o expoente máximo do 'império' comercial derivado daquele que foi, também, um dos maiores sucessos da década junto do público-alvo, cuja licença se estendia ainda a uma revista e a um sem-número de produtos com as caras dos apresentadores Batatinha e Companhia; no entanto, era mesmo o CD ou cassette que os pequenos fãs do programa mais procuravam, tendo-se este álbum rapidamente tornado um êxito, não só em termos de vendas, mas também de popularidade entre a demografia em causa.

As razões para tal estatuto eram simples, e estavam ligadas ao facto de, ao contrário de outros álbuns infantis licenciados do mesmo período, como o d''Os Patinhos', este lançamento consistir, não apenas de duas ou três faixas 'licenciadas' – neste caso, os dois temas-título e a música dos 'Parabéns', as músicas mais populares do programa - rodeadas de versões de cantigas do domínio público; em vez disso, o restante alinhamento consistia de músicas verdadeiramente ouvidas no contexto do programa da TVI, aproximando assim o disco de algo como 'As Canções do Lecas' ou dos álbuns do Buereré ou da Arca de Noé, que se podem considerar seus precursores directos

O que muitas das crianças que vibravam ao som de 'Croc Croc' ou 'O Cãozinho Entra na Roda' certamente não saberiam à época era que estas mesmas músicas eram adaptações quase directas do repertório da famosa Xuxa, lenda viva dos programas infantis brasileiros, ou de outros conjuntos infantis daquele país, como o Trem da Alegria, com apenas muito ligeiros ajustes de linguagem para os trazer do Português do Brasil para o europeu, reduzindo assim a necessidade de compôr e gravar temas originais...

Comparação entre a versão original brasileira de 'Croc Croc' e a adaptação portuguesa incluída no álbum.

Mérito, ainda assim, para os dois intérpretes, que conseguiram não só 'trazer' estas músicas para o outro lado do Oceano Atlântico, mas também torná-las sucessos junto de um público infantil algo diferente do do brasileiro – até porque muitos destes temas tinham já mais de uma década de existência quando 'aterraram' na Península Ibérica pela mão dos dois palhaços. E apesar de muitas das crianças que corriam às prateleiras das lojas de discos ou supermercados para adquirir o CD só quererem ouvir o 'Ba Bata Batatoon' ou o tema de abertura, a verdade é que Batatinha e Companhia (ou os seus produtores) ofereciam um produto mais cuidado e completo do que a média, fazendo com que o dinheiro investido neste álbum ou nos seus sucessores directos se pudesse considerar bem gasto.

 

25.10.22

A década de 90 viu surgirem e popularizarem-se algumas das mais mirabolantes inovações tecnológicas da segunda metade do século XX, muitas das quais foram aplicadas a jogos e brinquedos. Às terças, o Portugal Anos 90 recorda algumas das mais memoráveis a aterrar em terras lusitanas.

Já por várias vezes nos debruçámos sobre o papel do 'merchandising' – oficial ou pirata – como métrica para avaliar o sucesso de qualquer propriedade intelectual; e, embora em menor escala, a verdade é que as propriedades educativas verdadeiramente populares também não constituem excepção a esta regra, bastando lembrar que a saudosa 'Rua Sésamo' (bastião máximo desse tipo de conteúdo em Portugal) teve direito não só a uma revista homónima como também a uma extensa série de livros (adaptados de originais americanos), diversos artigos de vestuário, e até uma série de lançamentos discográficos com as músicas da versão portuguesa, dos quais aqui paulatinamente falaremos. Apesar de o referido programa ter sido o expoente máximo do fenómeno acima descrito, no entanto, não foi, de modo algum, exemplo único, sendo que o 'segundo classificado' na categoria do 'edutenimento' televisivo por terras lusas viu também ser lançada uma série de produtos interactivos a si alusivos.

Falamos d''A Carrinha Mágica', tema da nossa última Segunda de Séries, e que, ao mesmo tempo que conquistava crianças um pouco por todo o Mundo com a sua proposta televisiva diferenciada, via também serem produzidos jogos interactivos para computador alusivos aos seus principais episódios.

kfhfhsx3zkmkzfljrqoy.jpg

O primeiro dos oito títulos alusivos à série lançados para PC, editado em 1995

Da responsabilidade da Microsoft, que criou toda uma linha expressamente para esse propósito (intitulada Microsoft Home) a série de oito CD-ROM teve início em 1995, com um título baseado no episódio sobre o sistema solar, e prolongou-se até 1999, data do último lançamento, que tinha por tema a fauna; pelo meio, ficavam títulos dedicados aos outros principais temas explorados na série, como o corpo humano, os oceanos, a crosta terrestre, os dinossauros, a floresta tropical ou os insectos. Comum a todos estes lançamentos era o formato, que permitia ao utilizador 'guiar' ele mesmo a Carrinha Mágica como parte do interface principal, e sugeria uma mistura de 'point-and-click' e mini-jogos, bem típica dos títulos educativos da época.

