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Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

Portugal Anos 90

Uma viagem nostálgica pelo universo infanto-juvenil português dos anos 90, em todas as suas vertentes.

28.06.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Nos quase cem anos desde a sua criação, o Rato Mickey tornou-se não apenas o símbolo e mascote da companhia que o concebeu, mas um dos mais populares e instantaneamente reconhecíveis personagens da cultura popular moderna. Tendo feito história desde a sua primeira aparição (o seu desenho animado de estreia, 'Steamboat Willy', assinalaria a primeira tentativa de sincronização de som e imagem neste tipo de conteúdo), o rato que originalmente seria um coelho viria, ao longo ds décadas, a tornar-se protagonista de inúmeros programas televisivos, obras cinematográficas e, claro, de um número astronómico de artigos de merchandising e tiras e histórias de banda desenhada. Assim, não é de admirar que a editora oficial das revistas Disney em solo lusitano tenha querido marcar as efemérides dos sessenta, sessenta e cinco e setenta anos da criação do mais ilustre de todos os ratos com edições especiais comemorativas da ilustre trajectória do personagem no campo da BD.

Mas se 'Mickey 60 Anos', lançado em 1988, foi a verdadeira definição de uma edição de luxo – com três volumes encadernados, cada um deles respeitante a duas das então seis décadas de vida do personagem, oferecendo uma visão verdadeiramente global da sua evolução – o mesmo não se pode, infelizmente, dizer a respeito da edição lançada seis anos depois, que pouco mais foi do que um lançamento perfeitamente normal com uma capa mais 'bonita', não tendo a Abril tido, sequer, o cuidado de a lançar no ano correcto!

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De facto, enquanto que as seis décadas e meia da criação de Mickey se haviam celebrado em 1993, a revista alusiva aos mesmos seria lançada apenas a 28 de Junho do ano seguinte (há exactos vinte e nove anos), vários meses após a comemoração da efeméride! Mais: apesar de contar com o mesmo tratamento 'encadernado' do seu antecessor, este lançamento não contava com qualquer do material informativo típico deste tipo de publicação, e as histórias de que se compunha eram maioritariamente modernas, sendo a mais antiga de 1979, e a maioria de entre 1980 e 1986. E, claro, muitas delas com os horríveis traços italianos que começavam, cada vez mais, a 'infestar' as publicações Disney portuguesas daquela época.

Ainda assim, nem tudo é negativo: além de ter muito que ler (são 260 páginas e nada menos que vinte e quatro histórias), este livro é um 'prato cheio' para fãs das aventuras mais detectivescas de Mickey e do seu inseparável amigo Pateta, que constituem a grande maioria do conteúdo desta publicação. Fica, no entanto, a sensação de 'oportunidade perdida' por parte da Abril Jovem, que já havia demonstrado ser capaz de editar algo verdadeiramente especial, mas que, nesta instância, não apresenta nada que o leitor comum da época não pudesse encontrar num qualquer volume da série Hiper Disney, e que justificasse os quase setecentos escudos (quase três semanadas ou dois-terços de uma mesada da maioria do público alvo!) que custava. De relevo, portanto, apenas a própria natureza comemorativa do livro, bem como a coincidência de ter sido lançado há precisamente vinte e nove anos aquando da escrita deste 'post'.

Felizmente, a Abril 'emendaria a mão' (ainda que apenas parcialmente) com o lançamento comemorativo dos setenta anos da 'cara' da Walt Disney, que seria dividida em dois volumes e contaria com secções informativas e até tiras antigas do personagem. Desse lançamento, no entanto, falaremos no próximo ano, aquando do quarto de século da sua edição...

14.06.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Já aqui falámos, numa edição passada, de como os clubes de jovens por correspondência se popularizaram entre a juventude noventista. Da Sega e Nintendo ao grupo Auchan (através das mascotes Rik e Rok) passando pelo pioneiro Clube Amigos Disney e por um sem-fim de clubes de fãs de artistas sem afiliação corporativa, criados e geridos por jovens perfeitamente normais e anónimos, foram inúmeros os exemplos deste tipo de iniciativa surgidos durante as duas últimas décadas do século XX e primeira do seguinte.

