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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

28.08.23

NOTA: Este 'post' é correspondente a Sábado, 26 de Agosto de 2023.

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais e momentos.

Os festivais de música ao ar livre vêm-se, desde há três décadas, afirmando como um dos principais elementos do Verão português, a ponto de quase fazerem falta quando não se realizam, como durante a época de pandemia em 2020-21. Mas se cada ano parece adicionar mais e mais eventos deste tipo ao já preenchido calendário estival, continua a haver apenas um certo e determinado número de festivais verdadeiramente icónicos e sinónimos com esta época do ano, alguns dos quais entretanto desaparecidos (como o saudoso Ermal) e outros que celebram por esta altura aniversários históricos. O Festival do Sudoeste, por exemplo, comemorou o ano passado os seus vinte e cinco anos, e, este ano, é a vez de outro nome sonante da cena 'ao vivo' estival lusitana ter atingido um marco 'de respeito', ao assinalarem-se os trinta anos sobre a primeira edição do lendário Festival Paredes de Coura.

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Celebrado anualmente, em Julho e Agosto, na região com o mesmo nome, no Alto Minho, o coloquialmente chamado 'Couraíso' perfila-se, a par do não menos icónico Vilar de Mouros, como o mais destacado festival de música da região Norte de Portugal, tendo, ao longo das suas três décadas, atraído um sem-número de artistas de renome aos seus palcos, e tornado-se local de 'romaria' quase obrigatória para os fãs de pop-rock e rock alternativo portugueses. O que poucos dos que anualmente rumam à Praia Fluvial do Tabuão saberão, no entanto, é que as origens do seu 'paraíso' musical anual remontam a uma era em que muitos deles ainda nem sequer eram nascidos - nomeadamente, ao ano de 1993, quando um grupo de amigos do município decide, de forma independente, organizar um festival de música. Para esse efeito, criam panfletos feitos à mão e impressos de forma não menos artesanal e, aproveitando algum apoio monetário da Câmara Municipal, começam a contactar bandas, com o objectivo de formar um cartaz. Após vários altos e baixos - todos contados com enorme humor por um dos organizadores no podcast do Expresso dedicado à História do festival - acabam por conseguir confirmar cinco nomes, todos nacionais: Ecos da Cave, Gangrena, Cosmic City Blues, Boubacaba e Purple Lips actuam num palco improvisado a 20 de Agosto de 1993, configurando aquele que foi, efectivamente, o primeiro cartaz de Paredes de Coura.

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Cartazes da primeira e segunda edições do certame.

E a verdade é que a perserverança dos organizadores rendeu dividendos: aquele primeiro festival foi bem-sucedido o suficiente para, no ano seguinte, atrair uma banda tão conhecida e respeitada na cena nacional como os Ena Pá 2000, que se juntavam aos históricos Tédio Boys e a mais quatro bandas (incluindo duas repetentes da primeira edição) num cartaz bastante mais atractivo que o do ano anterior. E se 1994 já representou um considerável avanço em relação ao primeiro ano, 1995 elevou o festival a ainda outro nível, podendo considerar-se o ano em que Paredes de Coura verdadeiramente 'explodiu'. Blind Zero, Braindead, Pop Dell'Arte, More República Masónica e Primitive Reason formavam parte de um cartaz ainda cem por cento nacional, mas nem por isso menos atractivo - antes pelo contrário. O ano intermédio da década de 1990 é, ainda, histórico por ser o primeiro (e único) em que o festival foi dividido entre dois dias, no caso 19 e 20 de Agosto.

A partir daí, foi sempre a somar: logo no ano seguinte, o festival passa a ter três dias de duração, durante os quais actuam nomes de monta do panorama nacional, como Da Weasel, e, há exactos vinte e cinco anos, acolhe os primeiros artistas internacionais a pisar os seus palcos, com Red House Painters, Atari Teenage Riot, Anne Clark, The Divine Comedy e Tindersticks a juntarem-se a ídolos nacionais como Moonspell, Clã, Zen, Blind Zero, Belle Chase Hotel e os então 'enormes' Silence 4. A edição seguinte, última do século XX - que trazia nomes como The Gift, Lamb, Gomez, dEUS, Suede, Mogwai, Sneaker Pimps e uns Guano Apes então em estreita relação com o nosso país, é considerada pelo próprio organizador João Carvalho como a apoteose do festival, e a garantia de que o mesmo perduraria ainda durante muitos anos. E a verdade é que, desde então, já lá vão vinte e três, sem que o festival perca a força, relevância ou fama entre os fãs de boa música independente em Portugal e no estrangeiro - antes pelo contrário, como o comprova a sua colocação entre os melhores festivais de música da Europa por parte da prestigiada revista Rolling Stone, em 2005. Parabéns, Paredes de Coura - e que continues a ser uma referência na cena 'ao vivo' nacional durante ainda mais trinta anos.