Não seriam, no entanto, apenas os PC's a receber versões digitalizadas de Frisadinha e companhia, tendo a Sega assegurado os direitos de lançamento para duas das suas plataformas – o computador educativo Pico, de pouca ou nenhuma expressão em Portugal, e a infinitamente mais famosa Mega Drive, que recebia o seu próprio título alusivo à série em 1995. Previsivelmente, neste caso, o foco principal era na perícia e nas secções de plataformas, elemento quase obrigatório de qualquer jogo licenciado para as consolas da época, passando o objectivo do jogo por conduzir a Carrinha Mágica até vários planetas para tentar localizar a 'despistada' Frisadinha, cujos ímpetos a haviam separado dos alunos. Um título menor na vasta biblioteca de uma das consolas mais famosas dos anos 90, mas que certamente terá agradado aos muitos fãs da série à época.

413419-scholastic-s-the-magic-school-bus-space-exp

O jogo para Mega Drive punha maior ênfase na acção do que na vertente educativa

Ainda no dealbar do Terceiro Milénio, haveria ainda tempo para um regresso da franquia aos PC's, através de uma série de 'estúdios de actividades' – um conceito em alta à época, muito por 'culpa' dos excelentes títulos deste tipo lançados pela Disney Interactive, e alusivos aos filmes da companhia do Rato Mickey. No total, seriam cinco os lançamentos deste tipo com chancela Carrinha Mágica, todos lançados entre 2000 e 2001 e, como os jogos propriamente ditos, tematizados a um tema concreto, que neste caso podia ir da música aos mamíferos aquáticos, passando pelo vôo, pelos dinossauros e pelo planeta Marte.

fc75dcc7-2055-499e-a010-10c30c74939b.jpg

Exemplo do interface dos 'Centros de Actividades' lançados para PC

Ainda que se concluam aqui os lançamentos da fase 'clássica' da carrinha, no entanto, haveria ainda lugar, cerca de uma década após os mesmos, a dois novos títulos para as plataformas móveis, bem como a um para a Nintendo DS, todos fiéis ao conceito dos seus antecessores; embora estes títulos sejam, sem dúvida, a referência para a nova geração, no entanto, para os seus pais, os verdadeiros jogos d''A Carrinha Mágica' serão sempre aqueles oito títulos da Microsoft, que, a brincar, lhes ensinaram factos importantes sobre uma enorme variedade de temas...

17.10.22

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

A 'explosão' dos movimentos alternativo e pop-rock nacionais durante a década de 90 contribuiu para o aparecimento e desenvolvimento de um sem-número de novas bandas, a maioria das quais pouco ou nada ficava a dever às suas congéneres estrangeiras, conseguindo, com a sua qualidade, contornar as limitações técnicas e de recursos inerentes a gravar um disco em Portugal. Tal como acontece em qualquer movimento, no entanto, nem todos estes nomes chegaram a experienciar as 'luzes da ribalta', tendo alguns, inevitavelmente, ficado 'pelo caminho' na corrida à fama e aos contratos discográficos.

download.jpg

Uma destas bandas foram os SG's, quarteto cascalense que, durante um breve período em meados dos anos 90, chegou a ser o mais próximo que Portugal tinha a uns Nirvana, compondo, ao lado dos 'Pearl Jam' Blind Zero e dos 'Alice in Chains' Lulu Blind, o grande triumvirato do 'grunge' nacional na altura em que o referido estilo atravessava a sua fase de maior popularidade. No entanto, dos três nomes, o colectivo liderado por Hugo Van Zeller seria o que maior dificuldade teria em encontrar sucesso radiofónico, acabando a sua contribuição para o panorama do rock pesado nacional por se saldar em um par de aparições na icónica colecção de CD's single da revista Super Jovem (ambos, curiosamente, partilhados com os 'death metallers' Disaffected, os únicos outros 'repetentes' da colecção), um single, e um único álbum, 'Psycho Holidays', lançado pouco mais de um ano após a formação do grupo, em 1995.

