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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

19.09.23

Porque nem só de séries se fazia o quotidiano televisivo das crianças portuguesas nos anos 90, em terças alternadas, este blog dá destaque a alguns dos outros programas que fizeram história durante aquela década.

Há figuras tão peculiares ou carismáticas que são capazes, com a sua forma de ser ou estar, de transformar até o mais enfadonho dos assuntos em algo minimamente interessante – e a televisão portuguesa dos anos 90 esteve bem servida deles. De Carlos Cruz a Júlio Isidro, António Sala, Nicolau Breyner, Fernando Mendes, Jorge Gabriel, Olga Cardoso ou até 'pivots' como Artur Albarran, muitas foram as personalidades que ajudaram a 'animar' as tardes e noites dos portugueses de finais do século XX. Mas se a maioria destas figuras se movia no já de si apelativo mundo do entretenimento, uma havia que tinha pela frente missão mais 'espinhosa'; a de interessar o telespectador comum em assuntos de cultura geral, e mais concretamente ligados à História de Portugal. E a verdade é que tal tarefa não amedrontou a 'cara' em causa, que fez, durante os vinte anos de cada lado do Novo Milénio, diversas, e relativamente bem sucedidas, tentativas de educar as 'massas' portuguesas.

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Antes de Marcelo, era este o homem conhecido como 'o Professor' pela maioria dos portugueses...

Falamos, claro está, do professor José Hermano Saraiva, talvez mais conhecido das gerações 'X' e 'millennial' como um dos mais famosos e bem conseguidos 'bonecos' da 'Enciclopédia' de Herman José (outra das tais figuras cativantes e icónicas da televisão nacional da época), que captou e satirizou com mestria os icónicos e inconfundíveis trejeitos do velho historiador; no entanto, para quem gostava (ou tentava gostar) de História, o então professor universitário era um nome incontornável, que tinha o condão de tornar as normalmente aborrecidas sequências de eventos da História de Portugal em 'histórias' (com H pequeno) capazes de captar e cativar a atenção – uma característica que o mesmo tentava implementar em cada novo programa que levava ao ar. 'A Bruma da Memória', estreado há quase exactos trinta anos (a 17 de Setembro de 1993) não é excepção, apresentando todas as características que se podiam esperar de um programa de José Hermano Saraiva.

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Composto por treze episódios, que perfazem uma única 'temporada', o conceito (a que a Wikipédia chama 'série', mas que, na verdade, se assemelha bastante mais a um dos então frequentes programas documentais ou de reportagem de índole cultural) foi produzido por Teresa Guilherme (sim, essa mesma!) e integrou a grelha da RTP durante exactos três meses, ao ritmo de um episódio por semana, tendo o último, sobre Macau, sido transmitido a 17 de Dezembro daquele mesmo ano. Antes, o Professor havia já visitado localidades como Guimarães, Aveiro, Tomar, Mafra e Setúbal, onde se debruçara sobre alguns dos acontecimentos mais marcantes da nossa História, bem como sobre algumas das personalidades e obras de arte ligadas a cada uma das localidades, sempre no seu tom conversacional e com os famosos gestos de mãos a enfatizar a sua cadência declamatória e solene.

O resultado era um daqueles programas (e não séries...) que se podiam ver em família, depois do jantar e antes de ir para a cama, e que os pais com interesse em assuntos culturais e intelectuais mostravam aos filhos para os tentar interessar em assuntos adjacentes aos que os mesmos aprendiam na escola. E ainda que estas tentativas nem sempre fossem bem sucedidas, a verdade é que programas como o de José Hermano Saraiva desempenhavam um papel importante no contexto das mesmas, bem como nos esforços mais generalizados de fazer chegar cultura geral à população; quanto mais não seja por isso, programas como 'A Bruma da Memória' merecem ser lembrados pela geração que, apesar de talvez muito nova para os absorver na totalidade, terá uma vaga memória de os ver 'passar' na televisão lá de casa nos serões de finais de 1993. Para esses, aqui deixamos o link para a 'playlist' com todos os episódios, para que possam recordar aqueles tempos, há exactos trinta anos, em que a televisão pública ainda procurava ter conteúdos de teor cultural e didáctico...

 

18.09.23

Qualquer jovem é, inevitavelmente, influenciado pela música que ouve – e nos anos 90, havia muito por onde escolher. Em segundas alternadas, exploramos aqui alguns dos muitos artistas e géneros que faziam sucesso entre as crianças daquela época.

Hoje em dia, um grande concerto dado por um artista de renome internacional num palco com destaque não é, de todo, novidade para os melómanos portugueses, já que os cada vez mais incontáveis festivais de Verão ajudam, a cada ano, a colocar Portugal no 'mapa' musical mundial. Esta é, no entanto, uma situação relativamente recente, sendo que mesmo a maioria dos membros da geração 'millennial' se lembra de uma época da História em que havia menos de uma mão-cheia de concertos verdadeiramente 'grandes' por ano, normalmente dados em estádios, o equivalente da altura aos grandes pavilhões e palcos exteriores de hoje; e porque uma dessas raras ocasiões teve lugar há quase exactos trinta anos, a 11 de Setembro de 1993, iremos esta semana dedicar-lhe algumas linhas, depois de um erro de cálculo ter feito com que ignorássemos involuntariamente a efeméride na data do seu verdadeiro aniversário. Mais vale tarde do que nunca, no entanto, pelo que recordemos a passagem dos 'gigantes' Bon Jovi pelo Estádio de Alvalade, naquele fim de verão de há três décadas atrás.

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O vocalista durante o concerto em causa.