14.07.23

NOTA: Por motivos de relevância temporal, falaremos de cinema nas próximas duas Sextas-feiras; hoje, falaremos novamente de moda.

Um dos aspetos mais marcantes dos anos 90 foi o seu inconfundível sentido estético e de moda. Em sextas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das marcas e modas mais memoráveis entre os jovens da ‘nossa’ década.

O fenómeno de um produto normalmente associado com uma cultura de 'nicho' – seja a nível estético ou ideológico – se transpôr para o chamado 'mainstream' não é, de todo, inédito; pelo contrário, são incontáveis as apropriações e assimilações deste tipo feitas pela cultura ocidental nos últimos cinquenta anos, de forma transversal a todos os aspectos da sociedade. O vestuário e o calçado não são excepção, tendo várias peças originalmente destinadas ao trabalho manual ou envergadas como forma de posicionamento contra-cultural passado a ser uma mera opção estética igual a tantas outras.

Tão-pouco foram os anos 90 excepção a esta regra; a última década do século XX viu entrarem no guarda-roupa do comum dos jovens as botas texanas, os blusões de penas, e as botas de caminhada ou de biqueira de aço, que se juntavam aos casacos de cabedal e ganga no rol de artigos entretanto desprovidos da sua função original e adoptados como simples adereços de moda. A este grupo há, ainda, que juntar um artigo de calçado que, nos seus então quarenta anos de História (hoje setenta) nunca havia deixado de ser conotada com movimentos rebeldes, contra-culturais, ou, no mínimo, artísticos: as botas Dr. Martens, mais conhecidas como 'Docs'.

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De facto, apesar de serem, ainda, largamente conotadas com o vestuário dos 'freaks' (nome dado, à época, aos adeptos do movimento alternativo) a verdade é que estas botas viveram, durante a referida década, um dos seus 'estados de graça', muito por conta do referido movimento alternativo e de 'cenas' musicais e culturais como o gótico ou o 'grunge'. Com os seus tradicionais pespontos amarelos e uma gama de cores fora do comum (além das clássicas pretas ou castanhas, era comum ver nos pés da juventude modelos vermelhos, amarelos ou verdes) estas botas não podiam deixar de agradar a 'tribos' urbanas cuja filosofia estética era, precisamente, a de se destacar das 'massas' através de escolhas estilísticas inusitadas e chamativas. Junte-se a isto a sua versatilidade e a durabilidade típica de artigos de qualidade da época, e está explicado o sucesso das 'Docs' junto do público alternativo da viragem do Milénio.

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O ainda popular modelo vermelho.

O único entrave à ainda maior massificação destas botas entre os jovens lusitanos era, pois, o mesmo de sempre: o preço, que se afirmava como proibitivo para a maioria das 'carteiras' da classe média, mesmo no contexto de presentes de aniversário ou Natal; assim, para cada jovem que envergava orgulhosamente um par de Dr. Martens nos pés, haveria certamente vários outros que se viam forçados a ficar-se pelo 'sonho', e a admirar com cobiça os pares dos colegas e amigos.

A história das botas Docs na sociedade portuguesa (e mundial) tem, ainda, outra reviravolta, já que a democratização da moda, aliada à sua natureza cíclica, fez com que as mesmas regressassem à consciência colectiva de uma geração, entretanto, já capaz de suportar os custos aliados à compra de um par – bem como da seguinte, que as assimilou e integrou no seu próprio livro de estilo, e as associou aos seus próprios movimentos sócio-culturais. Um breve passeio pelas ruas de uma qualquer cidade portuguesa permite, assim, avistar novamente os icónicos pespontos amarelos nos pés de góticos, 'punks' e intelectuais, mas também das chamadas 'betinhas', provando que as septuagenárias botas mantêm o mesmo apelo transversal que as fez objecto de cobiça da maioria dos jovens portugueses há perto de três décadas.