download (1).jpg

download (2).jpg

download (3).jpg

R-6591186-1422671228-9511.jpg

A totalidade da discografia do quarteto 

A verdade, no entanto, é que é difícil de perceber exactamente porque é que a carreira de Van Zeller, Rodas, Johnny Barros e Gonzo ficou tão aquém das expectativas. Isto porque, sem ser uma obra-prima da música moderna, 'Psycho Holidays' não deixa, ainda assim, de ser um excelente álbum de rock 'barulhento' moderno, talvez com umas quantas músicas a mais (dezasseis temas de estúdio mais um ao vivo, espalhados ao longo de quase uma hora de música, é, manifestamente, muito para um álbum deste tipo) mas repleto de 'malhas' inegáveis como a inaugural 'Save Me' ou os temas com que o quarteto se deu a conhecer na Super Jovem, 'I Am' e 'Misunderstanding', esta última mas compassada, melódica, e com forte 'travo' a Pearl Jam. De facto, exceptuando-se o inglês algo 'macarrónico' de algumas das letras e a produção expectavelmente limitada, este é daqueles discos que poderia perfeitamente ter sido comercializado a nível internacional, e encontrado o seu lugar no 'pelotão' de bandas de 'grunge' secundárias que perseguiam, de longe, os 'quatro grandes' do estilo.

download (4).jpg

O vocalista e líder da banda, Hugo Van Zeller, é hoje consultor de desenvolvimento pessoal

Não seria, no entanto, isso que se viria a passar, e o destino fadaria os SG's a uma carreira curta, que teria fim (pelo menos em termos de registos discográficos) pouco depois do lançamento do álbum, constituindo apenas mais uma daquelas sempre deprimentes) histórias sobre 'o que podia ter sido', tão comuns no mundo da música. Ainda assim, e a julgar pela sua actual presença como consultor e 'coach' de desenvolvimento pessoal, Hugo Van Zeller foi capaz de 'dar a volta por cima' deste desapontamento e atingir sucesso noutra área; e mesmo que o disco que lançou com os amigos no tempo da juventude seja, para ele, apenas um artefacto levemente embaraçoso de um tempo passado, para muitos fãs de música alternativa lusitanos (tanto da época como dos dias que correm), o mesmo continua, certamente, a constituir um dos melhores exemplos de rock 'barulhento' 'made in Portugal'....

19.09.22

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

Qualquer melómano que tente fazer uma lista dos melhores e mais importantes álbuns de música portuguesa dos anos 90 certamente se deparará com alguns nomes incontornáveis. De provas de vida por parte de artistas veteranos ('Rock In Rio Douro', dos GNR, ou 'Pedras da Calçada', de Paulo Gonzo) ou supergrupos (o álbum homónimo dos Rio Grande) até declarações de intenções por 'novatos' decorrentes do 'boom' do pop-rock nacional daquela década (os primeiros discos de Da Weasel ou Santos e Pecadores, 'LusoQUALQUERcoisa' dos Clã, 'Vinyl' de The Gift, ou 'Silence Becomes It', do fenómeno Silence 4), é longa a lista de clássicos produzidos por artistas e grupos portugueses durante a referida década, e que continuam a reter a sua influência e relevância três décadas depois.

Da referida lista, especificamente do lado do 'sangue novo', faz ainda parte um álbum que celebrou há poucos dias (a 15 de Setembro de 2022) o vigésimo-quinto aniversário do seu lançamento, e que ajudou a apresentar ao mundo fonográfico português um novo nome, pronto a conquistar as ondas de rádio mais 'alternativas': 'Cão!', dos Ornatos Violeta.

Cão.gif

Capa do álbum de estreia do quarteto portuense.

O primeiro de apenas dois álbuns de originais lançados pela banda portuense (o terceiro é uma colectânea de inéditos e raridades), o disco foi, ainda assim, suficiente para fazer da banda portuense uma referência da música portuguesa até aos dias de hoje, o que atesta bem quanto à sua qualidade.

Formados no Porto nos primeiros anos da década, os Ornatos Violeta (ou simplesmente Ornatos) fariam jus à máxima de que 'se tem a vida toda para criar o trabalho de estreia', optando por lançar o trabalho de estreia apenas após ter a certeza de que a 'máquina' se encontrava bem 'oleada' no circuito de concertos e 'demos'; e o mínimo que se pode dizer é que esse esforço foi mais do que recompensado, com 'Cão!' a cair, quase de imediato, no 'gosto' da crítica especializada, que lhe teceu rasgados elogios não só à época, mas ao longo das décadas seguintes (ainda em 2009, a referência especializada Blitz o colocava no Top 5 de álbuns alguma vez criados por artistas portugueses, bem como na lista de melhores trabalhos oriundos da zona do Porto). Apresentando uma mistura de funk, jazz e ska, o álbum rendeu singles tão conhecidos e bem-sucedidos como 'Punk Moda Funk' (talvez o mais emblemático título dos portuenses, e música de abertura do álbum), 'A Dama do Sinal' e 'Mata-me Outra Vez', todos os quais tiveram considerável 'rodagem' nas rádios nacionais da altura.