O campo da literatura não foi, de todo, excepção a esta regra, tendo sido nada menos do que duas as tentativas feitas nesse sentido por editoras populares entre a 'miudagem': o lendário Clube Caminho Fantástico, da Editorial Caminho – talvez o exemplo mais bem conseguido deste tipo de serviço – e o Clube Verbo, lançado pela editora homónima algures nos anos 80 e que, como o seu congénere, 'resistiu' até pelo menos à 'recta final' do século XX. Tal como sucedia com a maioria dos outros clubes deste tipo, cada um destes grupos tinha a sua revista própria, com passatempos, cartas e desenhos de leitores e – no caso do Correio Juvenil – também banda desenhada.

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Duas capas do suplemento, ambas alusivas à mesma história de Tintim

De facto, a revista veiculada pelo Clube Verbo destacava-se da 'concorrência' por se inserir no mesmo segmento de publicações 'oficiais' como 'Tintim', 'Spirou' e 'Selecções BD', bem como de suplementos vinculados a jornais e revistas, como o 'BDN' ou o suplemento juvenil do Expresso, ao reunir e editar em 'tranches' histórias de alguns dos autores mais clássicos do mundo da banda desenhada, com destaque para Hergé e Carl Barks, ilustrador principal da era de Ouro da BD da Disney, do qual foram veiculadas duas histórias entre os números 74 e 89, cada uma delas dividida em oito partes: do número 74 ao 81 foi editado 'O Sofá Expresso', de Donald e sobrinhos, e do 82 ao 89 'O Deus do Vulcão', com Mickey e Pateta. Os restantes (poucos) recursos actualmente existentes sobre esta revista mostram imagens de 'O Caranguejo das Tenazes de Ouro', aventura de Tintim passada no Médio Oriente, e sugerem terem sido publicadas histórias de outros autores franco-belgas menos conhecidos.

O facto, no entanto, é que o clube da Difusão Verbo foi um pouco 'Esquecido Pela Net', o que acaba por ser uma pena, já que parece tratar-se, como o Caminho Fantástico, de um exemplo particularmente bem conseguido do formato de clube de jovens por assinatura ou correspondência; cabe assim, como sempre, a este nosso 'blog' a função de recordar este clube, a sua revista, e as excelentes histórias nela publicadas, para que quem fez parte possa recordar, e quem não conhecia possa passar a estar a par...

31.05.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

A hegemonia da Abril/Controljornal e respectivas publicações Disney no mercado de BD português, e a margem de manobra que tal estatuto lhe conferia, são já assunto recorrente nestas páginas. A segunda metade da década, em particular, foi prolífera em mini-séries'experiências' de número único, por vezes sem sequer um conceito unificador para justificar mais aquele 'amontoado' de histórias, mas na maioria dos casos subordinadas a um tema, fosse ele um evento histórico, uma tentativa de lucrar em cima de um filme ou, como no caso da publicação que abordamos hoje, apenas um conceito em geral.

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De facto, e tal como o nome indica, 'Arquivos Secretos do Detective Mickey', surgido nas bancas em 1995, não é mais do que uma colecção de quatro histórias (mais uma tirinha de uma página), oriundas dos sempre prolíficos estúdios italianos da companhia, e subordinadas às populares aventuras policiais de Mickey e Pateta, que durante várias décadas em finais do século XX assumiram o papel de detectives não-oficiais da Polícia de Patopólis, ajudando o chefe da mesma, o Coronel Cintra a apreender, uma e outra vez, bandidos como Mancha Negra ou João Bafo-de-Onça – ambos os quais marcam, previsivelmente, presença nestas páginas, com o primeiro a surgir como vilão principal numa das histórias e o segundo em duas. Do restante conteúdo, a quarta aventura não tem vilão definido, vendo Mickey e Pateta parar uma quadrilha de ladrões de diamantes, e a tira de uma página insere-se na série 'Leia e Decifre', que remonta aos anos 30, e cujo conceito convida o próprio leitor a resolver o mistério exposto nos painéis da história. Uma adição interessante, e que torna de imediato esta publicação mais merecedora de atenção do que algo como 'Os Meus Heróis Favoritos'.

Feitas as contas, no entanto, estas cem páginas mais não foram do que uma tentativa bem típica do período hegemónico da editora para 'sacar' mais trezentos escudos ao bolso da juventude noventista, para quem a aquisição desta revista representava, por vezes, um investimento equivalente a duas a quatro semanadas, ou entre um terço e mais de metade de uma mesada; se tal sacrifício terá ou não valido a pena, caberá a quem a leu dizer...