Em 'estado de graça' após uma sequência de álbuns extremamente bem-sucedidos, o quinteto oriundo de Nova Jérsia aterrava no nosso País pela segunda de seis vezes para promover o seu à época mais recente álbum, 'Keep The Faith', lançado em finais do ano anterior e que liderava inclusivamente, naquela segunda semana de Setembro de 1993, as tabelas de vendas fonográficas portuguesas. E porque a passagem anterior datava já de 1989 (altura em que promoviam, no velhinho Dramático de Cascais, o também excelente 'New Jersey' - que, curiosamente, completa também  esta semana, a 19 de Setembro, exactos trinta e cinco anos sobre o seu lançamento) era compreensível a considerável excitação dos fãs quanto ao regresso da banda – uns porque não tinham tido ensejo de os ver quatro anos antes, outros porque queriam voltar a vibrar com os 'hinos' do grupo, ou simplesmente admirar os atributos físicos do vocalista e líder, um dos mais famosos e destacados 'sex-symbols' juvenis da década. Prova desse mesmo entusiasmo eram os diversos concursos radiofónicos alusivos ao concerto, e que permitiriam a alguns 'sortudos' visitar os bastidores da actuação e conhecer em primeira mão a banda.

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O grupo promovia, à época, o álbum 'Keep the Faith', que liderava as tabelas fonográficas portuguesas naquele mês de Setembro de 1993.

UHF e Billy Idol – eles mesmos nomes destacados das respectivas cenas musicais – tinham naquela noite a ingrata tarefa de 'aquecer' um público a quem interessavam, sobretudo, os cabeças de cartaz; e a verdade é que, quando finalmente subiram ao palco, Jon e companhia não desiludiram, pondo em cena um espectáculo memorável, cujo ponto alto via Bon Jovi empunhar uma bandeira 'luso-americana', que depois atiraria para o público, num daqueles 'truques de palco' tão 'batidos' quanto eficazes. O alinhamento era, também ele, de luxo, dando previsível ênfase ao álbum mais recente, mas não esquecendo as 'malhas' do passado, e abrindo mesmo espaço a alguns 'covers' bem clássicos, de nomes como Jimi Hendrix. Foram quase exactas duas horas (incluindo dois 'encores') e mais de uma dezena e meia de temas de 'hard rock' radiofónico, daquele que, tendo já os dias contados, ainda ia subsistindo na era pós-Nirvana, muito por conta de grupos como os Bon Jovi, e espectáculos como os daquela noite em Alvalade.

A banda norte-americana ainda voltaria, aliás, uma segunda vez ao nosso País (e ao Estádio de Alvalade) durante a década de 90, pouco menos de dois anos depois, durante a turnê de 'These Days'; seguir-se-iam, já no Novo Milénio, mais três concertos, em 2008, 2011, e 2013, sempre no Parque da Bela Vista, em Lisboa, palco do famoso Rock In Rio. No entanto, para os fãs portugueses de uma certa idade, é aquela actuação em 1993 que fica na memória,sendo hoje considerada como um dos melhores concertos ao vivo da época. E para que essa mesma faixa demográfica possa recordar essa grande noite, e quem era, à época, demasiado novo para ir a concertos possa 'sentir' um pouco do que ali se passou, deixamos abaixo o concerto integral, com os cumprimentos do YouTube. Vejam, portanto (ou revejam), e tirem as vossas próprias ilações...

17.09.23

Aos Domingos, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos principais acontecimentos e personalidade do desporto da década.

Se houve posição em que o futebol português foi prolífico, essa posição foi a de avançado-centro; afinal, esta foi a década que revelou nomes como Mário Jardel, Alberto Acosta, Nuno Gomes, Claudio Canniggia, Domingos Paciência ou Marius Niculae, entre muitos outros. Mesmo fora do 'eixo' dos 'três grandes', iam paulatinamente surgindo nomes que não deixavam de entusiasmar mesmo os adeptos de outros clubes, como foi o caso, por exemplo, com Karoglan, Fary, Elpídio Silva, ou o jogador de que falamos este Domingo, que chegou a Portugal pela porta insular, há exactos trinta anos, e se viria a revelar, em épocas vindouras, parte importante das campanhas vitoriosas de dois dos três maiores clubes nacionais.

Falamos de Edmilson Gonçalves Pimenta, talvez o mais conhecido dos vários jogadores (curiosamente, todos avançados) que partilhavam o seu nome durante aquela mesma época do futebol nacional, e um dos dois cuja carreira teve início no arquipélago da Madeira. Mas enquanto o seu homónimo do Marítimo (que antes jogara também pelo Nacional) nunca viria a dar o 'salto' (embora tivsse sido herói nos Barreiros durante a referida década), 'este' Edmilson conseguiria fazer chegar a sua carreira a um patamar superior, tornando-se assim uma adição ideal à nossa rubrica Caras (Des)conhecidas, precisamente no dia em que completa cinquenta e dois anos de idade.

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O jogador com a camisola que o notabilizou.

Nascido no remoto estado brasileiro do Espírito Santo, em 1971, Edmilson iniciou a carreira sénior na local Associação Académica Colatina, aos dezoito anos, fazendo uma única época no clube antes de se transferir para o Esporte Clube Democrata, do estado de Minas Gerais; mais uma vez, a sua presença no clube mineiro duraria não mais do que uma época, após a qual a sua vida e carreira se veriam para sempre alteradas.

De facto, o defeso de Verão da época 1993/94 veria o brasileiro rumar a Portugal, para representar o Nacional da Madeira, então na Segunda Divisão de Honra. Ao contrário de tantos outros conterrâneos que até hoje rumam anualmente ao nosso País, no entanto, o avançado rapidamente se viria a destacar, afirmando-se como parte fulcral da campanha do Nacional naquela temporada, pesem embora os apenas quatro golos com que contribuiu para a mesma, ao longo de trinta jogos. Assim, não foi de surpreender que a época seguinte visse o brasileiro transitar para o principal escalão do futebol português, para representar outro histórico do mesmo, o Sport Comércio e Salgueiros, então a atravessar talvez a melhor fase da sua História. O novo desafio não intimidou, no entanto, o brasileiro, que viria a explanar a sua veia goleadora e a deixar a sua marca na época 1994/95 da equipa, atingindo os quinze golos em trinta e quatro partidas, e despertando o interesse do ''grande' local, o Futebol Clube do Porto – também, à época, em fase hegemónica - com o qual assinaria no final da temporada.

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O cromo do jogador na caderneta da Panini relativa à época 1994/95, quando representou o Salgueiros.

