02.08.24
Os anos 90 estiveram entre as melhores décadas no que toca à produção de filmes de interesse para crianças e jovens. Às sextas, recordamos aqui alguns dos mais marcantes.
A adaptação de desenhos animados episódicos em filmes de 'acção real' é, hoje em dia, um dos esteios da produção infanto-juvenil em Hollywood; no entanto, as raízes desta prática remetem a finais do século XX, época que viu surgirem as primeiras tentativas de trazer personagens animados para o mundo real. E se, hoje em dia, a prática vigente é colocar o próprio boneco, criado em CGI, no meio de actores de 'carne e osso', de modo a salientar as diferenças entre os dois, os anos 80, 90 e 2000 tinham uma abordagem algo diferente, em que os personagens em si surgiam como pessoas reais, interpretadas por actores invariavelmente bem caracterizados, de forma a que se assemelhassem aos seus 'equivalentes' animados.
Curiosamente, muitas das adaptações desta primeira fase centravam-se sobre propriedades intelectuais já, à época, com várias décadas de existência, mas que continuavam a gozar de relativa relevância e sucesso entre as crianças e jovens, fosse por conta das repetidas transmissões dos episódios na televisão ou por via de uma associação a outro meio, como o da banda desenhada. Entre os numerosos exemplos 'de época' deste paradigma incluem-se Dennis o Pimentinha, Riquinho, e os personagens cujos filmes abordamos nesta publicação, a poucos dias do trigésimo e vigésimo-quarto aniversários das suas estreias em Portugal: as famílias pré-históricas mais famosas de sempre, Fred e Wilma Flintstone e Barney e Betty Rubble.
Chegado às salas de cinema portuguesas a 5 de Agosto de 1994, o simplesmente intitulado 'Os Flintstones' cativava de imediato os inúmeros jovens lusos que vinham, há vários anos, seguindo as aventuras animadas dos personagens titulares em programas como 'Oh! Hanna-Barbera'. Para esta demografia, era nada menos do que entusiasmante ver Fred, Wilma, Barney, Betty e restantes habitantes de Bedrock em versões de 'carne e osso' mais do que fiéis às animadas, com um elenco aparentemente escolhido a dedo e perfeitamente caracterizado. E dizemos 'aparentemente' porque, acredite-se ou não, Rick Moranis (que É Barney Rubble, capturando na perfeição os trejeitos e até a voz deste) não foi a primeira escolha do realizador Brian Levant, que queria Danny DeVito no papel – uma escolha que faria sentido do ponto de vista da estrutura física, mas que, no restante, ficaria bem mais distante do Barney animado do que a versão de Moranis.
O elenco do primeiro filme recriava na perfeição os seus equivalentes animados.
O actor de 'Querida, Encolhi Os Miúdos!' encontra-se, aliás, em excelente companhia, em meio a um elenco de luxo no tocante a comédia em meados da década de 90. A escolha de John Goodman como Fred Flintstone é lógica a pontos de ser óbvia, dadas as parecenças físicas e vocais naturais entre o actor e o personagem, enquanto Rosie O'Donnell e Elizabeth Perkins vivem quase na perfeição a leviana Betty Rubble e a paciente Wilma Flinstone. A completar o elenco surgem ainda Elizabeth Taylor, no papel de sogra de Fred, Kyle McLachlan como o vilão, uma jovem e lindíssim Hale Berry (no papel de uma secretária de nome...Sharon Stone) e, claro, os BC-52's, ou seja, os B-52's 'trajados a rigor' em roupas pré-históricas, que se encarregam de criar uma versão bem 'gingada' do icónico tema da série, ajudando a criar o ambiente vivido em Bedrock.
Como qualquer boa adaptação de desenho animado, no entanto (e este primeiro filme dos Flintstones insere-se nessa categoria) a película não se contenta em recriar os personagens em 'carne e osso', introduzindo-os numa trama suficientemente complexa para durar perto de duas horas, sem no entanto ficar longe das histórias dos episódios; e se Dennis, o Pimentinha se via a braços com um bandido, Fred, Barney e companhia enfrentam um executivo sem escrúpulos que pretende reduzir o número de empregados da pedreira onde Fred trabalha, bem 'desviar' fundos dos cofres do patrão, Mr. Slate – usando o pouco perspicaz patriarca como 'bode expiatório'. Uma história que abre espaço tanto aos momentos cómicos pelos quais a série é conhecida, como a outros mais dramáticos, sobretudo ligados às situações financeiras e sociais de Fred, Wilma e respectivos vizinhos e amigos, os quais acabam de adoptar uma criança.
Conforme já demos a entender, o resultado desta mistura de ingredientes é uma das melhores adaptações de sempre de um desenho animado ao grande ecrã, totalmente fiel ao espírito da série original, com excelentes interpretações e caracterização, e uma banda sonora 'gingada', bem merecedora de ser lembrada por alturas do seu trigésimo aniversário, e que deixava a base perfeita a partir da qual criar uma sequela...ou talvez não.
Isto porque 'Os Flintstones em Viva Rock Vegas', lançado em Portugal a 4 de Agosto de 2000, quase exactamente seis anos depois do original, é unanimemente considerado um péssimo filme, com orçamento muito mais reduzido, e já sem o envolvimento de Steven Spielberg (que, enquanto produtor, muito ajudara ao 'clima' e recursos à disposição do filme original) ou de qualquer dos actores de 1994. De regresso, portanto, apenas Brian Levant, que colmatava a ausência de Goodman, Moranis e restantes 'estrelas' com a aposta num formato de prequela. 'Viva Rock Vegas' segue, pois, as aventuras dos quatro personagens na sua visita à cidade titular, na época em que ainda eram jovens e solteiros, procurando mostrar a génese dos dois casais principais.
As versões jovens dos dois casais protagonistas.
A presença de um dos irmãos Baldwin (Stephen, que interpreta Barney) e do muito acarinhado extraterrestre, The Great Gazoo, não ajuda, no entanto, a disfarçar as carências do filme, o qual, conforme mencionado, fica muito aquém do original em todos os aspectos, sendo ainda hoje alvo de acintosas críticas. Apesar de inicialmente entusiástico, o público infanto-juvenil também não se deixou 'levar' na cantiga de Levant, e o filme acabou por se revelar um fracasso de bilheteira, terminando prematuramente com aquela que poderia ter sido uma interessante franquia cinematográfica.
Apesar deste final pouco feliz, no entanto, Fred, Barney, Betty e Wilma afirmaram-se, ainda assim, como protagonistas de um dos melhores e mais divertidos filmes da primeira vaga de adaptações animadas, e que continua, ainda hoje, a ser uma proposta bem divertida para uma Sessão de Sexta em família – desde que, claro está, não se cometa o erro de o 'emparelhar' com a sequela...