17.05.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Em edições anteriores desta rubrica, falámos tanto da colecção 'Álbuns Disney', que publicava histórias originais protagonizadas por heróis menos óbvios ou conhecidos do elenco Disney, como dos álbuns bilingues que ofereciam versões em banda desenhada dos principais filmes da companhia, em Português e Inglês. A colecção de que falamos esta semana, editada em 1996 e que contou com apenas quatro números, representa um ponto intermédio entre as duas, ainda que seja bastante menos lembrada (e tenha bastante menos presença digital) do que qualquer uma delas.

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Exemplar da série brasileira, que inspirou a portuguesa.

Trata-se de 'Novos Clássicos Disney', a versão portuguesa de um formato originalmente idealizado e publicado no Brasil (onde mais?) mas que usava como fonte a revista 'Disney Adventures', icónica publicação norte-americana que marcou a infância e juventude da geração noventista do outro lado do Atlântico. Foi, efectivamente, das selecções de banda desenhada inseridas nas páginas do referido periódico que foram retiradas as histórias que perfazem os quatro números da série; e, tendo em conta que a maior parte do referido material dizia respeito aos heróis das séries animadas então exibidas no Disney Channel – e que, na sua esmagadora maioria, eram baseadas nos filmes da companhia – não é de estranhar que os volumes desta série tenham como foco os núcleos de personagens de Aladino (que protagoniza metade dos números da série), A Bela e o Monstro e A Pequena Sereia.

Está aí, aliás, o principal e único atractivo da série – oferecer aos leitores assíduos das revistas Disney histórias com clima e temáticas diferentes das habituais aventuras de Mickey e Pateta ou Donald e Patinhas, ou das histórias curtas e algo básicas protagonizadas por Quincas, Tico e Teco ou Havita. De resto, estes quatro volumes não passam de revistas Disney como qualquer outras (embora editadas no formato maior, típico das BD's norte-americanas), ficando a dúvida quanto ao facto de não terem sido incorporados a qualquer das duas séries de 'Álbuns Disney´, onde nada destoariam ao lado de heróis como Mulan, Puff ou Pato da Capa Preta, e onde talvez pudessem ter gozado de maior visibilidade. Tal e como existiu, no entanto, esta mini-série é (foi) mais uma que, apesar de ter presumivelmente deleitado os leitores da época, estava fadada a perder-se no oceano de publicações da Abril/Controljornal de finais do século XX, muitas das quais bem mais nostálgicas do que ela...

03.05.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

O ensino das línguas era, nos anos 90, um dos grandes objectivos não só dos pedagogos e educadores como também, aparentemente, de alguns sectores ligados à imprensa e edição de periódicos. Senão, veja-se: não só foi esta a motivação por detrás de pelo menos duas séries em fascículos durante este período, como também do lançamento de nada menos do que três revistas Disney, todas publicadas nos primeiros anos da nova década.

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Os três volumes da série, lançados entre 1990 e 1992.

Sem qualquer relação entre si além do conceito e do foco no núcleo do Pato Donald e Tio Patinhas (único a marcar presença em qualquer dos livros em causa), estes três volumes de capa dura e apresentação luxuosa - publicados entre 1990 e 1992 e genericamente agrupados sob a designação 'Disney em Inglês' – tinham como proposta, precisamente, o que o título informal da colecção dava a entender, isto é, a reprodução de histórias dos principais estúdios Disney na sua versão original para o mercado internacional, sem a habitual tradução e localização para Português; no caso do terceiro e último volume, 'Walt Disney's Comics and Games', o conceito era, ainda, alargado a alguns passatempos, que proporcionavam ao leitor uma oportunidade ainda mais prática de treinar o seu Inglês.

De realçar que, apesar de a própria Walt Disney ser originária dos Estados Unidos da América, e de haver toda uma panóplia de histórias originalmente concebidas nesse idioma, nem todas as BD's contidas nestes três volumes foram criadas na América do Norte; existem, sim, histórias de Carl Barks e outros lendários criadores dos estúdios originais espalhadas ao longo dos três livros, mas as mesmas coabitam pacificamente com enredos criados nas filiais holandesa e dinamarquesa da companhia (embora, felizmente, o horrendo material italiano fique, desta feita, de fora). Nada que prejudique ou desvirtue o fito da colecção, já que mesmo essas histórias são lançadas internacionalmente em Inglês, mas ainda assim um pormenor curioso e digno de destaque.