E se este é o patamar que fez 'tropeçar' tantos e tantos jogadores ao longo dos anos, tal não se verificou com o brasileiro; antes pelo contrário, Edmilson 'somaria e seguiria' com a camisola listrada de azul e branco, sendo peça fulcral na conquista do bi- e tri-campeonatos por parte do Porto, numa série que apenas seria interrompida pelo futuro clube do avançado, já no final do Milénio, e que veria os 'Dragões' conquistar o penta-campeonato. Nas duas épocas que passaria nas Antas, o brasileiro afirmar-se-ia como titular quase indiscutível ao lado de nomes como Aloísio, Jorge Costa, Carlos Secretário, Paulinho Santos, Sergei Yuran ou Zahovic, e conseguiria uma média de quinze golos por temporada, confirmando as indicações que havia deixado ainda ao serviço do 'vizinho' mais modesto.

Tendo em conta a preponderância do brasileiro no esquema táctico e forma de jogar dos 'Dragões', também não é de admirar que o mesmo tenha despertado a cobiça de clubes estrangeiros, tendo o início da temporada 1997/98 visto o avançado rumar ao único país não lusófono em que jogaria em toda a carreira, a França, para assinar pelo Paris Saint-Germain. Se o salto para um 'grande' não havia feito abrandar a carreira de Edmilson, no entanto, este outro 'obstáculo' típico para futebolistas profissionais viria mesmo a conseguir esse desiderato, tendo o brasileiro passado pouco mais de meia época em Paris, e almejado apenas dezoito presenças pelo seu novo clube, sem golos, antes de rumar novamente a Portugal.

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Foto de plantel do avançado durante a curta estadia no Paris Saint-Germain.

Mas se, nesta fase, o passo mais fácil e lógico seria o do regresso à 'casa' onde fora feliz, as Antas, Edmilson viria a surpreender tudo e todos ao assinar, não pelo Porto, mas por um dos rivais lisboetas, no caso o Sporting, aonde ainda chegou a tempo de realizar onze partidas e marcar três golos até final da temporada 1997/98. Estava dado o mote para mais duas épocas completas nos 'leões' de Alvalade, em que, sem ser titular indiscutível – dada a riqueza e qualidade dos seus concorrentes para a linha da frente – ainda almejou umas honrosas vinte e cinco presenças por temporada, contribuindo com um total de doze golos (dez deles na campanha de 1998/99) e juntando mais um título de Campeão Nacional ao seu palmarés, aquando da quebra do 'jejum' de quase duas décadas por parte dos verdes e brancos. Curiosamente, durante a sua estadia no clube, o avançado alinhou com a camisola 10, que se tornaria mais tarde sinónima, em Alvalade, de um outro avançado raçudo, sisudo e de farta 'melena' de cabelo, e que, ainda mais curiosamente, deixara o Salgueiros imediatamente antes da chegada do brasileiro ao clube: Ricardo Sá Pinto.

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Edmilson no Sporting.

A época seguinte parecia iniciar-se da mesma forma auspiciosa que as anteriores, tendo Edmilson participado em quinze jogos e conseguido quatro golos na primeira metade da campanha; o mercado de Inverno, no entanto, veria o jogador regressar ao seu Brasil natal, agora para representar um dos 'grandes' históricos do Brasileirão, o Palmeiras, de São Paulo. Seriam apenas sete as partidas com a nova camisola verde e branca, no entanto, antes de o avançado 'regressar ás origens' e assinar pelo mesmo Colatina que o vira iniciar formalmente a sua carreira. Ali permaneceria duas épocas antes de lhe ser oferecida nova oportunidade de regressar a Portugal, novamente para jogar na Segunda Divisão, agora ao serviço do Portimonense.

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Nos tempos do Portimonense.

No Algarve, o avançado conseguiria mais uma boa época, com nove golos em cerca de vinte e cinco partidas, que suscitariam o interesse dos noruegueses do Lyn; mais uma vez, no entanto, ficariam patentes as dificuldades de Edmilson em jogar em países fora do eixo Brasil-Portugal, e o avançado viria a realizar apenas oito partidas pelos nórdicos, sem golos, antes de 'regressar a casa' e assinar novamente pelo Colatina para a ponta final da época 2004/2005. Na temporada seguinte, nova tentativa de se 'aventurar' pela Europa, agora como parte do plantel do Visé, da Bélgica, que desmentiu o velho ditado que diz que 'não há duas sem três', tendo o avançado participado numas míseras três partidas naquela que foi a sua última aventura fora de um país lusófono.

O início da época de 2007 via Edmilson, então já com trinta e quatro anos e no ocaso da carreira, surgir vinculado ao mais insólito de todos os clubes da sua carreira, e quiçá o mais insólito de qualquer jogador a ter figurado nesta rubrica: a desconhecida Associação Desportiva Cultural Recreativa e Social de Guilhabreu, dos campeonatos distritais portugueses! Duraria pouco, no entanto, a estadia de Edmilson no modestíssimo emblema vila-condense, vindo o avançado a rumar ao Brasil, ainda nessa mesma temporada, para terminar a carreira no mesmo local onde a iniciara: a AA Colatina, do seu estado natal, que também chegaria a treinar.

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Em 2016, com a camisola do ES Espírito Santo, de que era então presidente.

Ao avaliar uma carreira que se expandiu ainda a cargos técnicos no Nazarenos (director desportivo), Espírito Santo e Guarda Desportivo (dos quais foi presidente), fica a imagem de um avançado rápido, móvel e com algum faro de golo, daqueles que davam 'dores de cabeça' aos defesas adversários, cujo percurso conta com vários merecidos troféus a nível nacional, e a quem só faltou mesmo mais um pouco de adaptabilidade aquando das várias 'aventuras' fora do seu país de acolhimento; tanto assim que, exactos trinta anos após a sua chegada a terras lusitanas, o seu nome continua a ser, merecidamente, incluído em qualquer lista de grandes avançados dos campeonatos portugueses de finais do século XX. Parabéns, Edmilson, e que conte muitos.

12.09.23

A década de 90 viu surgirem e popularizarem-se algumas das mais mirabolantes inovações tecnológicas da segunda metade do século XX, muitas das quais foram aplicadas a jogos e brinquedos. Às terças, o Portugal Anos 90 recorda algumas das mais memoráveis a aterrar em terras lusitanas.