19.11.22

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais.

A explosão dos movimentos pop-rock e alternativo nas décadas de 80 e 90 (já aqui documentada em vários dos nossos posts anteriores) levou, lógica e previsivelmente, ao aparecimento de inúmeros espaços (a maioria, também naturalmente, nas áreas urbanas de Lisboa e Porto) onde os fãs destes estilos se podiam juntar para ouvirem o tipo de som da sua preferência, sempre devidamente acompanhado de alguns comes e muitos bebes, ou não se estivesse em Portugal. E se, na década seguinte, ganhariam proeminência e relevância salas como o Paradise Garage, em Lisboa, ou o seu congénere portuense, o Hard Club, nos anos 90 o destaque nesse campo pertencia a espaços como o Dramático de Cascais, ou o estabelecimento de que hoje falamos, o Johnny Guitar.

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Sala mítica da Lisboa dos noventas, sobretudo para quem gostava de um som mais voltado ao 'punk', rock alternativo e até heavy metal, o espaço inaugurado há quase exactos trinta e dois anos (a 7 de Novembro de 1990) por Zé Pedro (dos Xutos & Pontapés), Alex e Kalú (dos Rádio Macau) como 'substituto' para o lendário e malogrado Rock Rendez-Vous conseguiu, nos seus poucos anos de existência, deixar o mesmo tipo de marca na sociedade lisboeta, e sobretudo na sua juventude, que o seu antecessor, tornando-se A sala de referência, por excelência, para concertos de bandas dos estilos supramencionados. Pelo palco do pequeno mas carismático espaço da Calçada Marquês de Abrantes passaram nomes tão díspares como Peste & Sida, Ramp, Pop Dell'Arte, e até Jorge Palma (na sua encarnação mais 'alternativa' como Palma's Gang) ou uns Da Weasel ainda com um som mais puramente hip-hop e letras em inglês; no total, em escassos quatro anos de existência, o mítico espaço albergou mais de quinhentos espectáculos, tendo alguns dos artistas que ali tocaram, inclusivamente, ficado imortalizados no CD 'Johnny Guitar Ao Vivo em 1994, Vol. I', bem como no álbum ali gravado pelo Palma's Gang.

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Os dois álbuns alusivos ao espaço.

Infelizmente, antes que pudesse ser compilado um segundo volume desta colectânea, o bar e sala de espectáculos de Zé Pedro, Alex e Kalú viu-se obrigado a encerrar portas, como consequência de repetidas queixas relativas ao ruído e volume da música que ali se ouvia: uma perda de vulto para a juventude 'roqueira' nacional, que se via assim privada de uma das muito poucas salas declaradamente dedicadas a um som mais barulhento e menos comercial. Fica, pois, a homenagem possível a uma sala que, imagina-se, terá sido marcante na juventude de alguns dos leitores mais velhos deste blog, a quem convidamos a deixarem quaisquer testemunhos sobre o espaço na nossa caixa de comentários.

18.11.22

Um dos aspetos mais marcantes dos anos 90 foi o seu inconfundível sentido estético e de moda. Em sextas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das marcas e modas mais memoráveis entre os jovens da ‘nossa’ década.

Até finais da década de 90, os peluches estavam conotados, sobretudo, com a primeira infância, ou, na melhor das hipóteses, com elementos mais velhos, mas do sexo feminino (vulgo, eram 'para bebés' ou 'para meninas'); essa tendência sofreu, no entanto, uma completa inversão nos últimos anos do século XX, quando os bonecos feitos do referido material, sobretudo os acoplados a um porta-chaves, foram apropriados pelo movimento alternativo, e transformados em moda adolescente entre os então denominados 'freaks', que os exibiam orgulhosamente nos fechos das suas mochilas Eastpak, Jansport ou Monte Campo, ou até nas igualmente populares sacolas de sarja

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Um exemplo bastante típico do fenómeno explorado neste 'post'.

De facto, entre o último terço da década de 90 e meados da seguinte (e, em menor escala, até aos dias de hoje) não era, de todo, incomum ver jovens de ambos os sexos com penteados ousados, calções, calças e ténis largos e 't-shirts' de marcas radicais ou alusivas a bandas de metal ou propriedades intelectuais 'de nicho' trazerem pendurado da 'pasta' um ursinho (ou uma réplica de outro objecto do dia-a-dia, como um ténis, um estojo ou um telemóvel) feito de peluche; em inícios do novo milénio, quando a cultura 'pop' norte-americana começou a chegar em maior escala ao nosso país, este acervo ver-se-ia, ainda, acrescido de réplicas dos personagens de algumas das mais populares propriedades intelectuais dessa nova vaga, entre os quais se destacam largamente os quatro protagonistas infantis do icónico 'South Park'.