Escusado será, também, dizer que o grupo não hesitou em aproveitar o 'embalo' dado por tão auspiciosa estreia, tendo o sucessor de 'Cão!' surgido pouco mais de dois anos após o lançamento deste, em Novembro de 1999; e a verdade é que, embora menos emblemático que o trabalho de estreia 'O Monstro Precisa de Amigos' é, também ele, um trabalho muito bem cotado tanto entre fãs da cena alternativa portuguesa como junto da imprensa especializada.

O_Monstro_Precisa_de_Amigos_(Ornatos_Violeta_album

Capa do segundo (e último) álbum do grupo, lançado em 1999

Apesar do processo de criação atribulado, o álbum representa uma bem-sucedida evolução do som estabelecido no trabalho de estreia, o qual se apresenta agora mais ponderado e sofisticado, que voltou a valer aos Ornatos reconhecimento generalizado, com a banda a conquistar diversas categorias na última edição do milénio dos prémios Blitz (incluindo a de Álbum do Ano) e o disco em si a ser considerado, ainda hoje, como um dos mais importantes álbuns portugueses dos últimos trinta anos.

Em meio a tal sucesso e adulação, seria normal que a carreira dos Ornatos seguisse de vento em popa; foi, no entanto, precisamente o contrário que se verificou, com a banda a anunciar abruptamente a sua separação quando ainda se encontrava no auge da carreira, em 2002; e a verdade é que, à parte o referido álbum póstumo de 'lados B' de raridades e algumas reuniões esporádicas na última década, esse foi mesmo o 'Fim da Canção' para Manel Cruz, Elísio Donas, Nuno Prata, Peixe e Kinorm, cujo legado acabou, assim, por se ficar apenas por aqueles dois álbuns revolucionários que 'abanaram' a cena portuguesa de finais de milénio. Um típico caso, portanto, de banda que se extingue após ter dado ao Mundo apenas um 'cheirinho' da sua arte, estatuto que o colectivo portuense partilha, na mesma década, com os supramencionados Silence 4; ainda assim, a obra dos Ornatos afirmou-se como (ainda) mais duradoura e influente que a de David Fonseca e seus capangas, fazendo com que, um quarto de século volvido, os dois álbuns do quinteto se afirmem ainda como de audição obrigatória para qualquer fã de música alternativa contemporânea 'made in Portugal'.

 

25.07.22

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

Quando se pensa em colectâneas disponíveis em Portugal na década de 90, os títulos que tendem, imediatamente, a vir à memória são, sobretudo, os das lendárias séries Electricidade (da Rádio Cidade) e Now! That's What I Call Music, que – entre elas – ajudaram a moldar o gosto musical de muitos jovens da época. No entanto, estas estavam longe de ser as únicas representantes desse tipo de lançamento; pelo contrário, o mercado fonográfico português viu vários outros títulos deste tipo surgir nos escaparates ao longo dos últimos dez anos do século XX, contando-se entre as mais memoráveis 'The Beautiful Game' (a colectânea do Euro '96, de que já aqui falámos) 'Fido Apresenta Número 1' (da qual, paulatinamente, aqui falaremos) e a dupla de que falamos hoje, intitulada 'Street Sounds From Sony'.

R-2344802-1340920318-1514.jpg

R-506290-1375319029-4262.jpg

Compostos por uma ecléctica mistura de europop, pop rock, hip-hop e electrónica, os dois volumes da série foram lançados em anos consecutivos de meados da década pela fabricante japonesa - quando a mesma ainda era associada, sobretudo, a produtos áudio, e não tanto a consolas -  e incluídos, a título de oferta, na compra de um dos sistemas de som portáteis da marca, os carinhosamente apelidados 'tijolos', presumivelmente como método para comprovar as capacidades reprodutivas dos mesmos - por aqui, por exemplo, recebeu-se o segundo volume, de 1995, ano em que surgiu lá por casa o primeiro destes aparelhos. Assim, quem adquirisse uma 'boombox' da marca não só passava a ser dono de uma excelente 'fábrica de produção de mixtapes' como de uma espécie de 'mixtape oficial', seleccionada e curada pela própria Sony Europa (a compilação é de origem holandesa), o que não deixava de ser um atractivo de peso no momento da decisão sobre que fabricante escolher, independentemente de se ser ou não fã dos artistas incluídos.