No início dos anos 90, o lançamento de um jogo de computador ou consola não era, ainda, o acontecimento que chega a ser hoje em dia; a imprensa especializada estava atenta aos novos lançamentos, claro, mas no que tocava ao consumidor comum, os únicos jogos que se destacavam eram os que apareciam em programas de televisão, anúncios ou formavam o foco central de uma longa-metragem (como aconteceu, lendariamente, com 'Super Mario Bros. 3' na aventura infanto-juvenil 'O Génio'), ou os que causavam furor por outros motivos.

Um dos primeiros lançamentos a procurar alterar este paradigma foi 'Sonic The Hedgehog 2', que teve direito a dia de lançamento com 'nome' próprio (embora não muito original, já que se chamou apenas 'Sonic 2 Day') e alardeado em vários meios de comunicação; no entanto, talvez o exemplo mais famoso deste fenómeno celebra esta Quarta-feira, 13 de Setembro de 1993, exactos trinta anos, e é referente a um jogo tão popular quanto 'Sonic 2', mas bastante menos inócuo. Falamos da famosa 'Mortal Monday', que fez milhões de entusiastas dos videojogos um pouco por todo o Mundo (Portugal incluído) acorrer às lojas para adquirir a versão caseira de um dos maiores êxitos dos salões de jogos do ano anterior, o infame 'Mortal Kombat'.

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Cartaz norte-americano alusivo ao evento.

Numa época em que os lançamentos (não só de jogos de vídeo como também de filmes, séries, discos ou livros) tendiam a sofrer de intervalos de vários meses, ou até anos, entre o seu lançamento na América do Norte e a chegada à Europa, a 'Mortal Monday' fez, desde logo, História devido ao facto de a Midway ter coordenado os lançamentos americano e europeu do jogo, permitindo aos detentores de consolas da SEGA um pouco por todo o Mundo desfrutar da 'sua' versão exactamente ao mesmo tempo; já os que preferiam as consolas da Nintendo teriam de esperar mais alguns anos pela chegada do jogo aos 'seus' sistemas, já que as versões para Super Nintendo e Game Boy apenas ficariam disponíveis na 'Mortal Monday' para os consumidores norte-americanos, vindo a ser lançados na Europa apenas em Outubro de 1993 e Fevereiro de 1994, respectivamente. Ainda mais demorariam as versões para os computadores da altura, que só chegariam aos lares europeus a meio do ano seguinte, já depois de ter sido também lançado um jogo electrónico LCD alusivo ao título.

Ainda assim, esta 'décalage' costumeira e já esperada não reduz o impacto da 'Mortal Monday', uma iniciativa pioneira e extremamente bem sucedida, ainda que apenas parcialmente realizada a nível do continente europeu. 'Mortal Kombat', esse, tornar-se-ia um dos grandes clássicos da época, e daria azo a uma série de sequelas que perdura até aos dias de hoje, indo já na nona (!) geração. Da franquia em si, no entanto, falaremos em outra ocasião; por agora, ficamo-nos pela recordação de um dia que, certamente, deixou lembranças em quem nele conseguiu participar, e levar para casa um dos mais controversos e antecipados lançamentos de inícios dos anos 90...

 

11.09.23

Em Segundas alternadas, o Anos 90 recorda algumas das séries mais marcantes para os miúdos daquela década, sejam animadas ou de acção real.

As décadas de 80 e 90 representaram a chegada ao Ocidente, e respectiva expansão na popularidade, de um género televisivo e filmográfico já com cerca de década e meia de vida no seu país natal do outro lado do Mundo, à época designado 'Japanimação' e mais tarde conhecido pelo seu nome original: 'anime'. E se, em anos vindouros, este género viria a contribuir com uma mão cheia de clássicos absolutos para a juventude da geração 'millennial' – do inigualável fenómeno que foi Dragon Ball Z a séries tão nostálgicas como Samurai X, Navegantes da Lua ou Doraemon – os seus primeiros passos, embora mais modestos, também não foram, de todo, falhos em séries marcantes, bastando para esse efeito referir Esquadrão Águia, Capitão Falcão (mais tarde 'Oliver e Benji) ou Cavaleiros do Zodíaco.

A juntar a estas séries há, ainda – sobretudo para os 'millennials' mais velhos – uma outra, que iniciava há quase exactos trinta anos a sua terceira e última transmissão em Portugal e que, apesar de ficar ligada, sobretudo, à década anterior, ainda chegou a tempo de influenciar a grande maioria dos 'putos' lusitanos de inícios de 90; e, tal como sucede com alguns dos outros programas de que aqui falamos, este é daqueles casos em o primeiro passo tem, forçosamente, de passar pela partilha do tema de abertura.

Por esta altura, muitos dos nossos leitores já estarão, decerto, a cantar a plenos pulmões a letra...

Isto porque – apesar de notoriamente incompleta – a música introdutória (adaptada, como em tantos outros casos, da versão espanhola, e cantada por Francisco Ceia) é, sem qualquer dúvida, o elemento identificativo mais icónico de As Aventuras de Tom Sawyer (ou apenas Tom Sawyer), a adaptação livre, em formato animado, do famoso livro infantil do século XIX, da autoria de Mark Twain. Composta de cerca de cinquenta episódios, originalmente produzidos em 1979 e lançados no inícios do ano seguinte (tendo passado a quase totalidade de 1980 em exibição na televisão japonesa), a série chegaria a Portugal logo de seguida, sem a 'décalage' cultural habitual à época, indo pela primeira vez ao ar na RTP1 entre 1981 e 1982, já em versão dobrada, num exemplo de celeridade pouco habitual naqueles anos pré-digitais.

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Imagem promocional da série.

Escusado será dizer (pelo menos a quem faz parte da faixa de leitores deste 'blog') que a série se revelou um sucesso imediato, tendo marcado os jovens portugueses da 'Geração X' – sobretudo, como já referimos, através do seu icónico tema de abertura – e justificando a repetição, já no fim da década, com o intuito de a apresentar a quem não tinha tido oportunidade de a ver da primeira vez. Seria, assim, entre Março de 1989 e Fevereiro de 1990 que os 'millennials' tomariam, pela primeira vez, contacto com o 'anime' que fizera as delícias dos seus irmãos mais velhos anos antes, e que tornaria a 'repetir a dose' com a nova geração – tanto assim que viria ainda a ser exibida uma terceira vez, há cerca de trinta anos, novamente no então Canal 1, e com a mesmíssima dobragem realizada mais de uma década antes pela Nacional Filmes.