E ainda que esta moda fizesse torcer o nariz a quem estava menos 'dentro' do movimento, a verdade é que a mesma era perfeitamente bem aceite por quem dele fazia parte, sendo uma das raras instâncias em que os jovens do sexo masculino não eram alvo de ridículo por parte dos colegas por uma decisão deste tipo – tendência que, aliás, se continua a verificar hoje em dia, em que o uso de peluches e outros artefactos alusivos à propriedade intelectual favorita são encorajados e utilizados com orgulho por jovens em idade de ensino secundário e até universitário. O que os mesmos talvez não saibam, no entanto, é que devem a possibilidade de expressar a personalidade desta forma à geração dos seus pais (ou, pelo menos, irmãos mais velhos), a primeira a normalizar o uso de peluches por jovens já em plena adolescência como forma de demonstrar individualidade e oposição às normas sociais estabelecidas – ainda que, como tantas outras tendências adolescentes dessa época e de outras, o mesmo se tenha popularizado ao ponto de deixar de ser uma transgressão, e se passar a inserir no campo da 'moda' pura e dura...

04.11.22

Um dos aspetos mais marcantes dos anos 90 foi o seu inconfundível sentido estético e de moda. Em sextas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das marcas e modas mais memoráveis entre os jovens da ‘nossa’ década.

Apesar de não ter tido na moda jovem dos anos 90 a mesma influência que o chamado estilo 'betinho', o movimento alternativo não deixou, ainda assim, de moldar significativamente o aspecto de um qualquer pátio de escola secundária portuguesa dos anos 90 e 2000, respondendo aos pólos de rugby, socas plataforma, calças à boca de sino, camisas da Sacoor e 'sweatshirts' da Gap ou Quebramar com tendências próprias, como as calças largas, as botas Doc Martens ou de biqueira de aço, os bonés para trás ou para o lado, as trancinhas conhecidas como 'tererés' ou o acessório de que falamos neste 'post', as bolsas a tiracolo em sarja.

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Exemplo moderno do acessório discutido nas linhas abaixo.

Populares entre os então chamados 'freaks' pela sua aparência militar e potencial de customização – era, aliás, quase obrigatório decorá-las com 'patches', 'pins' ou até desenhos ou dedicatórias dos amigos – esta mistura das tradicionais carteiras das 'betinhas' com as mochilas que qualquer 'puto' da escola carrega diariamente às costas dispunha de uma alça ajustável, mas esta acabava por ser uma característica quase redundante, já que qualquer aluno do secundário ou da universidade que se prezasse as usava o mais descaídas possível, normalmente ao nível dos joelhos (e, quase sempre, atravessadas a tiracolo, ainda que no caso das raparigas pudessem também ser usadas penduradas.)

Apesar do seu apelo aparentemente intemporal, no entanto, estas sacolas acabaram mesmo por cair em desuso após a primeira década do Novo Milénio, tendo gradualmente vindo a ser substituídas pelas suas congéneres em cabedal, borracha ou plástico, ou ainda pelos sacos de pano, sobretudo entre o sector universitário; ainda assim, este acessório não deixou de marcar época junto do segmento mais alternativo da geração que atingiu a adolescência em finais dos anos 90 e inícios de 2000; aliás, estamos em crer que, após ler este post, já deverá ter havido quem tenha ido buscar a sua à garagem ou ao fundo do armário, para mostrar aos filhos ou, simplesmente, recordar os seus tempos de jovem....

19.09.22

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

Qualquer melómano que tente fazer uma lista dos melhores e mais importantes álbuns de música portuguesa dos anos 90 certamente se deparará com alguns nomes incontornáveis. De provas de vida por parte de artistas veteranos ('Rock In Rio Douro', dos GNR, ou 'Pedras da Calçada', de Paulo Gonzo) ou supergrupos (o álbum homónimo dos Rio Grande) até declarações de intenções por 'novatos' decorrentes do 'boom' do pop-rock nacional daquela década (os primeiros discos de Da Weasel ou Santos e Pecadores, 'LusoQUALQUERcoisa' dos Clã, 'Vinyl' de The Gift, ou 'Silence Becomes It', do fenómeno Silence 4), é longa a lista de clássicos produzidos por artistas e grupos portugueses durante a referida década, e que continuam a reter a sua influência e relevância três décadas depois.