Infelizmente, e apesar da publicidade de que gozou nas contra-capas dos títulos da Abril da altura, a colecção 'Disney em Inglês' não teve continuidade para lá de 1992 – presumivelmente, por muitos dos leitores das habituais revistas quinzenais ou mensais não terem aderido ao conceito de ter de 'aprender' ou puxar pela cabeça enquanto tentavam descontrair com uma BD; mais curioso foi, talvez, o facto de os professores do Ensino Básico não terem visto nestes livros um auxiliar didáctico para as aulas de Inglês, contexto em que, certamente, os mesmos teriam sido bastante mais bem recebidos, ajudando a que, trinta anos depois, se afirmassem como mais do que meras curiosidades da fase hegemónica da Abril nas bancas portuguesas...

19.04.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Nas mais recentes edições desta rubrica, temos vindo a falar de como a hegemonia da Abril-Controlojornal sobre o mercado português de banda desenhada 'de quiosque' conferia à editora uma considerável margem de manobra no tocante a títulos e lançamentos mais 'experimentais', de que a mesma usufruía em pleno. De títulos temáticos a outros sem aparente razão de ser, foram muitas as revistas no chamado formato 'one-shot' lançadas pela Abril durante este período; e, de entre essas, existe uma que se destaca particularmente, não só pelo arrojo como pelo risco em que a editora incorreu ao publicá-la.

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Isto porque o único número de 'Hiper Disney Apresenta' alguma vez concebido, publicado no fim do primeiro ano da década de 90, contém, pasme-se, apenas UMA história, explanada ao longo de inacreditáveis trezentas e cinquenta (!) páginas, as mesmas da edição em si. Trata-se de 'A Pedra Zodiacal', um daqueles épicos que a Disney italiana tanto gostava de produzir durante este período, e que vê os inevitáveis Mickey e Pateta aliar-se ao núcleo dos Patos na busca pelo objecto homónimo, o qual. Naturalmente, é também cobiçado pelos principais antagonistas de ambos os núcleos – o que significa que, numa única banda desenhada, vemos os heróis antropomórficos degladiar-se com nada mais nada menos do que QUATRO vilões: João Bafo-de-Onça, Mancha Negra, Maga Patalójika e o menos conhecido Spectrus! Uma receita que assegurava diversão garantida aos fãs deste núcleo de personagens, e que ajudava a justificar minimamente o considerável investimento necessário à aquisição da revista, que era de formato 'grosso', semelhante ao do 'Hiper Disney'.

Talvez esse mesmo obstáculo se tenha mostrado insuperável, ou talvez o formato de história única (e MUITO longa) se tenha afigurado aborrecido para o público-alvo, habituado a uma maior selecção e variedade de histórias, formatos e personagens; seja qual for o motivo, a verdade é que 'Hiper Disney Apresenta: Em Busca da Pedra Zodiacal' entrou na História das publicações Disney portuguesas como mais uma anomalia, talvez não tão descabida como 'Os Meus Heróis Favoritos' (e certamente mais cuidada e ambiciosa) mas suficientemente 'estranha' para não agradar aos leitores habituais das revistas da Abril. Prova disso é que os restantes capítulos da série 'Máquina do Tempo', que viam Mickey e Pateta embrenhar-se em toda a espécie de aventuras através dos tempos, ainda hoje não tiveram edição em Portugal, embora uma delas ('O Mistério de Napoleão') tenha, aparentemente, sido editada no Brasil. Por terras lusas, no entanto, este volume continua a ser mais um dos muitos exemplos de revistas e histórias que viram a luz do dia pura e simplesmente por a Abril nada ter a perder com a sua edição, e que provam os riscos a que uma empresa se pode dar ao luxo de se sujeitar quando é monopolista do seu sector.

05.04.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

A posição hegemónica e o enorme acervo de material disponível permitiram à Abril-Controljormal levar a cabo várias experiências de mercado relativas às suas revistas Disney em meados da década de 90, nomeadamente no tocante à publicação de títulos especiais de número único, os chamados 'one-shots'. Destas, destacaram-se a revista alusiva ao Titanic, lançada para capitalizar sobre o sucesso do filme, a adaptação da descoberta da América ao universo de Mickey e Pateta, uma revista do tamanho de um Hiper Disney dedicada a uma única história (da qual em breve aqui falaremos) e o título de que falamos no 'post' desta semana, uma 'anomalia' baptizada 'Os Meus Heróis Favoritos'.