Esta última transmissão seria, no entanto, o 'canto do cisne' para Tom Sawyer, um desenho animado que, embora icónico, já pertencia, nessa época, a uma outra 'era' televisiva, algo distante dos produtos que vinham 'enlouquecendo' os jovens daqueles inícios dos anos 90. Para as crianças da década transacta, no entanto – tanto as que haviam seguido a transmissão original como as que tinham 'saltado a bordo' aquando da segunda exibição – a série é, ainda hoje, um dos principais pontos de referência nostálgicos ao falar da infância em Portugal em finais do século XX, ao nível dos referidos Dragon Ball Z e Navegantes da Lua, ou ainda de séries como Dartacão ou Power Rangers. E nunca é demais repetir que grande parte dessa fama se deve à lendária canção de abertura, sem a qual esta adaptação animada de um clássico da literatura talvez tivesse passado tão despercebida quanto as suas congéneres posteriores alusivas a Mogli, Zorro, Cinderela ou Robin dos Bosques – mais um testamento, caso ainda fosse necessário, do poder de um bom tema de abertura; e, no que toca à televisão infantil portuguesa, este talvez seja 'O' tema de abertura, mais icónico ainda do que 'Dragon Ball, de puro cristal', 'Vive a vida, como uma festa', 'Dartacão, Dartacão!' ou mesmo 'Eu quero ser, mais que perfeito, maior do que a imaginação'. Razão mais que suficiente para o recordarmos, e à série que introduzia e ajudou a tornar memorável. 'Tu andas sempre descalço, Tom Sawyer...'

Sim, existe uma letra completa...

 

28.08.23

NOTA: Este 'post' é correspondente a Sábado, 26 de Agosto de 2023.

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais e momentos.

Os festivais de música ao ar livre vêm-se, desde há três décadas, afirmando como um dos principais elementos do Verão português, a ponto de quase fazerem falta quando não se realizam, como durante a época de pandemia em 2020-21. Mas se cada ano parece adicionar mais e mais eventos deste tipo ao já preenchido calendário estival, continua a haver apenas um certo e determinado número de festivais verdadeiramente icónicos e sinónimos com esta época do ano, alguns dos quais entretanto desaparecidos (como o saudoso Ermal) e outros que celebram por esta altura aniversários históricos. O Festival do Sudoeste, por exemplo, comemorou o ano passado os seus vinte e cinco anos, e, este ano, é a vez de outro nome sonante da cena 'ao vivo' estival lusitana ter atingido um marco 'de respeito', ao assinalarem-se os trinta anos sobre a primeira edição do lendário Festival Paredes de Coura.

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Celebrado anualmente, em Julho e Agosto, na região com o mesmo nome, no Alto Minho, o coloquialmente chamado 'Couraíso' perfila-se, a par do não menos icónico Vilar de Mouros, como o mais destacado festival de música da região Norte de Portugal, tendo, ao longo das suas três décadas, atraído um sem-número de artistas de renome aos seus palcos, e tornado-se local de 'romaria' quase obrigatória para os fãs de pop-rock e rock alternativo portugueses. O que poucos dos que anualmente rumam à Praia Fluvial do Tabuão saberão, no entanto, é que as origens do seu 'paraíso' musical anual remontam a uma era em que muitos deles ainda nem sequer eram nascidos - nomeadamente, ao ano de 1993, quando um grupo de amigos do município decide, de forma independente, organizar um festival de música. Para esse efeito, criam panfletos feitos à mão e impressos de forma não menos artesanal e, aproveitando algum apoio monetário da Câmara Municipal, começam a contactar bandas, com o objectivo de formar um cartaz. Após vários altos e baixos - todos contados com enorme humor por um dos organizadores no podcast do Expresso dedicado à História do festival - acabam por conseguir confirmar cinco nomes, todos nacionais: Ecos da Cave, Gangrena, Cosmic City Blues, Boubacaba e Purple Lips actuam num palco improvisado a 20 de Agosto de 1993, configurando aquele que foi, efectivamente, o primeiro cartaz de Paredes de Coura.

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Cartazes da primeira e segunda edições do certame.

E a verdade é que a perserverança dos organizadores rendeu dividendos: aquele primeiro festival foi bem-sucedido o suficiente para, no ano seguinte, atrair uma banda tão conhecida e respeitada na cena nacional como os Ena Pá 2000, que se juntavam aos históricos Tédio Boys e a mais quatro bandas (incluindo duas repetentes da primeira edição) num cartaz bastante mais atractivo que o do ano anterior. E se 1994 já representou um considerável avanço em relação ao primeiro ano, 1995 elevou o festival a ainda outro nível, podendo considerar-se o ano em que Paredes de Coura verdadeiramente 'explodiu'. Blind Zero, Braindead, Pop Dell'Arte, More República Masónica e Primitive Reason formavam parte de um cartaz ainda cem por cento nacional, mas nem por isso menos atractivo - antes pelo contrário. O ano intermédio da década de 1990 é, ainda, histórico por ser o primeiro (e único) em que o festival foi dividido entre dois dias, no caso 19 e 20 de Agosto.

A partir daí, foi sempre a somar: logo no ano seguinte, o festival passa a ter três dias de duração, durante os quais actuam nomes de monta do panorama nacional, como Da Weasel, e, há exactos vinte e cinco anos, acolhe os primeiros artistas internacionais a pisar os seus palcos, com Red House Painters, Atari Teenage Riot, Anne Clark, The Divine Comedy e Tindersticks a juntarem-se a ídolos nacionais como Moonspell, Clã, Zen, Blind Zero, Belle Chase Hotel e os então 'enormes' Silence 4. A edição seguinte, última do século XX - que trazia nomes como The Gift, Lamb, Gomez, dEUS, Suede, Mogwai, Sneaker Pimps e uns Guano Apes então em estreita relação com o nosso país, é considerada pelo próprio organizador João Carvalho como a apoteose do festival, e a garantia de que o mesmo perduraria ainda durante muitos anos. E a verdade é que, desde então, já lá vão vinte e três, sem que o festival perca a força, relevância ou fama entre os fãs de boa música independente em Portugal e no estrangeiro - antes pelo contrário, como o comprova a sua colocação entre os melhores festivais de música da Europa por parte da prestigiada revista Rolling Stone, em 2005. Parabéns, Paredes de Coura - e que continues a ser uma referência na cena 'ao vivo' nacional durante ainda mais trinta anos.