Da referida lista, especificamente do lado do 'sangue novo', faz ainda parte um álbum que celebrou há poucos dias (a 15 de Setembro de 2022) o vigésimo-quinto aniversário do seu lançamento, e que ajudou a apresentar ao mundo fonográfico português um novo nome, pronto a conquistar as ondas de rádio mais 'alternativas': 'Cão!', dos Ornatos Violeta.

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Capa do álbum de estreia do quarteto portuense.

O primeiro de apenas dois álbuns de originais lançados pela banda portuense (o terceiro é uma colectânea de inéditos e raridades), o disco foi, ainda assim, suficiente para fazer da banda portuense uma referência da música portuguesa até aos dias de hoje, o que atesta bem quanto à sua qualidade.

Formados no Porto nos primeiros anos da década, os Ornatos Violeta (ou simplesmente Ornatos) fariam jus à máxima de que 'se tem a vida toda para criar o trabalho de estreia', optando por lançar o trabalho de estreia apenas após ter a certeza de que a 'máquina' se encontrava bem 'oleada' no circuito de concertos e 'demos'; e o mínimo que se pode dizer é que esse esforço foi mais do que recompensado, com 'Cão!' a cair, quase de imediato, no 'gosto' da crítica especializada, que lhe teceu rasgados elogios não só à época, mas ao longo das décadas seguintes (ainda em 2009, a referência especializada Blitz o colocava no Top 5 de álbuns alguma vez criados por artistas portugueses, bem como na lista de melhores trabalhos oriundos da zona do Porto). Apresentando uma mistura de funk, jazz e ska, o álbum rendeu singles tão conhecidos e bem-sucedidos como 'Punk Moda Funk' (talvez o mais emblemático título dos portuenses, e música de abertura do álbum), 'A Dama do Sinal' e 'Mata-me Outra Vez', todos os quais tiveram considerável 'rodagem' nas rádios nacionais da altura.

Escusado será, também, dizer que o grupo não hesitou em aproveitar o 'embalo' dado por tão auspiciosa estreia, tendo o sucessor de 'Cão!' surgido pouco mais de dois anos após o lançamento deste, em Novembro de 1999; e a verdade é que, embora menos emblemático que o trabalho de estreia 'O Monstro Precisa de Amigos' é, também ele, um trabalho muito bem cotado tanto entre fãs da cena alternativa portuguesa como junto da imprensa especializada.

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Capa do segundo (e último) álbum do grupo, lançado em 1999

Apesar do processo de criação atribulado, o álbum representa uma bem-sucedida evolução do som estabelecido no trabalho de estreia, o qual se apresenta agora mais ponderado e sofisticado, que voltou a valer aos Ornatos reconhecimento generalizado, com a banda a conquistar diversas categorias na última edição do milénio dos prémios Blitz (incluindo a de Álbum do Ano) e o disco em si a ser considerado, ainda hoje, como um dos mais importantes álbuns portugueses dos últimos trinta anos.

Em meio a tal sucesso e adulação, seria normal que a carreira dos Ornatos seguisse de vento em popa; foi, no entanto, precisamente o contrário que se verificou, com a banda a anunciar abruptamente a sua separação quando ainda se encontrava no auge da carreira, em 2002; e a verdade é que, à parte o referido álbum póstumo de 'lados B' de raridades e algumas reuniões esporádicas na última década, esse foi mesmo o 'Fim da Canção' para Manel Cruz, Elísio Donas, Nuno Prata, Peixe e Kinorm, cujo legado acabou, assim, por se ficar apenas por aqueles dois álbuns revolucionários que 'abanaram' a cena portuguesa de finais de milénio. Um típico caso, portanto, de banda que se extingue após ter dado ao Mundo apenas um 'cheirinho' da sua arte, estatuto que o colectivo portuense partilha, na mesma década, com os supramencionados Silence 4; ainda assim, a obra dos Ornatos afirmou-se como (ainda) mais duradoura e influente que a de David Fonseca e seus capangas, fazendo com que, um quarto de século volvido, os dois álbuns do quinteto se afirmem ainda como de audição obrigatória para qualquer fã de música alternativa contemporânea 'made in Portugal'.