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Lançado algures durante o ano de 1995, este número único talvez tenha representado uma espécie de 'piloto' para uma nova série projectada, ou talvez apenas uma forma de 'escoar' mais algumas das muitas histórias em arquivo; fosse qual fosse o caso, a verdade é que a experiência nunca teve seguimento, tendo-se este título ficado pelo número único, e, como tal, sido algo menos lembrada do que a maioria das revistas lançadas pela popular casa editorial na mesma altura.

Para isso poderá, também, ter contribuído a falta de 'foco' da revista, que (ao contrário da maioria das congéneres) não se centrava em torno de qualquer tema, ou apresentava qualquer lógica na selecção de histórias a incluir, limitando-se a recolher um 'molho' aparentemente aleatório de trabalhos e a 'cuspi-las' para as suas cerca de setenta páginas. Entre a selecção incluída neste título contam-se as inevitáveis histórias 'made in' Itália - com honras de abertura, claro - mas também uma tira clássica norte-americana e várias histórias criadas no Brasil, uma delas com Zé Carioca e Nestor a falar o seu embaraçoso 'brazuquês' traduzido, que tão mal soava a quem estava habituado aos originais - e que, além do mais, quebra o ténue fio de lógica conectora que havia entre as restantes histórias, quase todas com Mickey ou Pateta como protagonistas, embora duas se centrem sobre o núcleo de Donald e Patinhas.

Em suma, este foi mais um daqueles títulos que deixou a impressão de ter sido publicado apenas 'porque sim', por a editora ser tão poderosa que qualquer coisa que mandassem para as bancas tinha vendas garantidas. No entanto, ao analisar a fundo a estrutura do volume, não é difícil perceber porque é que 'Os Meus Heróis Favoritos' se ficou pelo número único, já que se trata de uma publicação cujo único propósito parece ser o de 'regurgitar' mais algumas histórias para 'sacar' mais duzentos escudos aos 'putos' fãs das BDs da Disney, com muito pouca da habitual atenção ou cuidado na produção que marcavam muitas das outras revistas da Abril no mesmo período. Uma curiosidade interessante pelo carácter 'autónomo' e único no catálogo da editora, mas que nem a perspectiva nostálgica consegue transformar em muito mais do que isso...

22.03.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Já aqui sobejamente falámos da hegemonia que a Abril/Controljornal, com a sua licença para editar versões portuguesas das revistas Disney, conseguiu ter sobre as publicações infanto-juvenis da década de 90. De facto, em conjunto com as Bds da DC e Marvel lançadas pela mesma editora, os diversos títulos Disney representavam a esmagadora maioria da oferta nacional em termos de banda desenhada, sendo as poucas alternativas, normalmente, oriundas do estrangeiro, como ocorria com as revistas da Turma da Mônica ou mesmo outros títulos da própria Disney, como 'Urtigão' ou 'Zé Carioca.'

Perante tal estado de graça, não é de estranhar que a casa editorial se tenha sentido confiante o suficiente para tentar expandir o seu portefólio com ainda mais títulos – afinal, neste caso, a segmentação de mercado acabava por ter um impacto practicamente nulo. Foi esta a lógica por detrás do lançamento de várias edições especiais em número único (de algumas das quais já aqui falámos, e de outras falaremos no futuro) bem como de novas séries como 'Álbum Disney´ ou 'Série Ouro', também elas bem-sucedidas o suficiente para desfrutarem de uma 'vida útil' relativamente longeva.

Apesar deste 'toque de Midas', no entanto, a editora ia, paulatinamente, somando um ou outro falhanço à sua trajectória – títulos que, por uma razão ou outra, ficavam aquém do desejado em termos de repercussão, impacto e, claro, volumes de vendas, acabando por sair do mercado pela 'porta pequena'; é de um desses títulos – cuja publicação se encerrou há pouco mais de trinta anos, – que falaremos nesta Quarta aos Quadradinhos.

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Capa do primeiro e último números da revista.