14.08.23

NOTA: Este post é respeitante a Domingo, 13 de Agosto de 2023.

Ser criança é gostar de se divertir, e por isso, em Domingos alternados, o Anos 90 relembra algumas das diversões que não cabem em qualquer outra rubrica deste blog.

Embora o campo da tecnologia seja, normalmente, aquele de que mais se fala no que toca a evolução e inovação em finais do século XX, este está longe de ser o único exemplo do fenómeno. Na realidade, a referida evolução foi transversal, tendo-se verificado mudanças mais ou menos declaradas até mesmo em campos tão pouco óbvios como o dos jogos de tabuleiro e de mesa. Edições passadas desta rubrica versaram já sobre jogos como Mauzão, Crocodilo no Dentista e Zé Estica-o-Braço, que representaram uma mudança de 'estilo' no tocante a jogos deste tipo; esta semana, chega a altura de falar de mais um exemplo desta tendência, que procurava combinar o novo paradigma com alguns elementos dos jogos de tabuleiro mais clássicos e que fez, igualmente, algum sucesso entre as crianças e jovens da época.

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Lançado pela MB e distribuído pela inevitável Concentra, 'Piloto Piruetas' surgia nas prateleiras portuguesas há exactos trinta anos, para não mais as abandonar, sendo um daqueles jogos que se continuam a vender até aos dias de hoje; e, olhando para o produto em si, não é difícil de perceber porquê, já que o 'grosso' do brinquedo consiste de um mecanismo do qual pende o titular piloto, e mediante o qual é possível fazê-lo dar voltas tresloucadas que fazem jus ao seu nome. Na caixa vêem, também, cartas relativas às galinhas que o jogador deve 'proteger' do incauto piloto, mas não terá sido apenas lá em casa que a principal diversão consistia em fazer o personagem dar voltas infindas sobre o seu mecanismo, ignorando toda e qualquer vertente competitiva e até mesmo as supostas regras do jogo. Será, aliás, esse mesmo factor que terá permitido ao Piloto sobreviver durante um período substancialmente mais longo que o de alguns dos seus congéneres, já que até mesmo a 'geração iPad' dificilmente resiste a algo em que possa mexer com as mãos; e, nesse aspecto, Piloto Piruetas constitui um sucesso retumbante - mesmo que, como jogo, nem sempre seja tão eficaz...

 

13.08.23

NOTA: Este post é respeitante a Sábado, 12 de Agosto de 2023.

As saídas de fim-de-semana eram um dos aspetos mais excitantes da vida de uma criança nos anos 90, que via aparecerem com alguma regularidade novos e excitantes locais para visitar. Em Sábados alternados (e, ocasionalmente, consecutivos), o Portugal Anos 90 recorda alguns dos melhores e mais marcantes de entre esses locais e momentos.

No início dos anos 90, os parques aquáticos eram um dos mais populares destinos de Verão para as crianças e jovens portugueses, até pelo factor de proximidade, que permitia ir passar o dia a uma instalação deste tipo e voltar a tempo do jantar. Há quase exactos trinta anos, no entanto, essa tendência viria, abruptamente, a mudar, por conta de um grave acidente ocorrido num parque aquático em Lisboa.

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O Aquaparque do Restelo, em Lisboa, palco da tragédia.

Corria a tarde de 27 de Julho de 1993 quando a vida dos familiares de Cristina Caldas, de nove anos, seria, irremediavelmente, virada do avesso; dois dias depois, o mesmo aconteceria com a família de Frederico Duarte, da mesma idade. Ambas as crianças foram dadas como desaparecidas precisamente no mesmo local - o popular Aquaparque, na zona do Restelo, em Lisboa - e foi no decurso das buscas ao local que o triste fim das duas foi revelado: ao ser esvaziada a piscina da atracção 'Ribeirão', os corpos foram encontrados nas tubagens, as quais se encontravam totalmente desprotegidas, tendo as crianças sido sugadas pela força hidráulica e ficado 'entaladas'. Mais curioso era o facto de a grelha de um dos dois tubos de sucção responsáveis pela tragédia ter sido reposta, sem que, ainda hoje, se saiba por quem.
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O caso levou, evidentemente, a fortes protestos contra a instalação do Restelo - conhecida a partir de então como 'Aquaparque da Morte' (onde uma pequena multidão causou desacatos, obrigando a intervenção policial) e, por extensão, a outros parques semelhantes, como o Ondaparque, localizado do outro lado do rio Tejo, e tão ou mais popular que o Aquaparque. Mas se esse ainda se manteria activo durante mais alguns anos (acabando, no entanto, também por morrer) o Aquaparque não sobreviveu ao escândalo, encerrando portas de forma permanente poucas semanas depois, com os donos envolvidos num processo judicial relativo a homicídio por negligência, que se arrastaria durante sete anos, e que os pais das duas crianças viriam a ganhar.

De referir que, mesmo antes do acidente, o Aquaparque era já alvo de controvérsias, com fontes como a revista Pro-Teste a apontarem a falta de segurança das atracções do parque e atitude negligente dos monitores e salva-vidas, além da sujidade e falta de condições da instalação. Ainda assim, o Aquaparque não deixava de atrair entusiastas dos escorregas aquáticos da região de Lisboa - isto, claro está, até àqueles três dias fatidicos, que mudaram a irreversivelmente a percepção do público português sobre os parques aquáticos, e terão deixado muitos jovens da altura com uma sensação de alívio por não lhes ter sucedido algo semelhante. Foi há trinta anos, mas a memória viverá para sempre na mente de quem era de uma idade aproximada à das vítimas e presenciou o caso através dos Telejornais - e que tem, também, o dever de não deixar que o caso caia no esquecimento, para que o mesmo continue a servir como exemplo cautelar para as gerações vindouras...