E por falar nestes, os mesmos serviam de exemplo quanto à diversidade do catálogo do braço editorial da companhia à época, incluindo nomes tão díspares como Cypress Hill, Alice in Chains, Meatloaf ou uma Celine Dion pré-fama interplanetária (no primeiro volume) e Bad English, The Jacksons, Toto, Cyndi Lauper ou Apollo 440 (no segundo); curiosamente, ambos os discos incluíam ainda músicas de Culture Club e Gloria Estefan, os únicos dois 'repetentes' entre volumes. No total, eram vinte e nove faixas (catorze no primeiro volume e quinze no segundo) que só deixavam mesmo de fora os estilos mais pesados, sendo que até mesmo as lendas do 'grunge', Alice in Chains, surgiam com um dos seus temas em registo mais acústico e acessível, no caso 'No Excuses'; de resto, havia mesmo algo para todos os gostos, sendo provável que a maioria dos jovens que adquirisse um destes CD's encontrasse, pelo menos, um par de faixas que fosse do seu agrado.

Em suma, apesar de algo limitados pelo conceito e editora, estas duas colectâneas não deixavam de cumprir com louvor a sua função de apresentar a uma nova audiência alguns dos principais artistas dos respectivos anos, bem como de anos transactos – o que, associado ao seu cariz promocional e de oferta, os terá certamente tornado parte muito apreciada das colecções de CD de muitos jovens lusitanos da época. Por aqui, pelo menos numa primeira fase, era certamente esse o caso...

27.06.22

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

Hoje em dia, o conceito de uma estação de rádio é, para todos os efeitos, obsoleto; com todos os elementos que a mesma oferece – da música à informação - à distância de alguns cliques ou toques no ecrã, a única função que este tipo de órgão continua a servir é a de acompanhar motoristas solitários nas suas viagens diárias – e mesmo esse fim já vem sendo, cada vez mais, realizado por 'podcasts', 'audiobooks' e playlists do Spotify, anunciando o fim próximo da rádio como a conhecemos.

Nos anos 90, no entanto, o paradigma era significativamente diferente; a Internet era um conceito embrionário, a música era ainda obtida maioritariamente em formato físico (e, como tal, difícil de ouvir 'a pedido') e as estações de rádio mais famosas em Portugal tinham estatuto suficiente para lançar discos inteiros de músicas da sua rotação, e ter relativa certeza de que os mesmos encontravam o seu público. Foi assim com as perenes RFM e Rádio Comercial, com a meteórica e saudosa Mega FM, e – mais memoravelmente – com a Rádio Cidade, a estação luso-brasileira conhecida (e, hoje, recordada) tanto pelo seu foco no 'dance-pop' como pela lendária colecção de colectâneas de música de dança que editou na metade final da década de 90 e inícios da seguinte.

Electricidade 95 2cds.JPG

Intitulada 'Electricidade', mesmo nome do mais famoso programa da emissora, esta memorável série de álbuns foi lançada pela Vidisco a partir de 1994, a um ritmo anual, e durante quase uma década (o último registo disponível na Internet é referente à edição de 2003), tendo-se, por isso, naturalmente tornado presença assídua tanto nas prateleiras das lojas de discos como na estante de muitos jovens fãs do género. O facto de cada nova colectânea trazer, invariavelmente, as últimas novidades da música de dança do respectivo ano, com particular foco na cena 'Eurodance' (que, à época, englobava desde novos e entusiasmantes estilos oriundos do Reino Unido até 'remixes' 'foleiras' de temas clássicos feitas 'a martelo' na Alemanha) também ajudava a assegurar a compra de cada nova edição, tanto por parte da base de fãs já existente, como de outros 'curiosos' relativamente ao estilo em causa, para quem a série acabava por representar uma espécie de alternativa às não menos lendárias colectâneas 'Now!', cujo foco era mais generalista.

electricidade-95-rc3a1dio-cidade-1998.jpg

O alinhamento da edição de 95 desta colectânea

Assim, não é de estranhar que cada novo capítulo desta saga musical (sempre devidamente identificada pelo inconfundível logotipo, perceptível à distância, e pela mascote muito, muito '90s') fosse acolhido com entusiasmo pelo seu público-alvo - o qual, aliás, nem precisava de se deslocar à discoteca mais próxima para o adquirir, visto estas colectâneas serem presença frequente, também, naqueles escaparates de 'cassettes' e CD's existentes em tabacarias e bombas de gasolina pelo País fora. 