 

01.07.22

Um dos aspetos mais marcantes dos anos 90 foi o seu inconfundível sentido estético e de moda. Em sextas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das marcas e modas mais memoráveis entre os jovens da ‘nossa’ década.

Na última edição desta rubrica, falámos das tatuagens, e do modo como as mesmas deixaram as 'tribos' de nicho e se transformaram num fenómeno 'mainstream' durante as décadas de 90 e 2000; nada mais apropriado, portanto, do que nos debruçarmos, esta semana, sobre o outro grande elemento da cultura dita 'alternativa' a transpôr essa barreira, sensivelmente na mesma época: os 'piercings'.

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Os 'piercings' no umbigo foram um 'clássico' entre uma determinada demografia nas décadas de 90 e 2000

Até então confinados, sobretudo, a sub-culturas como o punk e o metal (sendo os tradicionais e convencionais brincos a única forma de adorno deste tipo transversalmente aceitável em toda a sociedade) os 'piercings' aproveitaram a 'boleia' das tatuagens para se espalharem um pouco por todos os sectores da cultura jovem da altura, tendo encontrado particular aceitação entre a nova geração de 'alternativos' (que ainda hoje continuam a favorecer as sobrancelhas, nariz e lábios como localização preferencial deste tipo de adorno) e junto das chamadas 'betinhas', para quem as jóias no umbigo ou os pontos ao canto do lábio passaram a ser mais um entre muitos adereços 'da moda', perfeitos para exibir no Verão, quando entravam em cena os tops de 'barriga ao léu' (os quais merecem também, potencialmente, um lugar futuro nesta rubrica.)

Aquilo que anos antes era visto como um 'desvio' das normas convencionais, e conotado com a rebeldia ou até com o perigo, passou, assim, a ser algo significativamente mais normalizado, passando as conotações rebeldes a existir apenas no contexto da demografia mais jovem, para quem este tipo de adorno era um apoio à expressão identitária. Mais de duas décadas depois, e tendo-se esses jovens transformados, eles próprios, em adultos, os 'piercings' (bem como as tatuagens) são um elemento perfeitamente comum e aceite dentro da sociedade ocidental, já muito longe da insurreição que outrora simbolizaram, tendo-se (ainda que involuntariamente) tornado um símbolo tanto da progressão social que se verificou nesse espaço de tempo, como da sanitização e padronização que se vai vivendo no seio da sociedade ocidental actual, já praticamente isenta de elementos verdadeiramente subversivos, como chegaram a ser, na sua época, estes adornos...

10.04.22

NOTA: Este post é respeitante a Sexta-feira, 08 de Abril de 2022.

Um dos aspetos mais marcantes dos anos 90 foi o seu inconfundível sentido estético e de moda. Em sextas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das marcas e modas mais memoráveis entre os jovens da ‘nossa’ década.

Já anteriormente aqui se discutiu o impacto que o movimento alternativo - quer na vertente 'rock', quer 'hip-hop' - teve sobre a juventude portuguesa de finais do segundo milénio; e um dos aspectos mais visíveis dessa mesma influência era a forma de vestir, um dos principais identificadores externos do 'estilo' a que se pertencia. E enquanto os 'betinhos' tinham as 'sweats' da Gap, as camisas Sacoor, os pólos de 'rugby', os sapatos de vela, os blusões da Duffy e as calças à boca de sino, os 'dreads' tinham os panamás às florzinhas (aos quais paulatinamente chegaremos), os bonés de equipas desportivas, os ténis Airwalk, as 'sweats' de marcas de surf e skate, e aquela que era literalmente a 'alternativa' às calças à boca de sino: as calças largas.