13.08.23

NOTA: Este post é respeitante a Sexta-Feira, 11 de Agosto de 2023.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcante.

A transformação de propriedades intelectuais infanto-juvenis em filmes ou séries com actores de 'carne e osso' não era já, mesmo nos anos 90, nada de particularnente novo; pelo contrário, as duas décadas anteriores haviam já visto serem realizados filmes alusivos a criações como Super-Homem ou He-Man, e a própria década em causa já tinha, nos seus primeiros anos, acolhido filmes de Batman e das Tartarugas Ninja. Assim, foi sem grandes surpresas que, em 1993, os jovens de todo o Mundo viram chegar às salas de cinema mais uma adaptação deste tipo, no caso alusiva às aventuras do jovem 'terrorista' Dennis, o Pimentinha, cujo desenho animado continuava a ser visto por milhares de crianças naquele Portugal de fim de século.

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Estreado há quase exactos trinta anos, a 13 de Agosto de 1993, o filme da Warner Bros. trazia o jovem Mason Gamble (mais um dos muitos 'aspirantes a Macaulay Culkin' surgidos na sequência do sucesso de 'Sozinho em Casa') no papel do personagem principal, e o veterano da comédia Walter Matthau como o sofredor vizinho Sr. Wilson, o qual surgia com um pouco de cabelo a mais em relação à sua versão desenhada, mas de outra forma perfeitamente caracterizado. A este duo-charneira juntava-se, ainda, outro nome fulcral do cinema de humor da época, Christopher Lloyd, no papel de um vagabundo com quem Dennis se vê envolvido no desenrolar da trama, além de Lea Thompson e de uma jovem Natasha Lyonne, ainda a meia década do sucesso com 'American Pie'. Em conjunto, estes nomes são garantia de actuações de qualidade (o jovem Gamble dá boa conta de si ao lado dos actores veteranos que o rodeiam) e rendem bons momentos individuais, que qualquer fã da série ou da banda desenhada que a inspirou certamente reconhecerá.

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Dennis e os amigos, em 'carne e osso'.

Pena é, pois, que a trama seja pouco adequada ao estilo de Dennis e companhia, cujas aventuras tendem a ter um teor mais corriqueiro e de vida quotidiana; apesar de ser compreensível o esforço por criar uma história que prendesse o interesse durante noventa minutos (e que envolvesse bandidos, claro, ou não fosse essa a fórmula do mega-êxito de Chris Columbus) neste caso, essa abordagem acaba mesmo por trabalhar contra o filme - um problema que afectou também outras obras do mesmo período, como 'Tom e Jerry - O Filme'. Isto porque a maioria dos espectadores interessados num filme de Dennis, o Pimentinha, certamente prefeririam algo mais próximo aos enredos do desenho animado e respectiva BD, com Dennis a 'torturar' involuntariamente o pobre Sr. Wilson, a discutir com a pomposa e convencida Margaret, ou a arranjar sarilhos juntamente com o inseparável amigo Joey e o carismático cão Ruff - todos os quais surgem no filme perfeitamente caracterizados, mas apenas por breves momentos, sendo a maioria da película passada só com Dennis e o vagabundo de Lloyd, o que deixa a sensação de oportunidade perdida. Assim, tal como sucederia com 'Tom e Jerry' no ano seguinte, os primeiros momentos do filme acabam por ser os melhores, já que mostram, precisamente, o que o público-alvo esperava ver de uma longa-metragem deste tipo; quanto aos restantes noventa minutos, configuram um bom filme para crianças (ou não tivesse tido a intervenção de John Hughes) mas que acaba por ficar aquém do seu potencial.

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Ainda assim, o primeiro filme do Pimentinha conseguiu fazer sucesso suficiente para justificar a inevitável sequela exclusiva para o mercado de vídeo, cinco anos depois. Intitulada 'Dennis o Pimentinha Ataca de Novo', este segundo filme já não trazia quaisquer das estrelas envolvidas no original, nem mesmo Gamble. No seu lugar surge o desconhecido Justin Cooper (curiosamente, da mesma idade de Gamble, e como tal, igualmente 'velho' para interpretar o menino de cinco anos), ao lado de nomes consagrados da comédia americana como Don Rickles (a voz do Sr. Cabeça de Batata em 'Toy Story', aqui como o muito semelhante Sr. Wilson), Betty White (uma das célebres 'Golden Girls') ou o então 'na berra' Carrot Top, um daqueles comediantes frenéticos na linha Jim Carrey que o público americano da altura parecia adorar. A história, essa, continua na linha do original, com Dennis a tentar evitar que o igualmente travesso avô materno seja enganado por dois burlões que prometem a 'fonte da juventude'; o resultado é precisamente como se possa imaginar, com a agravante de o filme mal chegar à marca dos setenta minutos, o mínimo exigido para poder ser considerado uma longa-metragem. Não admira, pois, que esta segunda aventura não tenha jamais visto o interior de uma sala de cinema, e tenha feito todo o seu dinheiro no mercado VHS (onde, em Portugal, foi lançado em versão dobrada, tal como sucedera com o original.)

À distância de três décadas e um quarto de século, respectivamente, qualquer dos dois filmes do Pimentinha está longe de poder ser considerado um clássico infantil dos anos 90, uma década mais que prolífera nesse particular; ainda assim, ambos poderão, ainda, constituir boas escolhas para ocupar os mais pequenos durante uma tarde de chuva em casa, já que exibem todas as características que a referida demografia procura num filme, e provocarão certamente algumas gargalhadas. Nenhum deles é, no entanto, daqueles filmes de que o público mais 'crescido' poderá desfrutar juntamente com os mais novos; tratam-se, estritamente, de filmes para crianças, e qualquer adulto dará certamente por si a cabecear logo nos primeiros minutos de qualquer um deles...

28.07.23

NOTA: Por motivos de relevância, esta Sexta será também de cinema. Voltaremos a falar de moda na próxima semana.

Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.