A revista em causa chamou-se 'Top Disney', e marcou presença nas bancas portuguesas durante exactamente um ano, tendo o primeiro dos seus doze números de periodicidade mensal sido lançado a 28 de Janeiro de 1992, e o último a 26 de Janeiro de 1993. Tratava-se de um título com aproximadamente cem páginas, com lombada grossa, daqueles a meio caminho entre as publicações 'normais' da editora (que tinham cerca de setenta páginas) e a categoria de publicações mais caras e substanciais, onde se inseriam séries como 'Disney Especial' e 'Disney Aventura'; ao contrário destas, no entanto, o 'Top Disney' não tinha qualquer tema definido, tratando-se tão-sómente de mais um pretexto para publicar uma mistura de histórias protagonizadas pelos principais personagens da companhia, com especial foco nos inevitáveis Mickey, Pateta e Donald.

Talvez residisse aqui, aliás, o principal motivo para a curta vida do 'Top Disney', que – ao contrário dos 'Disney Especial' e 'Hiper Disney' – não oferecia nada que já não se pudesse encontrar nas revistas menos 'especiais' (e mais baratas) da Abril, sendo o único atractivo o maior número de páginas e, por conseguinte, de histórias; claramente, no entanto, tal não foi suficiente para manter a publicação 'à tona' para lá da marca do primeiro ano de vida – uma longevidade que até pode, à primeira vista, parecer honrosa, não fosse o facto de as restantes publicações da Abril (e restantes 'concorrentes' mencionadas mais acima) se terem mantido nas bancas, muitas vezes, durante décadas!

Ainda assim, e apesar de esta se saldar como uma experiência falhada por parte da Abril, vale ainda assim a pena recordar aquele que foi mais um dos muitos títulos de banda desenhada de qualidade acima da média de que as crianças portuguesas puderam desfrutar durante os anos 90, e do qual alguns exemplares ainda residirão certamente em sótãos e espaços de arrumação por esse País fora – como, aliás, sucede lá por casa...

08.03.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

Surgidas em Portugal ainda em meados do século XX, as revistas aos quadradinhos da Disney assumiram, durante as quatro décadas seguintes, um nível de preponderância e popularidade difícil de compreender por quem não tenha vivido em primeira mão o fenómeno. Primeiro importadas do Brasil, com diálogos a condizer, estas revistas revelaram-se de tal forma bem-sucedidas que, já na década de 80, os principais títulos passaram a desfrutar de uma edição cem por cento produzida em Portugal, e editada pelo 'ramo' nacional da casa editorial responsável pelos lançamentos brasileiros das revistas Disney e também da DC e Marvel, a Abril (mais tarde Abril/Controljornal); e, tendo-se estas novas edições nacionais revelado tão populares quanto as importadas, não foi de estranhar que, ao longo do quarto de século seguinte, a distribuidora apostasse em oferecer aos leitores a maior gama de títulos individuais possível, lançando nas bancas um sem-número de edições especiais complementares às suas colecções mensais. Uma dessas edições, 'SOS Titanic' – lançada em 1998 para explorar o sucesso do filme protagonizado por Leonardo DiCaprio e Kate Winslet – foi o tópico da nossa última Quarta aos Quadradinhos; agora, chega a hora de falar de outro número único e especial tematizado a bordo de um barco, mas cuja índole é bem diferente da do lançamento que anteriormente abordámos.

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Capas das duas edições nacionais da história, publicadas em 1987 (em cima) e 1992 (em baixo)

Falamos de 'Cristóvão Colombo e a Descoberta da América', uma história em três partes que vê Mickey e Pateta assumir o papel de Descobridores na famosa frota de naus que viria a atracar ao largo da costa dos Estados Unidos, no século XV, e que foi lançada, não uma, mas duas vezes em Portugal – primeiro como parte da colecção de Almanaques 'Edição Especial', em 1987, e cinco anos depois como título único, sem qualquer sub-denominação ou colecção associada. Em ambos os casos, o conteúdo é exactamente o mesmo, originalmente produzido em 1983 por Guido Martina e Giovan Battista Carpi - dois dos principais nomes dos 'famosos' estúdios italianos da Disney – e considerado um dos melhores trabalhos da dupla.

A razão de ser do referido relançamento (especialmente numa data tão próxima da da publicação original) não é, pois, clara, sendo provável que a Abril se encontrasse em fase de 'vacas magras' em termos de produções originais, ou que quisesse apenas 'apresentar' a bem cotada história a um novo público-alvo – afinal, cinco anos teriam sido suficientes para que pelo menos parte da demografia-alvo de leitores das revistas se tivesse renovado.

