24.03.22
Trazer milhões de ‘quinquilharias’ nos bolsos, no estojo ou na pasta faz parte da experiência de ser criança. Às quintas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos brindes e ‘porcarias’ preferidos da juventude daquela época.
Os anos 90 foram, como já por várias vezes documentámos nestas páginas, pródigos em fenómenos infantis baseados num qualquer tipo de jogo; e, durante um período de alguns anos na segunda metade da década, muitos destes fenómenos surgiam sob a forma de jogos de cartas. Destes, o mais lembrado é, evidentemente, o Magic: The Gathering (que teve, já no novo milénio, uma semi-ressurgência na forma dos jogos de Pokémon e Yu-gi-oh, que dele tiravam óbvia inspiração) mas houve outro tipo de baralho que, embora menos imediatamente nostálgico, proporcionou também muitos e bons momentos competitivos às crianças portuguesas da época: aqueles da Majora com fotografias de carros, aviões ou motas, e respectivos valores técnicos impressos por baixo.
Curiosamente, apesar de já de há muito terem 'passado de moda' por terras lusas, este tipo de baralho continua a existir no estrangeiro, onde surge em edições licenciadas e tematizadas e tem, mesmo, uma marca definida – Top Trumps. Escusado será dizer que, em Portugal, a situação não era, nem de perto, semelhante, sendo os baralhos da Majora (oficialmente identificados pela expressão 'Super Cartas') invariavelmente conhecidos pela designação genérica do tema a que diziam respeito – por exemplo, 'Carros', 'Aviões', 'Motas' ou o que mais estivesse representado na carta-frontispício que todos eles tinham.
Fosse qual fosse o tema, no entanto, a mecânica destes jogos era sempre a mesma – cada carta tinha uma série de estatísticas relativas ao veículo, animal, personagem ou até planeta que representava, e que os jogadores (após dividirem o baralho irmamente entre si, e determinarem qual o dado a ser tomado em conta) comparavam directamente, caso a caso, para determinar quem ganhava aquele turno. Por exemplo, no início de um turno de um jogo relativo a carros, e tendo os jogadores decidido comparar cilindradas, cada um dos mesmos apresentava a carta que encabeçava a sua pilha, e quem tivesse o carro com maior cilindrada ganhava esse turno.
Uma mecânica simples, mas que dava azo a largos momentos de diversão (bem) competitiva, com a vantagem adicional de um jogo demorar bem menos do que uma partida de Magic ou até de Uno – a duração estava mais próxima da de uma partida de 'Peixinho' ou outro jogo de cartas infantil convencional. Não era, como tal, incomum ver crianças a aproveitarem o intervalo da escola, ou aquele período entre o segundo toque e a chegada da professora, para encetarem um jogo rápido, sem compromisso, dado ser este, também, daqueles tipos de jogo que se podem interromper ou até parar a qualquer altura, sem que fique aquela sensação de ter deixado algo a meio.
Essa característica, aliada ao potencial competitivo e preço convidativo para os bolsos infantis, terá contribuído em grande parte para o sucesso destas cartas, que – numa era em que a Internet era ainda mais do que incipiente, e jogos como o 'Cards Against Humanity' nem sonhavam ser concebidos – fez as delícias de muitas crianças e jovens nacionais, chegando mesmo o Bollycao a aproveitar a sua mecânica para a sua popular colecção de cartas 'Kaos', lançadas sensivelmente na mesma época. Enfim – outros tempos, em que algo tão simples quanto um baralho de cartas com fotografias de carros ou aviões conseguia divertir até mesmo quem já tinha mais idade...