O Verão foi, e continua a ser, tradicionalmente uma 'época alta' no que toca a estreias de filmes, sobretudo 'blockbusters' e películas destinadas a um público mais jovem, tendo, inclusivamente, sido um dos dois períodos do ano, juntamente com o Natal, em que era expectável um novo lançamento por parte da Disney; e, tendo os anos 90 sido um dos períodos áureos do cinema infanto-juvenil (com a própria Disney, por exemplo, em plena 'Renascença'), não é de estranhar que os últimos dias de Julho tivessem, tanto há trinta anos como há um quarto de século, visto chegar ao nosso País filmes capazes de entusiasmar o público mais jovem, e que se tornariam clássicos nostálgicos para os hoje adultos da geração 'millennial'.

De facto, os dias 30 e 31 de Julho tanto de 1993 como de 1998 assinalaram a estreia nacional de nada menos do que três longas-metragens hoje recordadas com carinho pelos portugueses na casa dos trinta a quarenta anos, duas delas explicitamente destinadas a um público infantil, e a terceira um potencial alvo para o tradicional visionamento 'às escondidas', com amigos ou depois de os pais já terem ido para a cama.

Começando pelo 'início' – isto é, pelo filme mais antigo dos três – o dia 30 de Julho de 1993 via chegar às salas lusas 'Ferngully', filme de Don Bluth que, em Portugal, receberia o incompreensivelmente longo sub-título de 'As Aventuras de Zak e Krysta na Floresta Tropical'. Lançada no auge da era de ouro da sensibilização para a ecologia, a longa-metragem conta com uma mensagem de protecção da natureza, envolta na habitual história de um humano comum 'puxado' para um reino mágico que deve ajudar a proteger - neste caso, o das fadas protectoras da 'última floresta tropical', que se encontra ameaçada por madeireiros.

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Com o padrão de qualidade habitual de Bluth, e talentos vocais de qualidade (entre eles Robin Williams, então em estado de graça após a sua interpretação do Génio em 'Aladdin', do ano anterior, e que ainda em 1993 faria outro clássico, 'Papá Para Sempre') o filme divide, hoje em dia, opiniões, com muitos críticos a apontarem para a mensagem do filme e para o número musical do personagem de Williams, Batty - que interpreta um 'rap' bem ao estilo da década então em curso - como pontos negativos. Para quem lá esteve em 1993, no entanto - a duas semanas de completar oito anos, 'impante' e ufano por ter conseguido bilhetes para a ante-estreia – nada disso era minimamente relevante, e 'Zak e Krysta' pareceu um excelente filme; ou seja, para o público-alvo, menos preocupado com questões de detalhe, esta foi, e provavelmente continuará a ser, uma excelente forma de passar uma hora e meia com uma animação de qualidade, a qual fez sucesso suficiente para, inclusivamente, dar azo a uma sequela, esta sem qualquer repercussão em Portugal.

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Um dia após a estreia da última obra de Bluth, a 31 de Julho, chegava ao nosso País um futuro 'clássico' dos canais de filmes a cabo: 'O Último Grande Herói', uma comédia de acção que via Arnold Schwarzenegger fazer um papel bem 'meta-textual', interpretando o personagem titular, o típico herói musculado da época, que se vê a braços com um jovem espectador que, graças a um bilhete mágico, consegue entrar no filme, e se vê envolto na trama do mesmo. Os dois membros deste insólito par têm, assim, de trabalhar juntos para travar o vilão, aliando a força e armamaento de Arnie ao conhecimento sobre estereótipos e fórmulas cinematográficas do seu jovem coadjuvante.

E é, precisamente, a química entre os 'músculos de Bruxelas' e o jovem Austin O'Brien que rende os momentos mais divertidos deste filme, como aquele em que o Danny Madigan de O'Brien menciona, jocosamente, o facto de todos os números de telefone do filme começarem por 555, o indicativo tradicionalmente usado por Hollywood neste tipo de situações. Apesar de não ser uma obra-prima intemporal (o único filme de Arnie qualificado para essa categoria continua a ser 'O Predador') trata-se de uma longa-metragem bem divertida, que doseia bem o humor e a acção (à maneira de antecessores como 'O Caça-Polícias' e de sucessores como 'Hora de Ponta'), sabe explorar a veia cómica de Schwarzenegger, e conta com uma banda sonora à altura, povoada por nomes como AC/DC, Alice in Chains, Def Leppard, Queensryche, Aerosmith, Anthrax ou Cypress Hill, entre outros.

Exactos cinco anos após a literal explosão de Arnie nos cinemas nacionais, estreava em Portugal outro filme teoricamente para um público mais 'maduro', mas que muitas crianças terão, decerto, visto em anos subsequentes, no contexto do 'home video' – aqui, por exemplo, viu-se aos cerca de treze ou catorze anos, na noite de cinema da colónia de férias.

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Falamos de 'O Enigma do Horizonte' (no original, 'Event Horizon') um excelente filme de ficção científica encabeçado por Laurence Fishburne (em 'ensaios' para 'Matrix', dois anos depois), Sam Neill e Jason Isaacs e realizado pelo hoje conceituado Paul W. S. Anderson. Com uma história algo semelhante à de 'Alien – O Oitavo Passageiro' (em que uma equipa de salvamento espacial fica presa numa nave abandonada, à mercê de uma força sinistra) o filme é notável, sobretudo, pelos efeitos especiais, de entre os quais se destaca o 'rio' de sangue a descer um dos corredores da nave – imagem que deixou boquiaberto aquele adolescente de finais do Segundo Milénio, sentado em colchões no chão da sala principal de uma colónia de férias presencial na Margem Sul do Tejo. Mesmo para um público mais adulto e exigente, no entanto, este filme continua a ser uma boa proposta para uma noite mais escura e chuvosa, de preferência em boa companhia...

Em suma: em apenas dois dias de dois anos distintos, o público infanto-juvenil português viu surgirem nas telas nacionais três excelentes filmes (mais ou menos) apropriados à sua faixa etária, e que ainda hoje são conceituados dentro dos seus respectivos estilos – uma coincidência, sem dúvida, digna de nota nas páginas deste 'nosso' Portugal Anos 90, numa altura em que se assinalam aniversários marcantes sobre as estreias de todos os três.

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