Com tão perfeita junção de oferta e procura, não é, pois, de admirar que todos os discos da série – mas particularmente as edições de 1996 e 1998 – tenham gozado de considerável sucesso, devendo-se a sua extinção, não a algum decréscimo de vendas, mas apenas à mudança de foco levada a cabo pela Rádio Cidade a partir de meados dos anos 2000; caso contrário, é de imaginar que estas colectâneas tivessem perdurado durante mais algum tempo, pelo menos até o próprio formato CD se tornar obsoleto. No entanto, talvez tenha sido melhor assim – ao 'desaparecer de cena' antes de o seu formato se esgotar ou tornar cansativo, as colectâneas Electricidade asseguraram um lugar nas memórias nostálgicas de toda uma geração que as comprou anualmente, e a quem ajudaram a definir o gosto musical...

 

 

04.06.22

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais.

Após vários anos de obsolescência lenta, mas ainda assim óbvia para quem estivesse atento, o inevitável acabou mesmo, nestes últimos anos, por acontecer: o formato CD tornou-se obsoleto. O inovador e aparentemente perene substituto do disco de vinil, símbolo máximo do amor de toda uma geração pela música (tal como o vinil o havia sido para a geração anterior) vê-se, hoje em dia, substituído a larga escala pelo ubíquo formato 'streaming', sendo já poucos os artistas que se preocupam em lançar os seus novos trabalhos em CD, optando a maioria por pô-los directamente no YouTube, iTunes e Spotify, e deixar que sejam as tournées a render os esperados dividendos.

Por muito sentido que faça nos tempos que correm, no entanto (e faz) este método continua a 'ficar atravessado na garganta' à geração que cresceu rodeada de dezenas de CDs, e para quem um sítio era, acima de todos os outros, local de romaria (no mínimo) semanal: as lojas de discos.

images.jpg

Para um melómano, esta era uma visão do paraíso - ou, pelo menos, uma garantia de uma tarde bem passada

No mínimo tão emblemáticas das décadas de 80 e 90 como os videoclubes ou os salões de jogos, as discotecas - não as da noite, de que eventualmente aqui falaremos, mas as de vendas de CDs – surgiam, em Portugal, em dois grandes tipos: por um lado, os 'franchises' - de que eram exemplo máximo a Valentim de Carvalho e a 'resistente' Fnac, e que incluíam ainda a saudosa Bimotor (ainda em actividade, acredite-se ou não!) e a Virgin Megastore, em Lisboa - e por outro as discotecas 'independentes', aqueles espaços escuros, esconsos e vagamente duvidosos encontrados quase exclusivamente em caves de centros comerciais 'manhosos'.

E enquanto as primeiras eram o local de compra de discos (e não só) por excelência para o comum cidadão português daquela era, era nas segundas que se encontrava aquele tipo muito especial de amante de música, cuja paixão se traduzia na disposição para passar várias horas a 'remexer' em literais caixotes de CDs dos mais obscuros artistas imagináveis, à procura daqueles 'tesouros' a preço reduzido, injustamente ignorados pelos restantes visitantes – e só quem passou por essa experiência sabe descrever a sensação de sair de uma qualquer discoteca 'de vão de escada' com uma pilha de discos prontos a levar para casa e descobrir, em volume máximo ou com auscultadores, na aparelhagem, 'tijolo' ou Discman.

De facto, ambos os tipos de loja eram tão populares que constituíam locais perfeitamente válidos para uma Saída de Sábado com os amigos – parte da diversão da qual consistia em tecer comentários sobre alguns dos items mais 'bizarros' encontrados nos escaparates, bem como em tirar partido das habituais 'estações de escuta' para ouvir aqueles 'hits' mostrados no Top + ou ficar a conhecer as mais recentes novidades dentro do seu estilo musical de eleição; mesmo que não se comprasse nada, era garantia de uma tarde bem passada, e sem grandes 'asneiras'.

Infelizmente, e conforme referimos no início deste texto, o actual panorama musical impossibilita completamente o ressurgimento deste tipo de lojas; as poucas que restam apoiam-se numa vertente nostálgica, e quanto ao futuro, no máximo, poderá vir a haver 'estações' centralizadas de 'download' de música, as quais serão sempre, por definição, muito mais impessoais que as antigas discotecas, sobretudo as independentes; resta, pois, à geração que cresceu a 'vasculhar' nestes estabelecimentos à procura da próxima adição à colecção musical recordar esses tempos que já não voltam, e tentar transmitir às novas gerações 'digitalizadas' o quão marcante acabava por ser cada visita e um desses espaços...