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Sim, durante um período de dois ou três anos, no final do século XX, um dos items mais desejados pela maioria dos jovens de tendência mais 'alternativa' foram calças de corte propositalmente largo (as bases das pernas tapavam, idealmente, todo o topo dos ténis), cujos bolsos se estendiam quase até aos joelhos (ou à base do rabo, no caso dos bolsos de trás), acomodando sem problemas um 'walkman' ou 'discman', uma consola portátil, ou até algo como um livro, uma barra de chocolate ou uma sanduiche. Fosse na vertente ganga (sempre com as tradicionais costuras brancas, que não deveriam faltar num item deste tipo) fosse no ainda mais popular formato 'chino' (cinzento ou, preferencialmente, bege ou cor de creme), de corte masculino ou feminino, as calças deste tipo eram parte indispensável do vestuário tanto de quem era 'dread', como de quem queria ser; e quem não tinha (e não tinha dinheiro para comprar) um par, 'caçava com gato', isto é, comprava simplesmente um par de calças normal, vários tamanhos acima, e apertava-o na cintura para que servisse. O importante era que o efeito visual fosse o correcto...

Como tantas das peças de que aqui falamos (incluindo o seu indispensável complemento, os ténis de 'skate', e as 'rivais' boca de sino) as calças de formato largo acabaram, com o passar dos anos, por voltar ao seu reduto mais 'de nicho', tanto na sociedade portuguesa, como um pouco por todo o Mundo; quem 'lá esteve', no entanto, não esquece o impacto que essa vestimenta teve numa parte significativa da população jovem nacional da época, para quem era (mais um) elemento-chave de identificação e 'localização' social...

25.03.22

Um dos aspetos mais marcantes dos anos 90 foi o seu inconfundível sentido estético e de moda. Em sextas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das marcas e modas mais memoráveis entre os jovens da ‘nossa’ década.

Um dos principais aspectos da moda dos anos 90 – para além do seu gosto, muitas vezes, duvidoso – foi a sua compartimentalização, muitas vezes coincidente com o conceito de 'tribos urbanas' que continua, ainda hoje, a dividir a juventude ocidental. Em Portugal, concretamente, existiam as marcas 'de betinhos' - como a Lacoste, Polo Sport, Tommy, Gap, Sacoor, Quebramar ou Duffy, isto sem falar nos clássicos pólos de râguebi ou calças à boca de sino - as de surf, como a Billabong, Ocean Pacific, Body Glove, Scorpion Bay, Quiksilver, Hang Loose, Lightning Bolt ou O'Neill, as de desporto e moda casual (das muito imitadas Reebok, Adidas ou Puma às menos conhecidas Lotto, Umbro, Pony, Fila, Kappa, Sanjo ou Le Coq Sportif) e as alternativas ou 'radicais', normalmente (embora não exclusivamente) associadas ao movimento 'skater'. Dessas, já aqui abordámos, anteriormente, as 'sweats' da No Fear e marcas derivadas, e ainda os ténis Airwalk, acessório quase obrigatório para quem se considerasse (ou quisesse considerar) parte dessa 'tribo' nos anos finais da década; essas estavam, no entanto, longe de ser as únicas marcas que compunham essa sub-categoria da moda infanto-juvenil da época, pelo que, esta Sexta, falaremos de algumas das restantes.

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A Dickies foi uma das muitas marcas a beneficiar da febre do 'skate' dos anos 90

E quem foi, quis ser, ou teve amigos que tenham sido, 'radicais' durante a referida década, bem como a seguinte, certamente já está a recitar uma litania de nomes que remetem directamente para o ensino preparatório e secundário – da Fishbone à Fubu, Etnies, Skechers ou Counter Culture, foram várias as marcas adoptadas pelos jovens de inclinação 'radical' durante essas duas épocas, muitas vezes como forma de emular os seus ídolos, que 'trajavam' de forma semelhante. Até mesmo marcas que não estavam directamente associadas à sub-cultura em causa – como a Dickies, cuja especialidade são roupas de trabalho para profissionais da área dos serviços – acabaram por beneficiar deste fenómeno, tendo gozado de alguns anos de grande popularidade entre o público jovem em geral, e entre os mais 'alternativos' em particular.

Como acontece com a maioria dos temas explorados nestas páginas, no entanto, também a moda dos desportos radicais evoluiu com o passar das décadas, voltando a assumir um carácter mais 'de nicho' do que tinha nos anos 90, em que qualquer mascote de desenho animado que se prezasse era vista em cima de um 'skate' pelo menos uma vez; por consequência, também as marcas associadas a este movimento (e outros igualmente alternativos) se tornaram presença menos comum na sociedade jovem nacional, acabando inevitavelmente por ser substituídas por uma 'nova geração' de logotipos, vestidos pela nova geração de 'skaters' e praticantes de BMX ou patins em linha. Quem fez parte dessa 'tribo' nos anos 90 e 2000, no entanto, terá sem dúvida disfrutado, nestes passados momentos, de uma agradável viagem nostálgica pelas marcas da sua infância e adolescência – e, quiçá, sentido sob os joelhos o atrito do asfalto da rua ou pátio da escola, indicativo de mais uma de muitas quedas...

07.12.21

NOTA: Este post diz respeito a Segunda-feira, 06 de Dezembro de 2021.

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

O Natal não é, exactamente, um tema comum no que toca a colectâneas de música alternativa; normalmente, as compilações deste tipo centram-se sobretudo nos clássicos intemporais (e de domínio público) que a maioria dos comuns mortais transforma em banda-sonora para esta época do ano,

Em 1995, no entanto, a editora independente portuguesa Dínamo Discos resolveu explorar precisamente esse conceito, juntando num mesmo disco alguns dos maiores e mais conhecidos artistas da música portuguesa e fomentando uma série de colaborações, as quais viriam mais tarde a fazer parte do disco. E o mínimo que se pode dizer é que, apesar do sucesso comercial não ter sido por aí além significativo, em termos qualitativos, a empreitada valeu bem a pena.

Espanta_Espíritos.jpg

Intitulado 'Espanta-Espìritos' e lançado em Novembro (com uma capa que remete mais ao Halloween do que propriamente ao Natal), o disco apresenta doze músicas bem eclécticas e diversificadas, com as sonoridades alternativas e a temática natalícia como únicos denominadores comuns – uma característica proposital, e que assegura que a colectânea oferece algo para os fãs de todos os géneros da música alternativa, com a notória excepção do hard rock e metal, talvez por serem géneros demasiado 'de nicho' ou pouco agradáveis ao ouvido do melómano médio português.

De resto, há para todos os gostos, do pop-rock de 'Final do Ano (Zero a Zero)' (interpretado por Xana dos Rádio Macau ao lado de Jorge Palma) ao fado de 'Minha Alma de Amor Sedenta', de Alcindo Carvalho, passando pelo funk Jamiroquai-esco de '+ 1 Comboio' (novamente com Jorge Palma em dueto com um elemento dos Rádio Macau, no caso o guitarrista Flak), o rock sarcástico-cómico de 'Família Virtual' (uma inesperada colaboração entre o fadista Carvalho e os anarco-ska-punks Despe & Siga) e 'Natal dos Pequeninos' - dueto de João Aguardela, dos Sitiados, com duas crianças - ou mesmo o hip-hop de 'Apenas Um Irmão', faixa que consegue a proeza dupla de inserir, à sorrelfa, uma palavra menos própria na letra (por sinal, bem rebelde e contestatária, como era apanágio do hip-hop português da época) e de pôr Sérgio Godinho a fazer rap ao lado dos mestres Pacman (hoje Carlão) e Boss AC – e quem nunca ouviu Sérgio Godinho numa música de rap, não sabe o que anda a perder...

Ouçam por vocês mesmos...

As restantes músicas são mais tradicionais deste tipo de empreitada, e desenvolvem-se num ritmo mais calmo e baladesco – o que não significa que tenham menos qualidade. 'A Rocha Negra', em particular, é um tema assombroso, em todos os sentidos, alicerçado numa grande prestação vocal, quase 'a capella' de Tim (ainda em fase de estado de graça com os seus Xutos) e Andreia (dos desconhecidos Valium Electric), enquanto 'São Nicolau' é um bonito tema em toada pop-rock, cantado por Viviane, dos Entre Aspas. Em suma, são poucos os temas mais fracos deste registo, e mesmo esses nunca passam o limiar do aceitável-para-bom.

Não deixa, pois, de ser surpreendente que o principal contributo de 'Espanta Espíritos' para a mùsica portuguesa tenha sido a inclusão de alguns dos seus temas em álbuns 'verdadeiros' de alguns dos participantes; como colectânea, e apesar de ter sido considerado um dos vinte melhores discos de Natal lançados em Portugal pela Time Out (uma daquelas distinções tão de nicho, que acaba por fazer pouco ou nenhum sentido) o álbum esteve longe de ser um sucesso, e encontra-se largamente esquecido nos dias que correm. Uma pena, visto que – como qualquer pessoa que tenha o álbum certamente afirmará – este se trata de um projecto que merecia bastante melhor do que apenas um estatuto de culto...

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