Fosse qual fosse a razão, a verdade é que qualquer das duas edições disponíveis justificava bem o dinheiro investido, oferecendo material de qualidade e que conseguia 'Disneyficar' o famoso acontecimento histórico sem desvirtuar factos ou perder a vertente didáctica – algo que, só por si, constitui um feito louvável, especialmente no campo da banda desenhada 'descartável'. E ainda que novos leitores a quem este texto tenha desperado o interesse devam ter consideráveis dificuldades em obter esta publicação especial, quem a teve na colecção e tem dela boas recordações certamente terá apreciado a pequena homenagem à mesma contida nestes poucos parágrafos.

22.02.23

A banda desenhada fez, desde sempre, parte da vida das crianças e jovens portugueses. Às quartas, o Portugal Anos 90 recorda alguns dos títulos e séries mais marcantes lançados em território nacional.

As revistas aos quadradinhos Disney viviam, durante os anos 90, um dos seus melhores momentos no mercado português, tanto no que tocava a níveis de vendas quanto de popularidade; assim, não era de todo de estranhar que a Abril/Controljornal (responsável pela edição dos títulos nacionais) procurasse não só diversificar cada vez mais a sua oferta, mas também tirar proveito de momentos culturais relevantes entre a demografia que as suas revistas visavam. E, no Portugal de inícios de 1998, um momento cultural sobrepunha-se a todos os outros junto do público mais jovem: a estreia do filme 'Titanic', quase imediatamente transformado num daqueles sucessos de bilheteira 'geracionais', e ainda hoje recordado por quem cresceu naqueles tempos pelo seu carácter polarizante. Assim, foi sem surpresas que a 'miudagem' lusitana de finais do século XX viu chegar às bancas, mais ou menos ao mesmo tempo que o filme com DiCaprio e Winslet, uma edição especial temática alusiva ao famoso navio, em cuja capa Mickey e Minnie replicavam a famosa pose do par romântico na proa do mesmo.

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Apesar do título e da capa algo 'enganosa', no entanto, 'SOS Titanic' não consiste, exactamente, de uma adaptação humorística e ajustada à realidade Disney do argumento do filme; ainda que a companhia (e, em especial, os estúdios italianos responsáveis pela maioria das BDs Disney saídas em território nacional à época) não fosse, de todo, estranha a este tipo de prática, desta feita, o caminho seguido foi um pouco diferente; a saber, ainda que a história única contida no volume estivesse directamente relacionada com o famoso navio, a mesma não tinha qualquer ligação à obra de James Cameron – talvez como forma de evitar dissabores ou encargos adicionais por parte dos criadores. De facto, apesar da alusão directa feita pelo desenho de capa e da utilização deliberada de Mickey e Minnie no lugar do icónico par romântico, o casal mais famoso da Disney nem sequer figura na trama, já que 'SOS Titanic' é uma história de Tio Patinhas, Donald e sobrinhos!

Desonestidades à parte, no entanto – até porque tais práticas não eram, de todo, incomuns no contexto do 'marketing' da época – a história homónima da publicação até se revela bastante interessante, com os eternos rivais Patinhas e Patacôncio a competir, primeiro para ver quem constrói mais rápido um navio de luxo, e depois quem consegue resgatar do fundo do Mar o verdadeiro Titanic. Uma trama que, curiosamente, mistura elementos reais ao universo de Patópolis, algo que as histórias da Disney faziam a espaços, utilizando a subsequente dissolução da fronteira entre o real e os 'quadradinhos' em favor do enredo imaginado. Uma estratégia inteligente, que tornava histórias como esta apelativas mesmo para quem não era fã do filme (que, conforme referimos mais acima, ainda era muita 'malta nova') e evitando a segmentização da demografia-alvo do lançamento.

Assim, não seria de estranhar que, à época, 'SOS Titanic' tivesse adqurido contornos de 'edição de coleccionador'; apesar de qualquer 'puto' daquele tempo saber que a esmagadora maioria das revistas Disney (bem como as da Marvel e DC, também da Abril) não tinham qualquer valor como objecto de colecção, volumes como este conseguiam, ainda assim, transmitir essa impressão, graças ao grafismo mais cuidado, maior número de páginas e carácter de 'número único'. E apesar desta, como a maioria das suas congéneres, ter entretanto caído no esquecimento, a data de lançamento e a ligação a 'Titanic' tornavam inevitável que a recordássemos nestas páginas nostálgicas, pouco mais de uma semana depois de termos falado do filme que a inspirou...

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