29.03.22

A década de 90 viu surgirem e popularizarem-se algumas das mais mirabolantes inovações tecnológicas da segunda metade do século XX, muitas das quais foram aplicadas a jogos e brinquedos. Às terças, o Portugal Anos 90 recorda algumas das mais memoráveis a aterrar em terras lusitanas.

Numa era da História em que as nossas músicas favoritas vão connosco para todo o lado, em quantidade quase ilimitada, e acessíveis praticamente a qualquer momento com apenas um par de toques no teclado ou ecrã do telefone, parece quase inacreditável que, há apenas uma geração atrás, essa mesma experiência implicasse periféricos extra, de dimensões consideravelmente mais volumosas, e estivesse restrita àquilo que se conseguisse armazenar num dispositivo físico, entretanto tornado obsoleto.

E no entanto – como qualquer jovem de finais do século XX saberá – era precisamente isso que se passava há não muito tempo atrás: quem queria ouvir música na rua, ou fazia uso do auto-rádio do carro, ou se via obrigado a investir num desses Santos Graais da tecnologia oitentista e noventista: um Walkman.

7a040b08e0412ed05199e8854380a149.png

O Walkman original, lançado pela Sony em meados da década de 80

Sim, hoje vamos falar do inovador dispositivo introduzido no mercado pela Sony, e que acabou por se tornar parte indispensável do modo de vida ocidental, tendo mesmo dado azo a versões actualizadas e melhoradas à medida que a tecnologia de música portátil avançava.

Idealizado pela primeira vez nos anos 70, mas popularizado sobretudo nas duas décadas seguintes, o Walkman apresentava um conceito tão simples como inovador e atractivo: tratava-se de um leitor de cassettes portátil – algo já existente, sob a forma das chamadas 'caixas de som' ou 'tijolos' – mas em tamanho ultra-compacto e portátil, e com o bónus adicional de incluir um par de auscultadores, que permitiam ouvir música em qualquer local e a qualquer momento, sem com isso incomodar quem nos rodeava – precisamente o principal ponto fraco dos referidos 'tijolos'.

Com tais mais-valias, e a aura 'cool' típica dos produtos electrónicos daquela época, não é de admirar que o Walkman tenha sido um sucesso de vendas logo desde o lançamento – mesmo apresentando um preço proibitivo, como é costume com qualquer nova tecnologia, o aparelho da Sony tornou-se um dos produtos mais desejáveis, não só entre os jovens, mas um pouco por todo o espectro demográfico de finais do século. Quem não tinha, queria ter; quem tinha, fazia disso alarde, e era devidamente invejado.

Com o avançar dos anos (e das décadas), no entanto, o Walkman foi, aos poucos, perdendo a sua mística, à medida que era introduzido no mercado um número cada vez maior de 'clones' da máquina original da Sony, de 'entranhas' mais 'fraquinhas', mas perfeitamente funcionais e com preços bem mais convidativos. Assim, uns escassos dez anos após a sua introdução com pompa e circunstância no mercado, o Walkman tornara-se já, mais do que uma marca, um termo utilizado para designar todo e qualquer aparelho leitor de cassettes portátil, independentemente do fabricante; mais, a cobiça da juventude era, agora, a evolução natural do conceito para abranger o novo formato 'na berra' – o Discman, um leitor portátil de (isso mesmo!) CD's.

Discman.jpg

Exemplo de um Discman, também da Sony

De dimensões necessariamente maiores que as de um Walkman (um CD tem, afinal de contas, mais área que uma cassette) mas ainda mais popular entre a demografia-alvo, que raramente era vista sem um, o Discman levou a tecnologia de reprodução de música portátil para o novo milénio, acompanhando a progressiva obsolescência do formato cassette e afirmando-se, paulatinamente, como o dispositivo por excelência para este efeito.

E embora o ciclo de vida do CD tenha sido bastante maior que o da cassette – tendo o formato apenas muito recentemente entrado na fase descendente, muito graças ao aparecimento dos serviços de 'streaming' – o Discman viria, também ele, a ser eventualmente destronado pela sua própria evolução natural – uma máquina que voltava a reduzir as dimensões, cabendo agora em qualquer bolso, e permitia armazenar música directamente em formato digital, sem que fosse primeiro necessário transferi-la para um dos já clássicos CD-R regraváveis. Essa, no entanto, é já uma história que fica fora do âmbito do nosso blogue, pelo que, por agora, se fica por aqui a retrospectiva sobre os aparelhos de música portáteis das décadas de 80 a 2000. companheiros quotidianos e inseparáveis de tantos jovens da época...

 

27.01.22

Os anos 90 viram surgir nas bancas muitas e boas revistas, não só dirigidas ao público jovem como também generalistas, mas de interesse para o mesmo. Nesta rubrica, recordamos alguns dos títulos mais marcantes dentro desse espectro.

Numa altura em que a música portuguesa viva um dos seus mais notáveis 'estados de graça' desde o tempo da ditadura – com um número impressionante de novos grupos e artistas a surgir ou a estabelecerem-se em todos os estilos – não é, de todo, de espantar que uma grande parte da população jovem nacional tenha desenvolvido ambições e sonhos de grandeza musical no instrumento da sua preferência. A educação musical básica adquirida na escola passava a ser manifestamente insuficiente – afinal de contas, Ian Anderson, dos Jethro Tull, continua ainda hoje a ser o único roqueiro a ficar famoso pela prática da flauta – e as escolas de música enchiam-se de jovens aspirantes a Joe Satriani, Steve Harris ou Dave Lombardo, ansiosos por aperfeiçoar a sua técnica para emular os seus ídolos e, com sorte, fazer carreira em nome próprio.

Sendo este o paradigma vigente, não foi de todo surpreendente que, já na recta final do século XX e do segundo milénio (mais concretamente, no dealbar do ano de 1997), tenha surgido nas bancas nacionais uma revista especificamente dedicada a estes aspirantes a músicos – nem tão-pouco que a mesma tenha conseguido durar uns honrosos quatro anos, e divulgar os seus artigos tanto técnicos como generalistas também junto dos profissionais e amadores de música do novo milénio.

image.jpg

Exemplos de capas da revista

E a verdade é que, à época, não existia em Portugal nenhuma revista como a Promúsica. A grande referência do jornalismo musical nacional – o jornal Blitz – tinha um carácter exclusivamente generalista, e as revistas que propunham um tipo de conteúdo mais técnico eram, invariavelmente, importadas – e, como tal, mais caras e de distribuição muito mais limitada. A criação de uma publicação deste tipo totalmente produzida dentro de portas permitia a músicos fora dos centros urbanos conseguir uma revista à sua medida, todos os meses, e sem ter que 'abrir os cordões à bolsa'. A revista, bem ciente desta exclusividade de mercado, apostava assim, quase exclusivamente, na vertente técnica e profissionalizante do universo da música, deixando em segundo plano as habituais entrevistas e perfis de bandas (embora essas também fizessem parte, bem entendido) em favor de testes e análises técnicas a instrumentos musicais, divulgação de fabricantes nacionais dos mesmos, notícias com foco nos 'bastidores' do ramo, e outros conteúdos destnados a fornecer informação directa sobre o mundo da música a quem ela mais interessava.

Este foco na vertente técnica e na divulgação de novos artistas não se ficava, tão-pouco, pelas páginas da revista em si, antes pelo contrário – um dos maiores atractivos da Promúsica eram precisamente as colectâneas em CD que oferecia com cada número, e através das quais divulgava alguns dos mais promissores artistas contemporâneos nacionais, ao mesmo tempo que oferecia exemplos 'auditivos' ou interactivos de alguns dos instrumentos, equipamentos e programas testados no interior da publicação. Um acrescento de cariz dois-em-um portanto, e que tornava a revista atractiva tanto para os músicos a quem se destinava como, simplesmente, para os entusiastas da boa música portuguesa, para quem estes CD's justificavam, só por si, o preço de venda.

Em suma, embora sem a longevidade de algumas das suas congéneres internacionais, a Promúsica marcou época entre um determinado segmento da população jovem portuguesa de finais do século XX e inícios do seguinte; e ainda que menos abrangente, em termos de público, do que outras publicações especializadas (como a Mega Score ou o próprio Blitz) terá, ainda assim, deixado saudades dentro dessa mesma demografia, a quem certamente agradará recordar a publicação que os acompanhou no seu percurso musical à época. Aqui fica, pois, essa homenagem a um tipo de publicação que, nesta era digital em que tudo é acessível, deixou totalmente de fazer sentido, mas que em tempos representou praticamente a única fonte de acesso a informação verdadeiramente interessante e relevante em relação ao mundo da música em Portugal...

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub